Editorial: liberdade religiosa, coração dos direitos humanos
Cidade do Vaticano (RV) – Estamos
vivendo nestes dias aqui no Vaticano uma espécie de novo Pentecostes com a realização
do Sínodos do Bispos sobre o tema “Nova Evangelização para a transmissão da fé cristã”.
Entre os muitos temas apresentados e discutidos está o da liberdade religiosa. Em
concomitância com o Sínodo foi apresentado nesta semana em Roma o “Relatório sobre
a Liberdade Religiosa no Mundo 2012” realizado pela Fundação “Ajuda à Igreja que Sofre”.
Numa primeira leitura evidenciamos dados que nos falam que a situação não melhorou,
ao contrário está piorando em relação ao recente passado. Chama a atenção também para
o fato de que são sobretudo as comunidades cristãs, mas não somente, a sofrerem graves
discriminações, que muitas vezes desembocam em agressões e violências. Este relatório
examinou 196 países, dos quais 131 de maioria cristã. E são precisamente os cristãos
os que mais sofrem discriminações e perseguições. Há uma verdadeira mortificação ao
professar a própria fé que atinge também outras minorias religiosas; elas são vítimas
de ultrajes, desprezos, atos de intimidação, opressão e violências. “A liberdade
religiosa constitui o coração dos direitos humanos. Essa é de tal maneira inviolável
que exige que se reconheça às pessoas a liberdade de mudar de religião se assim sua
consciência demandar. Cada qual, de fato, é obrigado a seguir sua consciência em todas
as circunstâncias e não pode ser constrangido a agir em contraste com ela. Devido
a esse direito inalienável, ninguém pode ser obrigado a aceitar pela força uma determinada
religião, quaisquer que sejam as circunstâncias ou as motivações”. Essas são palavras
do Beato João Paulo II na sua mensagem aos chefes de Estado, por ocasião do Dia mundial
da paz de 1999. Podemos notar que 13 anos atrás o tema da liberdade religiosa já era
de grande atualidade. Também Bento XVI durante a sua recente viagem ao Líbano no
último mês de setembro defendeu a liberdade religiosa como “um direito fundamental”.
Falando aos líderes políticos e religiosos do país afirmou que “ viver livremente
sua própria religião sem colocar em perigo a vida e a liberdade deve ser possível
para todos”. A Declaração Universal dos Direitos Humanos (art. n.º 18) reconhece
o direito à liberdade religiosa, incluindo o de manifestar as próprias crenças seja
individualmente ou com outros, abertamente como em privado. O respeito à liberdade
religiosa é um dos fundamentos da paz mundial. Tudo isso parece óbvio, mas os dados
falam de uma liberdade religiosa não respeitada, ou ao contrário, usada para fins
pessoais ou políticos. Basta pensar nas já famosas leis sobre a blasfêmia em certos
país que atingem pobres inocentes, vítimas de complôs de pessoas que querem somente
determinar a supremacia de uma religião sobre a outra. Uma situação que muitas vezes
causa vítimas inocentes e determina atos de represália entre comunidades e etnias
diferentes. O relatório da “Ajuda à Igreja que Sofre”, fala também da preocupante
situação nos países da Primavera Árabe, onde as instâncias democráticas dos primeiros
momentos deixaram espaço a um islamismo não moderado. Falando nos dias passados à
Rádio Vaticano o jesuíta egípcio, Padre Samir Khalil Samir, especialista em Islamismo
afirmou que “para eles o ideal é impor a xariá islâmica. Pretendem que seja imposta
a lei dada por Deus no século VII a Maomé. Sendo uma lei divina é perfeita". Todas
as demais constituições – dizem eles – são humanas, portanto, imperfeitas. Os cristãos,
sendo uma minoria, apesar de forte, são os primeiros que sentem esta exclusão. A situação
é, portanto, cada vez mais difícil. A solução? Mudanças, mas é necessário uma mudança
de mentalidade, da visão política. E tudo indica que estamos longe de chegar a isso. Mas
temos, felizmente casos, situações, experiências que falam de uma colaboração convivência
pacíficas entre cristãos e outras religiões; um desses casos, como recordou Bento
XVI na sua visita ao Líbano é o país dos Cedros, onde se consegue trabalhar juntos
para o progresso da sociedade. Há ainda muitas realidades onde se dialoga, onde há
respeito, onde os muçulmanos nas grandes festas vão à missa e muitas vezes também
os cristãos vão às festas muçulmanas, não tanto por causa de uma mistura de religiões,
mas por um respeito mútuo. A liberdade religiosa tem uma dimensão social e política
indispensável para a paz, pois ajuda a promover a coexistência e uma vida harmoniosa
em prol do bem comum. A busca da verdade não deve se impor pela violência, mas pela
força da verdade. A liberdade de poder professar a sua fé deve ser tutelada pelos
Governos não somente no papel, nas leis, mas nas atitudes cotidianas onde o homem
é respeitado integralmente, sem distinção de raça, credo e posição social. (Silvonei
José)