Rio de Janeiro (RV*) - Chega o período das férias escolares em nosso país.
Muitas crianças e jovens, e também seus pais, aproveitam esse período para uma parada
no meio do ano. Um período de descanso seja em casa ou mesmo fora da cidade, ou
para lugares mais tranquilos e reconfortadores.
O excesso de obrigações e de
ocupações cria uma pressão constante sobre as pessoas.
Assistimos hoje a uma
liberalização das leis que afetam as horas de trabalho e suas limitações, frente a
uma demanda cada vez mais frenética de produção e de consumo. Esse assunto foi aprofundado
no Encontro Mundial do Papa com as famílias, em Milão, e o será de novo na Semana
Nacional da Família, no próximo mês de Agosto: “A família, o trabalho e a festa”.
Isso
tudo traz uma consequência no campo espiritual: um cada vez mais constante processo
de secularização e desumanização dos domingos e dias santos, e também das férias. Não
há dúvida de que existe um período para o trabalho e um tempo para o descanso. O descanso
não é apenas um mandamento legítimo, mas também abençoado pelas Sagradas Escrituras.
Basta lembrar o sentido do Dia do Senhor semanal, do ano sabático e o tempo do jubileu.
Então,
quem pode passar férias deve fazê-lo como uma fonte de crescimento, regeneração espiritual.
Uma maneira de estimular a viver com alegria. Nós temos uma carência natural de descanso,
de lazer e de diversão, tendo em vista sermos imersos muitas vezes numa atmosfera
de fadiga constante e de preocupação diária com os afazeres laborais. Isso é típico
do nosso tempo de consumismo e que, muitas vezes, descansar pode parecer deixar de
ganhar (“quando passará o sábado para voltarmos a ganhar?”)
Todos conhecem
as fotos do Santo Padre João Paulo II em descanso no norte da Itália, nas montanhas
de Cadore, em Les Combes e no Valle D’Osta. Lá, ele fazia horas e horas de caminhada,
leitura, descanso sob as árvores. Ora, sem dúvida, era um refrigério para os seus
inúmeros afazeres na cidade do Vaticano. Também o Papa Bento XVI passa atualmente
suas férias em Castelgandolfo, sem muitos compromissos oficiais e fazendo o que lhe
agrada, que é escrever mais um volume do seu livro “Jesus de Nazaré”. Nesses dias
assistiu a um concerto no Palácio Apostólico.
O valor do descanso, portanto,
é ser um tempo de descanso físico, psicológico e dando mais tempo para a vida espiritual,
que nos faz descansar no Senhor.
São inúmeros os benefícios de um lazer bem
organizado, e dentre eles poderíamos destacar um de grande atualidade: um maior comprometimento
com a consciência ambiental, seja pelo turismo no campo, seja também no Litoral.
Assim,
conhecendo melhor a natureza que nos cerca – sua beleza e exuberância – e também a
grande riqueza de nossos mares e rios, podemos desenvolver um dever de zelar e cuidar
de todo esse grande presente da criação divina.
O aumento dessa consciência
ecológica muda hoje a consciência do homem. O homem deve, a exemplo de São Francisco
de Assis, se acostumar a ver um irmão e uma irmã em todas as coisas da criação e dizer:
Louvado seja meu Senhor com todas as suas criaturas! Os meios para se desfrutar
do lazer de uma forma positiva são inúmeros. Há várias oportunidades que ajudam e
contribuem para uma sadia recuperação física, e agem em benefício da sua própria saúde
corporal.
Desta forma, a participação em eventos culturais e festivos, o esporte
e o turismo se tornam parte da vida cotidiana, como expressões do tempo livre (Orientações
para o Ministério do Turismo – Conselho Pontifício para a pastoral dos Migrantes e
Itinerantes – 29/06/2001). Mas, é claro que na bolsa ou na sacola de praia deve
estar armazenadas, também, a coerência com o Evangelho, e não apenas um estilo de
vida hedonista ou consumista. É preciso, portanto, construir um lazer inteligente
e vital.
Daí que, mesmo em férias, devemos procurar a oração, a meditação
pessoal e a busca dos sacramentos, especialmente da Santíssima Eucaristia. Nesses
momentos de lazer podemos aproveitar os dias mais livres, sem maiores obrigações,
para meditar mais e melhor a Palavra de Deus.
A busca pelo silêncio, seja
interior ou exterior, seria outro valor a ser cultivado nas férias. Na verdade, só
em silêncio podemos ouvir as profundezas de nossa consciência e a voz de Deus. E as
férias podem ajudar nessa busca, a redescobrir e a cultivar esta indispensável dimensão
interior da existência humana.
Ou seja, tirar férias para parar, escutar, escutar
a si mesmo, ou ouvir e meditar a Palavra de Deus seria uma grande bênção. Ter um tempo
para si e para Deus, um tempo para o essencial, um tempo para o Espírito, um tempo
para oração. Um olhar de amor faz do tempo um não-tempo. Aí estaria um grande valor
das férias.
Orani João Tempesta, O. Cist. Arcebispo Metropolitano
de São Sebastião do Rio de Janeiro, RJ