Também Portugal é responsável na exploração da África
(24/05/2012) A religiosa espanhola Begoña Iñarra, secretária executiva da Rede Fé
e Justiça África Europa, afirmou nesta quarta-feira que Portugal é responsável pelo
empobrecimento dos camponeses africanos ao financiar a produção de combustíveis biológicos
nos seus países. “Portugal, seguindo a prática dos países membros da União Europeia,
está a dar subsídios às companhias produtoras de biocarburantes, dado que na Europa
não há terrenos disponíveis para essas culturas”, denunciou aquela responsável em
declarações à Agência ECCLESIA. A aquisição por parte de proprietários locais
e companhias estrangeiras de vastas áreas de terreno para a produção de combustíveis
e alimentos, destinados à exportação, constitui a principal preocupação da organização
cristã, que tem como objetivo pressionar as instituições europeias para os problemas
económicos em África. “Os compradores prometem emprego aos camponeses que ficaram
sem as terras mas não o dão porque a maior parte da mão de obra é substituída por
trabalho mecanizado”, explicou, acrescentando que a verba recebida pelos agricultores,
quando são indemnizados, “chega-lhes para um ano, não mais”. Os salários e condições
laborais da população que continua a trabalhar nos campos adquiridos pelas multinacionais
são escassas, como acontece com uma companhia dos EUA conhecida pela produção e exportação
de bananas, que comprou uma empresa do mesmo ramo nos Camarões. “Os camponeses, que
trabalham desde as cinco e meia da manhã até às cinco da tarde, e alguns à noite,
têm ordenados miseráveis, abaixo do salário mínimo”, apontou a religiosa, que destacou
a diferença entre o preço de produção, 15 cêntimos por quilo, e de venda, 1,60 euros
em Inglaterra, um aumento superior a mil vezes. Irmã Begoña Iñarra lembrou também
que o preço dos bens alimentares está a crescer, não por falta de chuva mas porque
os mercados estão a aplicar os seus recursos na compra de alimentos e terrenos, investimentos
mais seguros do que a construção e outros setores, cujo valor caiu nos últimos anos.
A responsável pretende que a delegação portuguesa da Rede Fé e Justiça pressione os
responsáveis políticos nacionais para que eliminem os subsídios às companhias produtoras
de biocarburantes e se empenhem, no seio da União Europeia, na elaboração de uma “moratória
sobre a venda das terras, se os governos africanos estiverem de acordo”. A irmã
Begoña Iñarra deslocou-se a Lisboa para proferir uma conferência sobre a missão da
sua instituição, participando também numa mesa redonda intitulada “Olhares Cruzados
sobre África”, moderada por Paulo Rocha, da Agência ECCLESIA. A Rede Fé e Justiça
está também comprometida na generalização em África de medicamentos genéricos, “muito
mais baratos”, e pressiona a União Europeia para exercer maior controlo sobre as armas
exportadas para o continente. A organização, que envolve cerca de 170 congregações
religiosas, das quais duas dezenas são portuguesas, está igualmente empenhada na defesa
dos direitos dos trabalhadores e na salvaguarda do meio ambiente, procurando que os
atropelos às normas internacionais sejam apresentadas nos tribunais dos países onde
as companhias infratoras estão sediadas.