Bento XVI preside a Missa do lava-pés: "Só somos livres se estivermos unidos a Deus"
Roma (RV) -
O Papa Bento XVI presidiu no fim da tarde hoje, Quinta-feira Santa, na Basílica de
São João de Latrão, a concelebração da Santa Missa da Ceia do Senhor, início do Tríduo
Pascal. Durante a Liturgia, o Papa realizou o rito do lava-pés a doze sacerdotes da
Diocese de Roma. No momento da apresentação das oferendas, foi confiada ao Santo Padre
uma oferta humanitária para os refugiados da Síria. Na conclusão da celebração realizou-se
a procissão com a reposição do Santíssimo Sacramento no altar da Capela de São Francisco.
Na
sua homilia Bento XVI iniciou afirmando que a “Quinta-feira Santa não é apenas o dia
da instituição da Santíssima Eucaristia, cujo esplendor se estende sem dúvida sobre
tudo o mais, tudo atraindo, por assim dizer, para dentro dela. Faz parte da Quinta-feira
Santa também a noite escura do Monte das Oliveiras, nela Se embrenhando Jesus com
os seus discípulos; faz parte dela a solidão e o abandono vivido por Jesus, que, rezando,
vai ao encontro da escuridão da morte; faz parte dela a traição de Judas e a prisão
de Jesus, bem como a negação de Pedro; e ainda a acusação diante do Sinédrio e a entrega
aos pagãos, a Pilatos”.
Jesus embrenha-se na noite. A noite significa – disse
o Papa - falta de comunicação, uma situação em que não nos vemos um ao outro. É um
símbolo da não compreensão, do obscurecimento da verdade. É o espaço onde o mal, que
em presença da luz tem de se esconder, pode desenvolver-se.
O próprio Jesus
– que é a luz e a verdade, a comunicação, a pureza e a bondade – entra na noite. Esta,
em última análise, é símbolo da morte, da perda definitiva de comunhão e de vida.
Jesus entra na noite para a superar, inaugurando o novo dia de Deus na história da
humanidade.
Jesus quer ter perto de Si três discípulos – continua o Santo Padre:
Pedro, Tiago e João; são os mesmos três que viveram a experiência da sua Transfiguração.
Os discípulos, cuja proximidade Jesus pretendeu naquela hora de ânsia extrema como
elemento de apoio humano, depressa se adormentaram. Todavia ainda ouviram alguns fragmentos
das palavras ditas em oração por Jesus e observaram o seu comportamento. Jesus chama
a Deus «Abbá»; isto significa – como eles adiantam – «Pai».
Se nos perguntássemos
qual seria o elemento mais característico da figura de Jesus nos Evangelhos, - diz
Bento XVI - temos de dizer: a sua relação com Deus. Ele está sempre em comunhão com
Deus.
O evangelista Marcos, que conservou as recordações de São Pedro, narra
que Jesus, depois da invocação «Abbá», acrescentou: Tudo Te é possível; Tu podes
tudo (cf. 14, 36). Aquele que é a Bondade, ao mesmo tempo é poder, é onipotente. O
poder é bondade e a bondade é poder. Esta confiança podemos aprendê-la a partir da
oração de Jesus no Monte das Oliveiras.
O Papa refletiu ainda sobre o conteúdo
da súplica de Jesus. Jesus luta com o Pai: melhor, luta consigo mesmo; e luta por
nós. Sente angústia frente ao poder da morte. Este sentimento é, antes de mais nada,
a turvação que prova o homem, e mesmo toda a criatura viva, em presença da morte.
Mas, em Jesus, trata-se de algo mais. Ele estende o olhar pelas noites do
mal; e vê a maré torpe de toda a mentira e infâmia que vem ao seu encontro naquele
cálice que deve beber.
Por último, - sublinha o Papa - devemos debruçar-nos
sobre o conteúdo da oração de Jesus no Monte das Oliveiras. Jesus diz: «Pai, tudo
Te é possível; afasta de Mim este cálice! Mas não se faça o que Eu quero, e sim o
que Tu queres» (Mc 14, 36). A vontade natural do Homem Jesus recua, assustada, perante
uma realidade tão monstruosa; pede que isso Lhe seja poupado. Todavia, enquanto Filho,
depõe esta vontade humana na vontade do Pai: não Eu, mas Tu.
E assim Ele transformou
a atitude de Adão, o pecado primordial do homem, curando deste modo o homem. A atitude
de Adão foi: Não o que quiseste Tu, ó Deus; eu mesmo quero ser deus. Esta soberba
é a verdadeira essência do pecado. Pensamos que só poderemos ser livres e verdadeiramente
nós mesmos, se seguirmos exclusivamente a nossa vontade. Vemos Deus como contrário
à nossa liberdade.
Quando o homem se põe contra Deus, - sublinha Bento XVI
- põe-se contra a sua própria verdade e, por conseguinte, não fica livre mas alienado
de si mesmo. Só somos livres, se permanecermos na nossa verdade, se estivermos unidos
a Deus.
Na luta da oração no Monte das Oliveiras, Jesus desfez a falsa contradição
entre obediência e liberdade, e abriu o caminho para a liberdade. “Peçamos ao Senhor
- finaliza o Papa - que nos introduza neste «sim» à vontade de Deus, tornando-nos
deste modo verdadeiramente livres”. (SP)