Rio de Janeiro (RV) - Entre os dias 6 e 10 de fevereiro, teremos a graça de
acolher o tradicional Curso para Bispos, criado há 22 anos por nosso querido antecessor,
Cardeal Dom Eugênio de Araújo Sales. Feliz iniciativa que perdura até hoje, como todas
as obras guiadas pelo Espirito Santo. Em um ambiente de fraternidade, alegria e reflexão
estarão reunidos mais de 100 bispos do Brasil para um tempo de atualização, reflexão
e debates sobre: “50 anos após o Concilio Vaticano II. Novo dinamismo e novas interrogações
para a Igreja.” Será este o segundo ano que trataremos desse assunto. Este encontro
se insere dentro do desejo do Papa Bento XVI de proclamar no dia 11 de outubro – 50
anos da inauguração do Concilio Vaticano II – o “Ano da Fé”, cujo objetivo é “redescobrir
o caminho da fé para fazer brilhar, com evidência sempre maior, a alegria e o renovado
entusiasmo do encontro com Cristo”. (Porta Fidei, 2). O tema do Concílio tem muito
a ver com o Ano da Fé. Basta recordar o “Credo do Povo de Deus”, do saudoso Papa Paulo
VI.
A certeza de nossa fé, na certeza de Cristo
O Papa Bento XVI em
sua Carta Apostólica Porta Fidei, onde faz suas as palavras do Beato João Paulo II,
recorda e afirma que os textos deixados pelos Padres Conciliares “não perdem o seu
valor e nem sua beleza”; “devem ser conhecidos e assimilados como textos qualificativos
e normativos do Magistério, no âmbito da Tradição da Igreja”; é “a grande graça que
beneficiou a Igreja no século XX”; e uma “bússola segura para nos orientar” neste
século. E Sua Santidade, repetindo com veemência as palavras de seu discurso, de dezembro
de 2005, à Cúria Romana reitera: «Se o lermos e recebermos guiados por uma justa hermenêutica,
o Concílio pode ser e tornar-se cada vez mais uma grande força para a renovação sempre
necessária da Igreja». (Cf. PF, 5). Diante dessas palavras do Sucessor de Pedro
fica bem claro o valor e a importância do Concilio Vaticano II. É muito interessante
observar como a Carta Apostólica Porta Fidei apresenta os diversos documentos conciliares
como um programa a ser seguido para alcançar os objetivos do Ano da Fé. A certeza
de navegar seguro na barca de Pedro (cf. Mt 16,18) nos dá a força para viver com renovada
esperança os desafios que nos apresentam o mundo contemporâneo, que se identificam
com o drama da existência humana, assolada pelo pecado e num crescente relativismo,
porém chamada constantemente à graça e ao encontro renovado com Cristo. Sem dúvida,
existem tempestades e nuvens. O vento das incertezas, tristezas e derrotas podem nos
golpear. A indiferença religiosa, o materialismo, o ceticismo, o hedonismo e o relativismo
parecem encher o barco a ponto de afundá-lo. Mais triste ainda são os pecados e infidelidades
no seio da própria Igreja. No entanto, Cristo está conosco. Ele está na barca, e tem
o poder de acalmar o mar bravio (cf. Lc 8,22-25). A graça é mais forte que o pecado.
A luz da fé predomina sobre as trevas. O cordeiro derrota o dragão. Cristo venceu
o mundo (Jo 16, 33).
Em Cristo e em comunhão com a Igreja sempre há um novo
dinamismo.
As encíclicas do Papa Bento XVI sobre o Amor, a Esperança e a que
provavelmente sairá à luz sobre a Fé são claro convite a renovar nas virtudes teologais.
O cristão não possui armas, possui a Cristo, o verbo encarnado, a luz dos povos, nossa
alegria e esperança. É através dos sacramentos, da vivência litúrgica, de uma profunda
vida de oração, do encontro com Cristo e da vida em comunidade que brota a força e
a beleza do ser Cristão, do ser de Cristo. Devemos despertar este profundo renovar
em Cristo em cada um de nós. Só assim o sal não perderá seu sabor e a luz não ficará
escondida. (Cf. Mt 5,13)
Cristo é aquele que faz novas todas as coisas (Ap.
21, 5). Veio mostrar que é possível viver segundo a Fé. As interrogações e dinamismo
da Igreja sempre serão novos a partir do momento que deixemos Cristo tocar e transformar
estas realidades com sua graça. Por isso a Igreja, sacramento universal da Salvação,
é sempre nova, viva e eficaz. É sinal visível da presença de Cristo. É na ótica do
Evangelho que devemos fazer o esforço de interpretar a realidade que nos circunda.
Momento de comunhão fraterna, oração, renovação e reflexão
Sobre a
problemática atual que concerne ao Concilio Vaticano II, Sua Santidade faz algumas
interrogações que devemos considerar com atenção: “qual foi o resultado do Concílio?
Foi recebido de modo correto? O que, na recepção do Concílio, foi bom, o que foi insuficiente
ou errado? O que ainda deve ser feito? [...] por que a recepção do Concílio, em grandes
partes da Igreja, até agora teve lugar de modo tão difícil?” (Cf. Bento XVI, Discurso
à Cúria Romana, 22 de dezembro de 2005) Os 50 anos que nos separam desse evento
eclesiástico histórico permitem uma reflexão mais madura que nos conduza a dar soluções
a essas questões que afligem o coração de muitos. Guiados pelos documentos conciliares,
aplicados à realidade humana, apostólica, intelectual, pastoral e espiritual de cada
diocese poderemos responder, auxiliados pelo Espírito Santo, aos diversos desafios
que se apresentam. O objetivo do Concílio foi e continua sendo o de “fomentar
a vida cristã entre os fiéis, adaptar melhor às necessidades do nosso tempo as instituições
susceptíveis de mudança, promover tudo o que pode ajudar à união de todos os crentes
em Cristo, e fortalecer o que pode contribuir para chamar a todos ao seio da Igreja.”
(Const. Sacrossanctum Concilium, 1)... Os desafios apresentados pelo Beato João
XXXIII na constituição apostólica Humanae Salutis continuam atuais como nunca. Entre
eles cabe destacar o grande progresso técnico e material da sociedade, desproporcional
ao progresso no campo moral; ideologias materialistas e negadoras da fé; perseguições
de todo gênero ao cristianismo, que revelam heroísmo certamente não inferior aos dos
períodos mais gloriosos da Igreja; almas sem confiança, que apenas vêem as trevas
tomando conta da terra; guerras sangrentas; e indiferença espiritual. Com o sopro
do Espirito Santo também temos a alegria de constatar uma grande participação dos
leigos na vida da Igreja. São os leigos a levar adiante, com grande força, a renovação
da fé. É através da formação espiritual, humana e doutrinal dos leigos que passará
a renovação da Igreja, que não significa abandonar a verdadeira tradição, mas fazer
luzir com mais força a beleza da fé. Uma comunidade cristã “socialmente fortalecida
na unidade, intelectualmente revigorada, interiormente purificada, pronta, desta forma,
a enfrentar todos os combates da fé.” (Beato João XXXIII, Constituição Apostólica
Humanae Salutis, n.5) Sob a luz destas perguntas, nós, bispos, viveremos em fraternal
comunhão estes dias. Neste ano aprofundaremos o tema do Ecumenismo, Educação e da
Palavra de Deus com especialistas internacionais. Com esses três temas estaremos abordando
três importantes documentos do Concílio e percorrendo seus caminhos nestes 50 anos.
Esses assuntos debatidos, aprofundados nos ajudarão em nossa missão como sucessores
dos Apóstolos na Igreja no Brasil. Questões que meditaremos no silêncio de nossas
orações pessoais, comunitárias e litúrgicas. Em Cristo, e à luz do Concilio Vaticano
II e com a força e a graça do Espirito Santo renovaremos, mais uma vez, nossa adesão
a Cristo, à Igreja e ao Papa. Fortaleceremos nosso compromisso constante, apoiados
pela Santíssima Virgem, de entregar até a última gota de nossas vidas ao serviço do
Evangelho, através de um esforço contínuo para transformar a sociedade e conduzi-la
a Cristo, renovando a fé de seus seguidores e mostrando a beleza do cristianismo a
todas as nações.
† Orani João Tempesta, O. Cist. Arcebispo Metropolitano
de São Sebastião do Rio de Janeiro, RJ