Rio de Janeiro (RV) - Uma semana nos separa do trágico acontecimento que parou
a cidade do Rio de Janeiro e abalou o Brasil. Neste dia 2 de Fevereiro, às 10 horas,
em nossa Catedral Metropolitana de São Sebastião celebraremos pelos falecidos a missa
de sétimo dia. Tempo insuficiente para enxugar as lágrimas que ainda correm pelos
rostos de todos nós: amigos, colegas e familiares das vítimas. Para uns, é um período
difícil preenchido por sofrimento, dor e vazio. Para outros, que conseguiram sobreviver,
é um renascer. Para todos, é um momento de oração e de elevar nossas almas a Deus
e pedir forças para conseguir carregar esta carga pesada e difícil. Nós pensamos com
todos os que passam diante do local: qualquer um de nós poderia ter estado lá naquele
momento.
Acompanhei e continuo acompanhando com minhas orações a todos: familiares,
socorristas, policiais, autoridades, bombeiros, assistentes sociais que foram envolvidos
nessa tragédia. Nessa intenção já celebramos no local dos atendimentos das pessoas
que foi a Câmara Municipal. Encontrei-me nesse dia com alguns familiares das vítimas
e buscando consolar, devo confessar que saí consolado. Diante da fé e força de vocês
é impossível não emocionar-se. Os padres que em meu nome e da nossa Igreja estiveram
tanto no local da tragédia como no de atendimento naqueles dolorosos dias também me
relataram a força e a coragem de todos. As palavras que mais saíram dos lábios das
testemunhas desse trágico acidente foram: fé, esperança e confiança em Deus. São nesses
momentos que percebemos que a dor e o sofrimento são como uma chave que abre mais
ainda nossos corações a Deus. Como no vazio, na tristeza e em meios às lágrimas pode
surgir uma oração de clamor e esperança?
A resposta parece simples, mas exige
muita fé. Nosso Deus não é um Deus qualquer. Nosso Deus entrou na história, se fez
carne e habitou e habita entre nós. Ele caminhou por estas terras e também chorou.
Nosso Deus não é indiferente ao nosso sofrimento, pois Ele mesmo sofreu. A dor e o
sofrimento permitem compreender que o único necessário é Cristo e Ele nunca falha.
Hoje, mais do que nunca, devo dizer àqueles que sofrem: vocês não estão sozinhos.
Deus está com cada um de vocês e escuta o clamor dos corações machucados pela dor
da separação. Cristo venceu a morte. Ele é a fonte de vida eterna. Nossos irmãos
não são como uma vela que se apaga, são estrelas que brilham diante de Deus. Nós cremos
na vida que não termina com a morte.
A esperança é a característica dos cristãos.
Os pagãos romanos chamavam de necrópoles, cidade dos mortos, o lugar onde deixavam
os restos mortais de seus entes queridos. Para eles, e para muitos hoje, o único modo
de eternidade seria através da recordação dos que se foram. Cristo nos mostra outra
realidade e nós chamamos esse local de cemitério, que significa dormitório. Para nós,
nossos seres amados não morreram, eles não caíram no vazio do nada ou da memória:
eles continuam vivos, e os seus corpos estão adormecidos à espera da ressurreição.
A meta de cada um de nós é chegar ao final de nossas vidas e dizer como S.
Paulo: “Combati o bom combate, terminei a minha carreira, guardei a fé. Desde já me
está reservada a coroa da justiça que me dará o senhor, justo Juiz, naquele Dia” (II
Tim 4, 7-8).
Nossos irmãos nos precederam no caminho da eternidade. Cristo
Ressuscitou, Ele venceu a morte. Nós cremos na vida eterna. Rezamos pelo repouso eterno
dos entes queridos que voltaram para a casa do Pai. Oramos por todos os familiares
para que a paz e a esperança estejam em seus corações. Pedimos por todos os que trabalharam
no local e no atendimento para que, tendo sido testemunhas de situações limites, continuem
com esperança na construção de um mundo solidário e fraterno. Pela nossa cidade para
que a vida seja sempre preservada e valorizada em todas as situações e etapas. E que
em Cristo encontremos o caminho que nos conduz a todos para o Pai.
† Orani
João Tempesta, O. Cist. Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro,
RJ