Emigração sul-americana: as mulheres em primeiro plano e as "cadeias globais de cuidados"
Cidade do Vaticano
(RV) – A década de 90 marcou uma mudança nos destinos escolhidos pelos emigrantes
latino-americanos. Como os controles migratórios nos Estados Unidos passaram a ser
mais rígidos, surgiu na Europa o destino principal: a Espanha.
Alicia Maguid,
colaboradora da Organização Internacional para as Migrações (OIM), é co-autora da
pesquisa “Migrantes sul-americanos na Espanha: tendências e perfil dos protagonistas”.
Em entrevista à Rádio ONU, ela fala sobre o impacto deste fenômeno especialmente
para as mulheres migrantes e suas famílias.
Alicia Maguid diz que existem as
consequências emocionais, afetivas que atingem as famílias já que, para a maioria,
emigrar implica em separar-se da família.
Quando as mulheres emigram, muitas
delas sobrevivem com tarefas de cuidados, no que se denominam “cadeias globais de
cuidado”.
Maguid exemplifica isso ao dizer que elas fazem principalmente trabalhos
domésticos, cuidando de crianças ou de idosos. E, por sua vez, deixam seus filhos
a cuidados de outros. Existe uma transferência desse “cuidado” maior nos países em
desenvolvimento e isso se vê claramente no caso dos emigrantes sul-americanos, sobretudo
as mulheres que chegaram recentemente, de origem boliviana. Quase 70% delas executa
esse tipo de tarefa de cuidados e quase 60% delas têm filhos menores de 15 anos nos
países de origem que ficam aos cuidados de suas mães, irmãs, assim por diante.
Essa
é uma das facetas mais dolorosas da emigração que, segundo Maguid, se feminilizou.
“No coletivo vemos que as mulheres são maioria, exceto entre os argentinos
e uruguaios, onde há predominância masculina. Na realidade, a emigração se feminilizou
sobretudo a partir de 2003. Com essa mudança, precisamos dar atenção ao papel cada
vez mais ativo, na esfera econômica, das mulheres em seus países. Sem esquecer, por
outro lado, do processo de reunificação dessas famílias”.
De acordo com a pesquisa,
as famílias bolivianas são as que vivem uma situação de maior instabilidade e não
têm num futuro próximo expectativa de uma real reunificação familiar. Diante dos
efeitos da crise que atinge a Espanha, principal destino dos emigrantes sul-americanos,
Maguid destaca que ainda é preciso saber qual é o impacto da crise no setor dos emigrantes,
na possibilidade que retornem, o que vai acontecer com a mão de obra emigrante que
antes complementava a mão de obra espanhola e que agora pode chegar a ser competitiva.
A pesquisadora destacou ainda que foram criados planos de retorno, mas a adesão
a eles não foi aquela esperada. Contudo, os efeitos da crise nos fluxos migratórios
ainda estão sendo analisados.
“A partir de dados dos municípios espanhóis –
já que muitos emigrantes se registram para ter acesso à saúde e educação dos filhos
– o que vemos é que a chegada de emigrantes se estabilizou. Mas para termos certeza
disso precisamos esperar pelos dados do censo espanhol de 2011. Assim, poderemos ter
um parâmetro concreto ao comparar com os dados de 2001 e também avaliar os impactos
da crise”, antecipou.