Giglio: em que condições trabalham os marítimos? Ouça entrevista
Cidade
do Vaticano (RV) - O que aconteceu na ponte de comando do Costa Concordia entre
o momento que o navio colidiu em rochas a cerca de 300 metros da ilha de Giglio e
o soar do sinal do alarme de abandonar o navio? Esta pergunta, e muitas outras, ainda
não têm respostas.
Sabe-se que o navio se aproximou perigosamente de Giglio
para saudar os habitantes da ilha - e que isto era como uma “tradição” - só que nunca
tão próximo como na sexta-feira, e principalmente, nunca o fez tão perto dos perigosos
rochedos Le Scole.
E após a colisão? Muitos passageiros e tripulantes do Costa
Concordia relataram a evacuação do navio, o pânico, o medo, as atribulações e os momentos
dramáticos que viveram.
E na ponte do comando? O que é que aconteceu durante
esse tempo? Onde estavam os oficiais do Costa Concordia? Por que os tripulantes não
foram imediatamente avisados da gravidade da situação e instruídos para prepararem
a evacuação do navio? Por que se demorou tanto tempo para acionar os barcos salva-vidas,
ao ponto de quando começaram não conseguirem porque o navio estava inclinado?
Muitos
também reclamam que estavam de coletes vestidos no deck de acesso aos botes, mas que
os tripulantes ficavam parados, aguardando ordens. Enquanto isso, o Costa Concordia
continuava a se inclinar e vários passageiros e tripulantes se jogavam ao mar para
tentar chegar à terra nadando.
Enquanto alguns elogiam a bravura dos tripulantes
do Costa Concordia nos momentos difíceis, a tardia evacuação do navio pode ter feito
a diferença entre a vida e a morte para alguns dos passageiros.
Nosso aprofundamento
desta terça quer focar a questão da segurança dos passageiros e da tripulação das
embarcações que cruzam diariamente nossos mares e oceanos. Para isso, contatamos quem
está próximo dos marítimos: Pe. Samuel Fonseca é o coordenador do Apostolado do Mar
para a América Latina e o Caribe.
“Quem está de perto e acompanha este
tipo de situação sabe que existem naufrágios quase todos os dias. Quem acompanha a
situação dos marítimos ou até quem mora nas proximidades de portos ou do mar normalmente
vê grandes transatlânticos e cargueiros passarem todos os dias, mas de fora. Veem
praticamente os navios que vão e vêm e esquecem que dentro destes navios trabalha
um bom número de pessoas, como no caso do Costa, em que havia 1.100 tripulantes. Eu
acompanho este tipo de pessoas há 12 anos e o que encontramos a bordo destes navios?
Pessoas que trabalham com horários cansativos, tripulações mistas, isto é, pessoas
de diferentes países, que falam diferentes línguas, com diferentes religiões... Às
vezes, a diferença linguística faz com que a pessoa não se comunique, viva mais isolada
uma da outra, fazendo com que de fato carregue em si estresse, cansaço, fatiga, falta
da família, falta de tudo, praticamente”.
“Nós enfrentamos este mundo,
quem está de perto obviamente entende. Por exemplo, os tripulantes de transatlânticos
trabalham alguns dias 16, 18, 20 horas corridas. Pode-se imaginar como alguém possa
produzir, dar segurança, se manter acordada, estar bem para produzir bem e oferecer
segurança aos navios e aos passageiros. Vejo que é bastante difícil. Pude acompanhar
pequenos naufrágios, pequenos incidentes a bordo, e na maioria das vezes eles foram
causados por excesso de trabalho, de cansaço, dias longos, muitas horas de trabalho,
pouco descanso. As pessoas ficam sem dormir, e estes são motivos pelos quais acontecem
estes incidentes”.
“O Apostolado do Mar procura alertar os tripulantes,
mas por outro lado, estão as grandes empresas que não querem perder tempo, querem
que as pessoas trabalhem mais, produzam mais e esquecem este outro lado: a segurança,
o lado humano, espiritual, de que as pessoas precisam para produzir bem estar bem
descansadas, bem alimentadas. Os tripulantes precisam ter contato entre eles mesmos,
ter contato com suas famílias, e isto é o que falta a bordo destes navios e transatlânticos".