Belo Horizonte, 17 jun (RV) - É simples, mas ao mesmo tempo desafiador, concluir
que a vida se conduz e se sustenta de saberes, que são muitos, fonte de poder e até
de dominação. Sabido pode ser entendido como aquele que consegue, com palavras e artimanhas,
ludibriar os outros. Encontrar saídas e passagens, fazer valer e alcançar seus objetivos
e metas, até quando são espúrios e distantes do que se entende e é cidadania. Já vão
se tornando obsoletas, e até ridículas, frases ou atitudes que caracterizaram a sagacidade
política. Por exemplo, a arte de engambelar os outros, prometer e não cumprir, dar
tapinhas nas costas para agradar ou fazer afirmações - até contrárias à própria convicção
- para garantir simpatias e resultados positivos para pretensões, mesmo distantes,
em projetos próprios.
É esperançoso ver desmoronar, ainda que lentamente,
esse traço antipático na cultura e nas posturas, fruto da projeção que a exigência
e o gosto pela transparência e a verdade emolduram na vida social e política. Os saberes
científicos alargam horizontes, corrigem descompassos, realimentam a esperança de
conquistas e momentos novos mais propícios para a vida. Esses saberes constituem um
tesouro que expressa a magnificência da inteligência humana, os engenhos admiráveis
das pesquisas que modificam perspectivas. Abrem possibilidades e configuram esperanças
e boas condições para o viver humano e tratamentos mais racionais da natureza. Dão
iluminação diferente ao sentido da vida, ao grande e crucial desafio da existência.
Está localizada na gama complexa e fascinante dos saberes -ciência, política,
arte, tecnologia - a referência, sem igual, do saber que é a sabedoria. Vale lembrar
o tesouro da Palavra de Deus no livro bíblico da Sabedoria, referência insubstituível
e coluna de sustento na vida do Povo de Deus, a compreensão da sabedoria como virtude
e companheira. No capítulo oitavo dessa obra, ela é tida como um amor que se procura
desde a juventude. Quem quer ser sábio deve buscá-la com a pretensão de fazê-la sua
esposa, compreendendo que ela é conhecedora da ciência de Deus, é quem seleciona as
obras do Criador, é artífice do bom senso para tudo o que existe. Essa obra recorda
que o amor à justiça é fruto da sabedoria, pois ela ensina a temperança e a prudência,
a fortaleza - os bens mais úteis na vida.
Uma experiência vasta, como capacidade
de conhecer o passado e entrever o futuro, conhecendo a sutileza das palavras e as
soluções dos enigmas, brota e se mantém pela força da sabedoria. Sem seu saber e o
sabor, o bem se compromete, a justiça não é prioridade e a vida fica mais difícil
de ser vivida. Perde facilmente o sentido genuíno de dom. Aquele que se empenha, em
meio aos embates, para se apropriar de saberes que sustentam o exercício profissional,
abre caminhos para ganhos e sustentos da vida, por fazer da sabedoria a sua esposa.
“Nela tem uma fiel conselheira para o bem, o conforto nas preocupações e tristezas”,
assevera a literatura sapiencial mais genuína do Israel antigo. Por causa dela é que
se podem conquistar louvores diante da multidão; o jovem ser honrado pelos anciãos
e nos julgamentos se reconhece a perspicácia. De volta para casa, nela se encontra
descanso, pois sua companhia não traz amargura e nem tédio a sua convivência, mas
sim alegria e contentamento.
Os saberes todos têm sua dinâmica e lugar de produção,
destinação e atendimento de demandas próprias. O saber da sabedoria não está simplesmente
no ar. Ele se produz e se sustenta também em lugares e por dinâmicas. As obras de
infraestrutura em instituições ou cidades são de extrema importância. A queixa mais
lamentável é a defasagem no atendimento de demandas, com retardamentos que esgotam
a paciência, com escândalo de sacrifícios impostos, em especial sobre os mais pobres,
com a complicação advinda da falta de mão de obra especializada e de objetividade
e honestidade na gerência de processos.
As instituições e cidades precisam
também de obras, lugares de produção da sabedoria, certamente o tesouro mais precioso
para a vida de cada um, que pode amalgamar diferenças e com elas construir tempos
novos. Garantir sentido para a vida, que se não for autêntico e profundo não tem gosto
e torna-se campo aterrador de batalhas, disputas, desgostos e vaidades que enjaulam
a vida entendida e vivida no efêmero, que está no que é espetacular. É preciso ter
obras como lugar, referência símbolo permanente de beleza e ensinamentos, com dinâmicas
que permitam o entendimento, a busca e a súplica, como o sábio Salomão dirigia a Deus,
a fonte inesgotável da Sabedoria: “Dá-me a sabedoria que se assenta contigo no teu
trono, pois ela tudo conhece e compreende e me guiará com prudência”.
Dom
Walmor Oliveira de Azevedo Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte