Rio de Janeiro, 08 abr (RV) - Durante o nosso itinerário batismal, chegamos
ao anúncio de que viver a vida cristã é renascer, ter vida nova, sair do túmulo! A
experiência cristã é justamente essa vida que brota do encontro com Cristo e que torna
a pessoa discípula-missionária.
A passagem do Evangelho do quinto domingo
deste tempo favorável da Quaresma (cf. Jo 11,1-45) está entre tantas daquelas que
mostram a força e a grandeza de Jesus; Ele está longe da aldeia de Marta, Maria e
Lázaro, quando chega a notícia da morte de seu amigo. Jesus tinha muitos problemas
na Judéia para voltar por causa das ameaças recebidas, mas, por causa do seu amigo,
decidiu ir assim mesmo: Ele não se distancia do sofrimento e da tragédia da vida.
Podemos
pensar em quantas vezes nós não nos importamos com as pessoas, com seus problemas
e suas dificuldades. Isso tanto nas questões cotidianas como no anúncio de uma Boa
Notícia para aqueles que a esperam como a terra seca e árida pedindo chuva. Muitos
dos nossos, ainda hoje, muitas vezes querem ficar longe, ficar longe de tantos Lázaros
enterrados e oprimidos. Talvez esses, como Marta, também se voltam para Jesus e lhe
dizem uma espécie de censura: "Se tu estivesses aqui, meu irmão não teria morrido"
É como dizer: "Se tu estiveste perto, Senhor, não teria acontecido essa desgraça",
ou "Se você estivesse ao lado do povo, esses assassinatos não teriam ocorrido", e
assim por diante. O Evangelho, de fato, nos diz que não é Jesus que está longe, mas
os homens. E, às vezes, isso impede até mesmo de chegar perto de Jesus. Perguntemo-nos
onde estamos, sim, enquanto milhões morrem de fome? Onde estamos, enquanto milhares
de pessoas estão sozinhas e abandonadas em hospitais? Infelizmente nós, muitas vezes,
estamos longe de nossos irmãos.
Podemos estar falhando em anunciar essa proximidade
do Senhor diante da vida e sofrimentos da pessoa. Porém, o Senhor está ali próximo
e chora sobre seus amigos abandonados, como chorou por Lázaro. Isso vai acontecer
com Ele em poucos dias, no Getsêmani, quando ficará sozinho e suará e derramará como
gotas de sangue. Jesus fica sozinho na frente de Lázaro a esperar contra todas as
probabilidades. Até mesmo as irmãs tentaram dissuadi-lo, mas Ele quer abrir o túmulo.
"Senhor, já cheira mal: está lá há quatro dias", diz Marta. Este texto vai, porém,
muito mais longe: é o anuncio batismal que nos chama a uma nova vida.
A vida
no pecado e longe de Deus pode desencadear um desânimo, achando que nada tem mais
jeito. Os que ainda não foram iluminados pelo batismo podem pensar que não vale a
pena sair da situação em que se encontram. Muitos acham impossível alguém sair da
situação podre de sua vida. É o grande anúncio batismal que está no centro da perícope
deste domingo.
O amor do Senhor não conhece limites, mesmo os de morte: quer
o impossível. Esse túmulo, portanto, não é a última morada dos amigos de Jesus, por
isso grita: "Lázaro, vem para fora". Um amigo ouve a voz de Jesus, exatamente como
está escrito: "As ovelhas conhecem a sua voz" E, novamente, o bom pastor "chama as
suas ovelhas, cada uma pelo nome e as conduz para fora" (Jo 10, 3). E agora o profeta
Ezequiel tinha escrito: "Eis que eu abrirei as vossas sepulturas, e vos farei sair
das vossas sepulturas, ó meu povo" (37, 12). Lázaro escuta, e sai. Jesus não fala
a um morto, mas a um vivo, talvez para um que está dormindo, por isso grita. E convida
os outros para desenrolarem as faixas em que o amigo encontra-se envolvido. Mas libertando
Lázaro “morto” das faixas, Jesus liberta-nos, na verdade, cada um de nós do egoísmo,
da frieza, da indiferença, da morte dos sentimentos. Temos necessidade que outros
nos ajudem em nosso itinerário batismal, desenrolando as faixas que nos amarram. É
justamente a figura da nova criatura que deve ressuscitar com Cristo. "Eu sou a ressurreição
e a vida", disse o Senhor. No seu Evangelho, em seu corpo, a vida é ressuscitada.
"Tirai a pedra".
O Papa Bento XVI em sua mensagem quaresmal nos ensina que:
“Quando, no quinto domingo, nos é proclamada a ressurreição de Lázaro, somos postos
diante do último mistério da nossa existência: “Eu sou a ressurreição e a vida...
Crês tu isto?” (Jo 11, 25-26). Para a comunidade cristã é o momento de depor com sinceridade,
juntamente com Marta, toda a esperança em Jesus de Nazaré: “Sim, Senhor, creio que
Tu és o Cristo, o Filho de Deus, que havia de vir ao mundo» (v. 27). A comunhão com
Cristo nesta vida prepara-nos para superar o limite da morte, para viver sem fim n’Ele.
A fé na ressurreição dos mortos, a esperança da vida eterna abrem o nosso olhar para
o sentido derradeiro da nossa existência: Deus criou o homem para a ressurreição e
para a vida, e esta verdade doa a dimensão autêntica e definitiva à história dos homens,
à sua existência pessoal e ao seu viver social, à cultura, à política, à economia.
Privado da luz da fé, todo o universo acaba por se fechar num sepulcro sem futuro,
sem esperança. O percurso quaresmal encontra o seu cumprimento no Tríduo Pascal, particularmente
na Grande Vigília na Noite Santa: renovando as promessas batismais, reafirmamos que
Cristo é o Senhor da nossa vida, daquela vida que Deus nos comunicou quando renascemos
“da água e do Espírito Santo”, e reconfirmamos o nosso firme compromisso em corresponder
à ação da Graça para sermos seus discípulos”.
Jesus abre o lugar da morte,
Ele nos tira de nossas mortes, arranca-nos dos túmulos! É vida do batizado, do cristão
que morre com Cristo e com Ele ressuscita! "Lázaro, vem para fora". Jesus chama a
todos pelo nome. Assim é o nosso batismo; somos chamados pelo nome! O nome significa
toda a vida de um homem. Ele defende-nos do mal. Seu amor é pessoal. Hoje, a amizade
de Deus, que vemos refletida na amizade que Ele gera entre os homens, recorda a alegria
dos corações e um mundo reduzido aos túmulos. Lázaro antecipa a Páscoa quando Jesus,
o redentor do homem, traz a vida para os que creem n´Ele e nos chama a anunciá-Lo
com alegria aos irmãos e irmãs de nosso tempo.
† Orani João Tempesta, O. Cist. Arcebispo
Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro, RJ