Rio de Janeiro, 25 mar (RV) - A cada ano, no dia 25 de março a Igreja celebra,
com solenidade, a Anunciação do Anjo à Virgem Maria e a Encarnação do Verbo de Deus
no seio d'Aquela que é bendita entre todas as mulheres. Trata-se de um dia muito apropriado
para rezarmos pelas vocações, pois este é o dia em que Maria deu o seu SIM integral
à obra de salvação planejada por Deus e realizada por intermédio d'Ela. É uma oportunidade
de trabalharmos pela cultura da vida, pois é o dia em que o próprio Deus se fez homem,
a Vida Eterna se fez vida humana e em muitos países se comemora o Dia da Vida. É o
momento de rezarmos e apoiarmos as grávidas e as mães, exaltando a Maternidade Divina.
Peçamos a Nossa Senhora que as proteja de todo o mal, principalmente aquelas que trazem
no ventre os seus filhos. Na primeira leitura da Liturgia da Anunciação do Senhor
(Is 7,10-14;8,10) ouvimos o anúncio do grande sinal do Amor de Deus pelos homens.
Deus virá morar conosco, profetiza Isaías, pois o filho que nascerá de uma virgem
é o próprio Filho unigênito de Deus que vem ao encontro dos homens para salvá-los
e introduzi-los, como filhos, na intimidade divina. A narrativa de São Lucas nos permite
presenciar a cena em que se desenrola o cumprimento do grande sinal. Deus anuncia
a Maria de Nazaré, por meio de um anjo, o seu desígnio de amor pelos homens, e pede
a resposta de Nossa Senhora. O diálogo culminará com o “faça-se” de Maria e a realização
do mistério da Encarnação do Verbo de Deus. Aparentemente nada mudou no mundo,
contudo, o Cosmos acabou de ser transformado até as suas raízes mais profundas. O
Universo “cheira a novo” como no dia em que surgiu do nada pela primeira vez. A Encarnação
redentora do Verbo de Deus, que acaba de acontecer, é uma nova Criação. Este grande
mistério que contemplamos hoje, conduzido pela Liturgia a ponto de nos ajoelharmos
durante a profissão de fé, ao proclamar: “e se encarnou”, não possui outra explicação,
como o primeiro ato criador, senão o amor infinito de Deus. Deus não desiste do seu
desígnio de amor pelas criaturas, e entra no tempo dos homens de um modo novo e inimaginável
para nos introduzir na sua eternidade bem-aventurada. Nunca devemos nos cansar
de contemplar e agradecer o amor infinito com que somos amados por Deus, e devemos
procurar corresponder com a plenitude de entrega, do modo que o fez a Virgem Maria,
Mãe de Deus e nossa mãe. Na segunda leitura (Hb 10,4-10), o Autor sagrado nos apresenta
a perfeita obediência de Jesus ao desígnio salvador do Pai. As palavras que coloca
na boca do Senhor “Eis-me aqui: Eu venho para fazer a tua vontade!”, são o resumo
da sua vida redentora e a causa da nossa salvação. Convém, por isso, nunca nos
esquecermos de que a vontade de Deus, que é amor, só pode conter desígnios de amor,
e, por isso, tudo o que vem de Deus é manifestação de seu amor para nosso bem e felicidade. A
obediência à vontade de Deus é o único caminho para chegar à plena realização e felicidade;
o único caminho para ser santo. Por isso, jamais pode ser vista como obstáculo para
o exercício da própria liberdade, autonomia e maturidade. A liberdade é a capacidade
de autodeterminação para alcançar o próprio bem. Mas o próprio bem é precisamente
a vontade de Deus para nós. Por isso, a obediência é sempre o pleno exercício da liberdade. A
resposta de amor com que o homem e a mulher correspondem ao amor paternal de Deus
não é outra coisa que a obediência. Não devemos confundir o amor com a emoção ou sentimento
que costuma acompanhá-lo, mas que pode faltar e não se identifica com ele. As consequências
que seguiram da resposta de Maria na Anunciação jamais poderiam ser sonhadas pela
imaginação humana, nem sequer a da “Cheia de graça”. Aquele “faça-se” transformou
o Universo, levou o tempo à sua plenitude e tornou o momento em que foi pronunciado
o centro de referência de toda a História humana. O passado e o futuro da humanidade
e da criação ficaram orientados em referência a esse instante em que a eternidade
de Deus penetra no tempo humano e dá início à redenção salvadora em Cristo. O Senhor
encarna para se unir de algum modo a cada homem, tornando-se o seu caminho e companheiro
na sua Igreja, até conduzi-lo à casa do Pai. Meditemos nessa solenidade da Anunciação
do Senhor especialmente em como um “sim” a Deus tem sempre consequências inimagináveis
para a criatura, e como é importante saber discernir a vontade de Deus a nosso respeito
nos aspectos transcendentes e nos mais comuns da nossa vida. Não nos esqueçamos de
que muitas coisas grandes dependem de que nós vivamos como Deus quer. Peçamos hoje,
pois, a Nossa Senhora a graça de repetirmos, com os fatos, o “faça-se” que Ela disse
no dia da Anunciação.
† Orani João Tempesta, O. Cist. Arcebispo Metropolitano
de São Sebastião do Rio de Janeiro, RJ