Belo Horizonte, 04 fev (RV) - Pode parecer um despropósito a abordagem conjunta
sobre celebridade e doença. Particularmente quando se pensa na pessoa célebre como
alguém com potência de força, seja física, esportiva, artística ou política - condição
contrária à fragilidade do doente. No entanto, a condição humana pode hospedar, num
tempo ou noutro, cedo ou tarde, força e fraqueza. O apóstolo Paulo, na primeira carta
que escreveu aos Coríntios (capítulo sétimo), adverte: “Os que choram vivam como se
não chorassem, e os que estão alegres como se não estivessem alegres; os que fazem
compras como se não estivessem adquirindo coisa alguma, e os que tiram proveito do
mundo como se não aproveitassem. Pois a figura deste mundo passa”. Essa advertência
paulina projeta luzes sobre a realidade da espécie humana, tanto na força quanto na
fraqueza. Ninguém é poderoso sempre, possui tudo sempre, tem força física sempre.
E mais, ninguém está imune ao sofrimento e à dor, seja na própria vida, na família
ou nas instituições que frequenta. Nem os amigos estão imunes. Essa verdade, que constantemente
deve ser considerada, devolve cada um à realidade da sua condição de ser humano. Pela
força da sabedoria, demove do orgulho e da soberba, além de corrigir o coração e a
inteligência de toda indiferença causadora da falta de solidariedade, que impede a
igualdade e perpetua as discriminações.
A consideração da fraqueza que se
hospeda no ser humano, seja no enfermo, no pobre, no outro que pode menos, tem sido
ofuscada, ilusoriamente, pela apelação das disputas e apegos pelo poder. Não menos,
e de modo imoral, seduzindo multidões e tirando, como caça-níqueis, o seu dinheiro,
por meio de espetáculos questionáveis, como é o caso do Big Brother. Na verdade, sob
o apanágio do poder e dos momentos de celebridade, mesmo com a exposição do próprio
corpo, da privacidade e dos desejos escondidos de ter e poder mais, o que se oferece
em tal espetáculo é digno de lástima. Assiste-se a um show que mostra a fragilidade
humana, a falta de valores e do sentido de dignidade e respeito. Voltar o olhar para
quem precisa, especialmente, o doente contracenando com a condição de celebridade,
é um exercício educativo, oportuno na vida de qualquer um. Seja para os jovens de
modo a não viverem na ilusão e chegarem despreparados ao lugar e à condição que todos
chegam, ou os adultos, no auge da ascensão e conquistas, para que o orgulho e a soberba
não os derrubem, com celeridade inusitada, dos postos e funções de um momento glorioso
e passageiro.
Não por acaso havia o costume de, no momento glorioso das entronizações
reais, entre louros, coroas e ovações, apresentar a lápide da celebridade com a inscrição,
“Aqui jaz”. Isso para indicar o lugar de sua sepultura e sua condição final, que não
será definitiva - em termos de condenação - para aqueles que praticam o bem, são misericordiosos,
humildes e depositam a confiança em Deus.
A propósito, o Papa Bento 16 cita,
em bela mensagem para o Dia Mundial do Doente, em 11 de fevereiro, dia de Nossa Senhora
de Lourdes, o que disse o apóstolo Pedro (1ª Carta 2,24): “Pelas suas chagas fostes
curados”. Isso, para reavivar na memória de todos que o Filho de Deus sofreu, morreu,
mas ressuscitou. Suas chagas são o sinal da redenção, do perdão e da reconciliação,
uma prova para a fé de todos os discípulos. O Papa dirige-se aos doentes e sofredores
relembrando que “é justamente através das chagas de Cristo que podemos ver, com olhos
de esperança, todos os males que afligem a humanidade. Ressuscitando, o Senhor não
tirou o sofrimento e o mal do mundo, mas os extirpou pela raiz. À prepotência do mal
opôs a onipotência do seu amor”.
Nesta semana que antecede o Dia Mundial do
Doente vale acolher o convite para olhar os enfermos no hospital, em casa, nos asilos,
casas de repouso ou nas clínicas e abrigos. Que crianças, jovens, adultos e velhos,
com reverência traduzida em gestos de solidariedade, ofertas e presença consoladora,
sejam um apelo para que haja mais investimentos em saúde, com boas estruturas médicas
para todos, em especial os mais pobres e sofredores. Vale lembrar as palavras de Cristo
para o juízo final, ao falar da garantia para a participação no Reino de Deus: “Estive
doente e me visitastes”.
Dom Walmor Oliveira de Azevedo Arcebispo metropolitano
de Belo Horizonte (CM)