A Palavra de Deus é a verdadeira estrela que nos deve guiar: Bento XVI na homilia
da Missa da Epifania
(6/1/2011) O Papa Bento XVI presidiu, nesta Quinta-feira, na Basílica de S. Pedro
à Missa na solenidade da Epifania (palavra de origem grega que significa “manifestação”),
ligada ao relato evangélico sobre os Reis Magos, e que nalguns países se celebra
a 6 de Janeiro (em Portugal ocorreu no dia 2, Domingo depois do Natal). A linguagem
da criação permite-nos percorrer um certo caminho em direcção a Deus, mas só as Sagradas
Escrituras nos fornecem a luz definitiva: esta a consideração central do Papa na homilia,
comentando o Evangelho dos Magos vindos do oriente. Bento XVI começou por recordar
que esta solenidade da Epifania sublinha a destinação e o significado universal do
nascimento de Jesus Salvador: “o Filho de Deus veio não só para os filhos de Israel,
representados pelos pastores de Belém, mas também para toda a humanidade, representada
pelos Magos”. Herodes, os especialistas nas Sagradas Escrituras e a estrela –
foram três pontos do Evangelho do dia comentados pelo Papa. Herodes – observou
- é “um homem de poder, que no outro não consegue ver senão um rival a combater”.
Pensando bem, “também Deus lhe parece um rival, um rival particularmente perigoso,
que quereria privar os homens do seu espaço vital, da sua autonomia, do seu poder”. “Deveríamos
interrogar-nos se não existirá também em nós algo de Herodes. Porventura também nós
por vezes vemos Deus como uma espécie de rival? Porventura também nós somos cegos
em face dos seus sinais, surdos às suas palavras, porque pensamos que ele põe limites
à nossa vida e não nos deixa dispor da existência a nosso bel prazer?(…) Precisamos
de tirar da nossa mente e do nosso coração a ideia de rivalidade, a ideia de que dar
espaço a Deus é um limite para nós próprios. Temos que nos abrir à certeza de que
Deus é o amor omnipotente que não retira nada, não ameaça, pelo contrário, é o Único
capaz de nos oferecer a possibilidade de viver em plenitude, de experimentar a verdadeira
alegria” . Para além de Herodes, os Magos confrontam-se com “os estudiosos, os
teólogos, os que sabem tudo sobre as Sagradas Escrituras, que conhecem todas as interpretações
possíveis, que são capazes de citar de cor todas as passagens e que portanto são uma
preciosa ajuda para quem quer percorrer o caminho de Deus”. Por vezes para estes especialistas,
“as Escrituras tornam-se como uma espécie de atlas a ler com curiosidade, um conjunto
de palavras e conceitos a examinar e sobre os quais discutir doutamente”… Vale a pena,
aqui também, que nos interroguemos: “Não há também em nós a tentação de considerar
as Sagradas Escrituras, este tesouro riquíssimo e vital para a fé da Igreja, mais
como objecto de estudo e discussão para especialistas, do que como o Livro que nos
indica o caminho para chegar à vida? Como indiquei na Exortação apostólica “Verbum
Domini”, penso que deveria nascer em nós, sempre de novo, a disposição profunda de
ver a palavra da Bíblia, lida na tradição viva da Igreja, como a verdade que nos diz
o que é o homem e como se pode realizar plenamente, a verdade que é o caminho a percorrer
dia a dia, juntamente com os outros, se queremos construir a nossa existência sobre
a rocha e não sobre a areia.” Finalmente, os Magos deixam-se guiar por uma estrela.
Que quer isso dizer? “Aqueles homens procuravam as marcas de Deus; procuravam
ler a sua “marca” na criação; sabiam que ‘os céus narram a glória de Deus’; ou seja,
tinham a certeza de que Deus pode ser vislumbrado na criação. Mas como homens sapientes,
sabiam também que não é com um telescópio qualquer , mas com os olhos profundos da
razão à busca do sentido último da realidade e com o desejo de Deus animado pela fé,
que é possível encontrá-lo, mais ainda, que se torna possível que Deus se aproxime
de nós… Na beleza do mundo, no seu mistério, na sua grandeza e na sua racionalidade
não podemos deixar de ler a racionalidade eterna e não podemos senão deixar-nos guiar
por ela até ao Deus único, criador do céu e da terra”. É quando deixam o palácio
de Herodes, que os Magos acabam por ser conduzidos até ao Menino. Afinal, não era
no palácio real, na corte de Jerusalém, que se encontrava o novo Rei que eles procuravam… “Tiveram
que constatar que aquele recém-nascido não se encontrava nos lugares do poder e da
cultura, embora nesses lugares fossem fornecidas preciosas informações sobre ele.
Deram-se conta de que por vezes o poder, mesmo o do conhecimento, barra a estrada
que conduz àquele Menino. A estrela guiou-os então até Belém, uma pequena cidade.
Guiou-os até ao meio dos pobres, dos humildes, para encontrar o Rei do mundo. Os critérios
de Deus são diferentes dos dos homens. Deus não se manifesta na potência deste mundo,
mas na humildade do seu amor, aquele amor que solicita a nossa liberdade para ser
acolhido e transformar-nos e tornar-nos capazes de chegar àquele que é o Amor.” Do
conjunto do episódio evangélico dos Magos, Bento XVI extraiu, a concluir, um conclusão
global: A linguagem da criação permite-nos percorrer uma boa parte de estrada
em direcção a Deus, mas não nos dá a luz definitiva. Ao fim e a cabo, para os Magos
foi indispensável escutar a voz das Sagradas Escrituras: só elas lhes podiam indicar
o caminho. É a Palavra de Deus a verdadeira estrela, que, na incerteza dos discursos
humanos, nos oferece o imenso esplendor da verdade divina. Caros irmãos e irmãs,
deixemo-nos guiar pela estrela, que é a Palavra de Deus, sigamo-la na nossa vida,
caminhando com a Igreja, onde a Palavra implantou a sua tenda. O nosso caminho será
sempre iluminado por uma luz que nenhum outro sinal nos pode dar. E poderemos também
nós tornar-nos estrelas para os outros, reflexo daquela luz que Cristo fez resplandecer
sobre nós. Ámen!