Rio de Janeiro, 26 dez (RV) - Dentro da oitava de Natal e vivendo as alegrias
da festa do Mistério da Encarnação de Jesus Cristo, a Igreja celebra, neste domingo,
a festa da Sagrada Família, apresentando-nos Jesus, Maria e José, a família de Nazaré,
como inspiradora e modelo para todas as outras. Todos nós conhecemos os nomes e
santidade de seus membros: Jesus – Deus entre nós, que nos salva; Maria – a cheia
de graça; José – o homem justo. Uma família sagrada! Os textos bíblicos dessa festa
litúrgica apresentam-nos de um lado a Sagrada Família e de outro as qualidades e as
virtudes que devem ser buscadas para que realmente nossas famílias sejam sagradas.
A celebração nos convida a refletir sobre a família hoje, seus problemas, desafios
e esperanças. Somos convidados pela Igreja a debruçar nosso olhar sobre esta realidade
tão próxima de nossa vida cotidiana como uma chamada de atenção acerca dos rumos que
o secularismo leva a dilapidar a entidade familiar, do casamento de um homem com uma
mulher. Se nunca olharmos reflexivamente as realidades cotidianas mais próximas, elas
perderão sua evidência vital e decairão inexoravelmente. Refletir como cristãos sobre
a família hoje é uma necessidade, pois estamos sujeitos a uma pressão contrária constante,
e não é cristã, que imperceptivelmente, sem que o percebamos, transforma nosso pensar,
e o transforma para pior. Na "pregação" de revistas, novelas, filmes, livros e romances,
o amor esponsal não é mais entendido como uma entrega da vida ao cônjuge num decidido
amor oblativo que, passando pelas crises do convívio de individualidades diferentes,
sempre ressurge, renasce, renova-se, cresce e amadurece. Para eles é entendido como
busca da "minha" felicidade, isto é, como busca de si, tornando o amor esponsal superficial
e frágil, em que a emotividade subjetiva toma lugar da decisão vital e, com isso,
não há capacidade de resistir às inevitáveis tempestades da vida. O amor esponsal
cristão como "decisão de toda uma vida" tem como referencial o amor com que o Senhor
nos amou. É um amor que exige busca e luta, sim, mas que dá profunda realização ao
viver conjugal, tornando-o elo conquistado de vigor indissolúvel, aliança eterna de
duas existências. É este o amor que tem a capacidade de criar os filhos, educá-los
e torná-los aptos para uma vida de bem. Edificados em cima de um fundamento como este,
eles não cairão facilmente nos desvios que a face decadente de nossa sociedade ostensivamente
lhes oferece, como drogas, sexo, alienação das questões sociais e políticas, exasperada
afirmação de si, na indiferença e, muitas vezes, na exclusão e na exploração do outro. Contemplando
a Sagrada Família, somos convidados a olhar para as nossas, que estão expostas a tantas
dificuldades. E somos interpelados pelo Evangelho de Jesus Cristo para que façamos
delas verdadeiras comunidades de fé e de amor, promotoras e defensoras da vida em
todas as dimensões, alicerçadas nos valores da fidelidade e da indissolubilidade. Ao
celebrarmos a festa da Sagrada Família, somos convidados a viver os valores que as
leituras bíblicas dessa celebração nos apresentam. O livro do Eclesiástico nos propõe
amar e respeitar nossos pais: "Quem honra seu pai alcança o perdão dos pecados, quem
respeita sua mãe é como alguém que ajunta tesouros." E o apóstolo Paulo, na Carta
aos Colossenses, exorta-nos a revestirmos de misericórdia, bondade, humildade e mansidão,
e insiste para que saibamos amar e perdoar. São os caminhos para se construir uma
verdadeira família. Busquemos a inspiração familiar na contemplação da Sagrada
Família de Nazaré. Neste dia seguinte ao santo Natal dirijamos o nosso olhar ao Menino
Jesus que, na casa de Maria e de José, cresceu em sabedoria e conhecimento, até o
dia em que deu início ao seu ministério público. O Concílio Vaticano II ensina-nos
que as crianças desempenham um papel especial, fazendo crescer os seus pais em santidade
(cf. Gaudium et spes, 48). Convido os jovens para que reflitam sobre isso, permitindo
que o exemplo de Jesus vos oriente não apenas na manifestação do respeito aos vossos
pais, mas também os ajudando a descobrir mais plenamente o amor, que confere à vossa
vida o sentido mais completo. Na Sagrada Família de Nazaré, Jesus ensinou a Maria
e José um pouco da grandeza do amor de Deus, seu Pai celeste, nascente última de cada
amor, o Pai de quem toda a paternidade no céu e na terra adquire o seu nome (cf. Ef
3, 14-15). Que Jesus, Maria e José abençoem e encorajem nossas famílias para que
elas sejam fiéis à missão que Deus lhes confiou, sendo verdadeiras "Igrejas domésticas"
a testemunhar para o mundo os valores evangélicos, a exemplo da família santa de Nazaré.
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Orani João Tempesta, O. Cist. Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de
Janeiro, RJ