Presidente da CEP defende autoridade da Igreja sobre as Misericórdias; o entendimento
dos Bispos portugueses foi confirmado pelo Vaticano
(7/10/2010) Os bispos portugueses consideram que a classificação das Misericórdias
como “associações públicas de fiéis” não é uma novidade, mas remonta a 1988, parecer
que foi sucessivamente confirmado pelo Vaticano em 1992 e 2003. Este enquadramento
jurídico ficou mais explícito com a aprovação por parte da Conferência Episcopal de
um Decreto Geral que consigna a natureza canónica (interna da Igreja Católica) daquele
estatuto. D. Jorge Ortiga reconhece que, em Portugal, as Misericórdias “sempre
gozaram de privilégios e de dispensas concedidas pela autoridade eclesiástica dos
Bispos diocesanos”. Mas esta autonomia, adverte o prelado, “em caso algum pode
pôr em causa os ‘elementos constitutivos essenciais’ das associações públicas de fiéis”,
que “não podem ser transformadas, sub-repticiamente, em associações privadas de fiéis”. Em
28 de Setembro, o presidente da Conferência Episcopal Portuguesa, D. Jorge Ortiga,
enviou um e-mail aos provedores das Misericórdias no qual recorda os fundamentos canónicos
da legislação. O texto realça que a autonomia das Misericórdias continua e que
não são os bispos diocesanos a dirigi-las, dado que a eles cabe “apenas” a “tutela
eclesiástica”, que não abrange o poder de aprovar as contas daquelas instituições,
incumbência que cabe às suas assembleias gerais. O presidente da Conferência Episcopal
refere ainda que teve “vários encontros” com o presidente do Secretariado Nacional
da UMP, Manuel de Lemos, nos quais reiterou que o Decreto não poderia ser negociado,
embora houvesse abertura do episcopado para a constituição de uma Comissão Mista que
regulamentasse a legislação, com vista a salvaguardar o “regime especial” das Misericórdias. “O
Sr. Dr. Manuel Lemos pretendia que fosse a Comissão Mista a elaborar uma decisão.
Como esta já estava tomada desde 1988, para mim, bastaria explicitar um comportamento
de comunhão e unidade eclesial sem perturbar a autonomia, o que esperamos venha a
acontecer, através dum Regulamento a elaborar em breve”, escreve o arcebispo de Braga. A
legislação, sancionada pelo episcopado português em 23 de Abril de 2009 e confirmada
pelo Vaticano em 17 de Junho deste ano, tem provocado a contestação pública do Conselho
Nacional da União das Misericórdias Portuguesas (UMP). Em comunicado divulgado
esta Quarta-feira, as Misericórdias sublinham que “não aceitam” o Decreto que, segundo
o seu entendimento, as converte em associações públicas de fiéis, tornando-as dependentes
dos bispos, nomeadamente quanto à administração dos bens e intervenção na eleição
dos dirigentes. Para D. Jorge Ortiga, no entanto, "a praxe da Cúria Romana firmou-se
na natureza pública das Misericórdias portuguesas pelos Decretos do Pontifício Conselho
para os Leigos de 30.11.1992 e de 13.5.2003”, e no “mesmo sentido” seguiu a jurisprudência
do Supremo Tribunal da Igreja Católica através de sentenças proferidas em 1999 e 2005”. “Mediante
esta interpretação ‘autêntica’ do Direito Canónico, feita pelo mais alto Tribunal
da Igreja Católica, dúvidas não restam de que as Misericórdias portuguesas são associações
públicas de fiéis”, assinala o documento. As Associações públicas de fiéis são,
de acordo com o Direito Canónico, as erectas pela competente autoridade eclesiástica
(Santa Sé, Conferência Episcopal ou Bispo, consoante o respectivo âmbito de acção),
tanto constituídas por iniciativa desta autoridade como pela dos fiéis. Actualmente
a UMP integra e coordena aproximadamente cerca de 400 Santas Casas de Misericórdia,
em Portugal, incluindo as Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores, e apoia a fundação
e recuperação de Misericórdias nos Países de Língua Portuguesa (Angola, São Tomé,
Moçambique e Timor-Leste) e ainda nas comunidades de emigrantes.