Em Portugal, caricaturas e anti-clericalismo moldaram opinião pública na Primeira
República
(23/9/2010) As caricaturas e o anti-clericalismo, incluindo o que se produziu dentro
da Igreja Católica, foram dois dos elementos mais importantes da imprensa portuguesa
durante a mudança do regime da Monarquia para a República. Na conferência de abertura
das Jornadas Nacionais das Comunicações Sociais, que se realizam hoje e amanhã em
Fátima, o historiador António Matos Ferreira sublinhou a importância das caricaturas
na fixação de “mitos comunicacionais” que se tornaram “elementos de rigidez societária”. Além
da oposição aos organismos e estruturas eclesiais defendida e propagada por parte
significativa de sectores ligados ao regime republicano, o anti-clericalismo foi também
factor reagente para a recomposição da Igreja Católica. Numa época em que o alcance
da comunicação social era mais reduzido, a informação difundida através de jornais,
diários, semanários, revistas e folhas volantes era ampliada pelo clero, que além
de formar a opinião e os comportamentos, difundia as notícias veiculadas na imprensa. No
entender do investigador, a imprensa católica contribuiu para galvanizar energias
na Igreja, embora não tenha alcançado “a reconquista cristã total da sociedade”. “Estamos
diante de um jornalismo genericamente militante”, sublinhou António Matos Ferreira,
acrescentando que a imprensa, “era em larga medida”, programática e propagandística. Estes
elementos caracterizaram igualmente os jornais ligados a instituições eclesiais, cuja
variedade de pontos de vista sobre a Igreja e o novo regime são reveladores da “complexidade
do catolicismo” do tempo, tornando difícil a aplicação da distinção entre “boa e má
imprensa”, surgida nos meios católicos do tempo. A construção de diferentes narrativas
dos acontecimentos por parte de uma imprensa onde as “fronteiras entre o que acontece
e o que se deseja que aconteça eram ténues”, constituíram factores de transformação
social, mas também de conflito.