Cidade do Vaticano, 20 set (RV) - Escutamos nesses domingos proclamações da
Palavra que nos convidam a refletir sobre a nossa conversão concreta neste espaço
de tempo que temos, que é a nossa vida.
Na primeira leitura do 26º domingo
(Am 6, 1ª.4-7) o profeta Amós nos apresenta uma denúncia contra os gananciosos que
se sentem seguros e confiantes diante do poder e das riquezas, sem se preocuparem
com os necessitados, esquecendo-se dos pobres e vivendo em abundância, em festas e
orgias, continuando o tema do 25º domingo (Am 8, 4-7).
O mesmo contraste
aparece também na parábola contada por Jesus, lida no 26º domingo: o homem rico e
Lázaro (Lc 16, 19-31), formando esta um todo orgânico sobre o tema da justiça social,
junto com a parábola do administrador desonesto, que lemos no 25º domingo (Lc 16,
1-13).
Na parábola do administrador desonesto, porém esperto, e na parábola
do Pai misericordioso, do 24º domingo (Lc 15, 1-32), assim como na relação entre o
rico e Lázaro, percebemos a importância do tempo para a reflexão e conversão que o
Senhor nos concede.
O filho mais novo que saiu de casa e com o tempo e os
acontecimentos decidiu voltar, também o administrador que diz: “já sei o que fazer
para que haja quem me receba em sua casa quando eu for despedido do emprego”: este
também reflete para o tempo que ainda lhe resta.
Na parábola do homem rico
e Lázaro, o tempo de conversão já passou e é isso que acontece ao homem cheio de bens,
que foi em vida tão indiferente aos pobres, simbolizado pelo próprio Lázaro que ficou
deitado ao lado de sua porta. Não havia mais tempo para apelar a Abraão. Ambos morreram
– o pobre morreu e o rico também morreu (ninguém escapa da morte). Mas, enquanto o
rico estava na morada dos mortos, no meio dos tormentos, Lázaro foi levado para junto
de Abraão e os Patriarcas para compartilhar com eles o banquete do reino.
A
parábola mostra-nos que o que condenou o rico foi a sua indiferença, como aparece
na denúncia do profeta Amós. Entre eles há um abismo intransponível, razão pelo qual
Abraão não pode enviar Lázaro para os injustos mudarem de vida enquanto têm tempo.
São
João Crisóstomo, comentando este evangelho, nos diz que o rico não pode ser desculpado
pela ignorância, pois não pode dizer que não viu o pobre, já que este esteve à beira
de sua porta. O homem rico é acusado de orgulho. Sentiu-se melhor sendo rico, do que
sendo sensível e aberto ao outro, assim nos explica Santo Agostinho. O seu arrependimento
foi tardio e o seu pedido insólito, já que seus parentes também estavam fechados em
sua própria riqueza, mantinham o mesmo estilo de vida.
“Eles têm Moisés e os
profetas, que os ouçam”. A lei de Moisés mandava amparar os pobres, e os profetas
pediam a partilha com os indigentes. Recordamos novamente a leitura de Amós. Aqui
é impossível não ter presente o mês da Bíblia: a Palavra de Deus já nos esclarece
e ilumina nosso caminhar!
Interessante a resposta de Abraão: se não ouvem a
Moisés, mesmo que ressuscite alguém dentre os mortos, eles não irão se convencer.
E aqui recordamos com muita clareza que nem todos acreditaram, e até hoje não acreditam,
mesmo tendo ocorrido a Ressurreição de Jesus.
Na história da aparição de Jesus
ressuscitado aos discípulos de Emaús, São Lucas volta ao tema do reconhecimento: quando
Jesus é reencontrado por eles na mesa do pão e na sua distribuição, ou seja, no partilhar
o pão.
Lázaro é Jesus, coberto de chagas, deitado agora sobre a cruz (Santo
Agostinho), e os seus próprios discípulos não o reconhecem, não o encontram, porque
não são verdadeiros discípulos, não lhes queima o coração quando Ele mesmo nos fala
através de Sua Igreja. Não o reconhecemos, pois não partilhamos, não nos compadecemos
com o outro. Entre nós está e não o reconhecemos!
Todo o trabalho social que
fazemos se baseia em reconhecer Jesus no outro, pois quando ocorre O encontramos no
pobre e excluído. Tudo o que fizerdes ao menor dos meus irmãos é a mim que fazeis,
nos recorda Jesus. O tempo que utilizamos para essa missão é de encontro com o Senhor.
Ainda
hoje, num mundo marcado por ganâncias, violências, falta de respeito à vida, disputas
de poder, por intrigas, por fofocas, por busca desenfreada de prestígio e de posições,
nós devemos viver um tempo forte de penitência, de conversão e de mudança de vida.
Ainda hoje tantos são os homens e mulheres de boa vontade que teimam em não reconhecer
Jesus!
Nestes dias, ocorre em paróquias e grupos específicos de nossa arquidiocese
a “Campanha Daniel” de Jejum e Orações (Dn 10, 2-3) durante 21 dias, movimentando
milhares de pessoas buscando vida de conversão e fidelidade! São muitas iniciativas
que a cada dia acontecem, demonstrando a ação do Espírito Santo na vida da Igreja.
Voltemos,
porém, ao tema do tempo de reflexão que nos é apresentado. Peçamos ao Senhor que reconheçamos
esse tempo da graça de Deus na oração e na caridade, para assim podermos aceitar e
reconhecer o Senhor em nossas vidas e colocar o dinheiro no seu devido lugar: a serviço
da caridade, do amor e da construção de uma sociedade mais justa e fraterna. Aproveitemos
nosso tempo para fazer o bem, partilhando o que temos e encontrando-nos com o Senhor!
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Orani João Tempesta, O. Cist. Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de
Janeiro, RJ