2010-05-29 13:58:39

A TRINDADE E A VIDA


Rio de Janeiro, 29 mai (RV) - Celebramos neste domingo a Solenidade da Santíssima Trindade. Chegamos praticamente no centro cronológico do Ano Litúrgico com um olhar para os mistérios da Encarnação e Redenção que vivemos e descortinando os passos futuros da Igreja em sua caminhada histórica. Fomos criados à imagem e semelhança de Deus, que é Um só em Três Pessoas – comunhão perfeita. Por isso somos destinados à unidade e comunhão e experimentamos a necessidade de estar com o Senhor, pois “inquieto estará sempre o nosso coração enquanto não repousar na comunhão trinitária”.

Toda liturgia é a contínua adoração de Deus nas Três Pessoas: “Santo, Santo, Santo, é o Senhor, Deus do universo”, cantamos sempre que celebramos a Eucaristia. Glorificamos o Deus vivo e verdadeiro, Deus que vive eternamente e habita em luz inacessível. Deus que deu origem ao universo, que com sabedoria e amor fez todas as suas obras. Deus que criou o homem à sua imagem e semelhança. Unindo-nos aos anjos que vos servem e glorificam sem cessar, contemplando a vossa glória, também nós e, por nossa voz, tudo o que criastes celebramos o vosso nome o canto de louvor (cfr. Oração Eucarística IV).

A doutrina trinitária professa que o conceito da existência de Um só Deus, Onipotente, Onisciente e Onipresente, revelado em Três Pessoas distintas, pode-se depreender de muitos trechos da Bíblia, como, por exemplo, o relato sobre o Batismo de Jesus, em que as “três Pessoas da Trindade” se fazem presentes, com a voz do Pai Celeste dizendo: “Tu és o meu Filho amado, em ti me comprazo” (Lc 3, 22), e na fórmula tardia de São Mateus: “Portanto ide, fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, e do Filho e do Espírito Santo” (Mt 28,19).
Portanto, o termo Trindade é consequência da revelação que nos vem nas Escrituras Sagradas e foi dado pela Igreja à doutrina que define a personalidade e a ação de Deus na Bíblia, onde Deus é: Pai, Filho e Espírito Santo, um Deus Uno e Trino.

Nos inícios da fé na Trindade, Pai, Filho e Espírito Santo, foi uma experiência de fé mais que uma doutrina elaborada. Batizava-se em nome da Trindade (Cf. Mt 28,19) e junto, a profissão de fé, considerada como “regra de fé”, pois expressa os princípios fundamentais de identificação da comunidade cristã. A partir dos meados do século II começam a aparecer as formulações teológicas sobre a Santíssima Trindade, surgindo assim ao lado da fé na Trindade a doutrina trinitária. A Trindade devia ser sustentada e defendida diante do monoteísmo judaico, contra o politeísmo grego e contra a doutrina das emanações e mediações da filosofia neoplatônica e as especulações teogônicas dos gnósticos.

Santo Atanásio (sec. IV) assim nos esclarece: “A nossa fé é esta: cremos na Trindade santa e perfeita, que é o Pai, o Filho e o Espírito Santo; nela não há mistura alguma de elemento estranho; não se compõe de Criador e criatura; mas toda ela é potência e força operativa; uma só é a sua natureza, uma só é a sua eficiência e ação. O Pai cria todas as coisas por meio do Verbo, no Espírito Santo, e deste modo, se afirma a unidade da Santíssima Trindade.”
Deus gera pelo Espírito, que é amor. Ele é Pai pelo amor que tem ao Filho. Sua paternidade é mistério insondável: Ele, em seu infinito amor, gera o Filho por toda a eternidade, e a relação de amor do Pai para com o Filho, e do Filho para com o Pai, expira o Espírito Santo, que é igual ao Pai e ao Filho em divindade. Eles são de uma única substância ou essência; não há contradição entre Eles, o que um é, os outros também são, é uma profunda relação de amor e unidade.

A geração do Filho, que é a origem da criação, é também seu futuro: “tudo foi criado na direção dele” (Cl 1,16). A atividade do Pai tem por termo sempre o Filho; portanto, Deus cria o mundo encaminhando-o na direção de Cristo. O mundo nasce num movimento que o leva na direção do Filho em seu eterno nascimento. Em seu eterno nascimento, Cristo é o alfa e o ômega da criação (Ap 21,6); o alfa do qual surgem as criaturas, e o ômega que as chama e plenifica. É assim que, em sua vida terrestre, o próprio Jesus partia de seu eterno nascimento filial e ia à direção dele.
O mistério da salvação se recobre com o da encarnação. Mediante sua vida e sua morte Jesus se deixa gerar pelo Pai. Com efeito, como o papel de Deus é o de ser Pai, o de Jesus é o de ser Filho. O drama da salvação se joga na relação mútua entre o Pai e o homem Jesus, Filho de Deus. Sendo paterna e filial, a obra da redenção é cheia do Espírito Santo.

O mistério do Pai, do Filho e do Espírito Santo se interioriza no mundo para levá-lo à sua eterna realização, isto é, sua salvação. Em seu amor aos homens, Deus entrega seu Filho, gerando-o neste mundo. Seu ser se identifica com sua paternidade, e toda sua atividade se empenha na geração do Filho.

Portanto, Deus, na plenitude dos tempos, revelou-se aos homens na pessoa de seu Filho Jesus, elevando assim a compreensão humana do próprio Deus e dos seus desígnios para com a humanidade. E o desígnio de Deus é que o homem sacie sua sede na Fonte que jorra água viva, onde toda limitação é dissipada pelo infinito amor do Pai que presenteia a humanidade com a doação de seu Filho na ação do Espírito. Deus chama o homem para viver a sua vida. No evento Pascal, Deus se revela Trindade. O Mistério Pascal é a revelação histórica concreta de Deus – Amor – Trindade. Porque Deus é Trindade, cria e destina o homem a participar da comunhão divina.

Por isso, “não devemos perder de vista a tradição, a doutrina e a fé da Igreja Católica, tal como o Senhor ensinou, tal como os apóstolos pregaram e os Santos Padres transmitiram.” (Santo Atanásio)

“Senhor Deus, Pai onipotente, olhai os vossos filhos que Vos adoram; abençoai-os e protegei-os pelo vosso Filho unigênito no poder do Espírito Santo e fazei que em vossos louvores encontremos sempre mais alegrias” (liturgia ambrosiana).

Orani João Tempesta, O. Cist.
Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro, RJ
(CM)







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