Belo Horizonte, 04 abr (RV) - A envergadura moral e intelectual do Papa Bento
XVI está incomodando o viés de uma pós-modernidade que, sem autoridade moral e por
interesses não genuínos, realiza escalada de ataques a seu pontificado, disfarçando
os rostos de arquitetos da maldade. São ataques tratados com a força perversa de calúnias
infames e desrespeitosas. O enfrentamento do mal horrendo e abominável da pedofilia
é um desafio na sociedade. Atingiu o corpo da Igreja Católica também, lamentavelmente.
E a Igreja tem padrões morais, canônicos e disciplinares, advindos do Evangelho, para
poder, com autoridade e transparência, posicionar-se segundo parâmetros de tolerância
zero - o mesmo se espera também da sociedade. As omissões e tratamentos inadequados
de casos de pedofilia exigem inadiáveis providências. Estas exigências incluem, de
maneira decisiva, essa hora de purificação e profunda renovação na vida da Igreja,
mais ainda da sociedade contemporânea.
O Papa Bento XVI recordou, testemunhando,
que seu sustento é a força do alto. A coragem audaciosa e a autenticidade do seu testemunho
ancoram o enfrentamento de fofocas e de interpretações perversas espalhadas para desestabilizar
e atingir a credibilidade. Nessa hora desafiadora, a palavra do Senhor Jesus ilumina
e mostra o horizonte da direção certa. Uma palavra que é súplica, recomendação e programa
de vida: “Pai, perdoa-lhes! Eles não sabem o que fazem” pronunciada do alto da cruz,
pouco antes de dirigir-se ao Pai, entregando o seu espírito. Sua morte é um silêncio
profundo que, para desavisados e estultos, é como se fora um fracasso. Na verdade,
é a vida duradoura que brota e, por sua ressurreição alcançada pela experiência da
fé, é o sustento de toda verdadeira esperança. A vida que é a única razão e que dá
sentido a tudo. Esse é o coração e a fonte da celebração desta Sexta-Feira Santa.
Todos convocados a mergulhar nesse silêncio para encharcar o coração da verdade redentora
que só o amor de Deus pode possibilitar.
É um mergulho no mistério da morte,
fazendo tremer a condição humana frágil - que, amedrontada, se defende atacando de
forma insolente e arbitrária, apegando-se ao que é transitório e de pouco valor. Eis
aí uma fonte perigosa de descompassos no mundo. O Evangelho de Lucas 23, narra esse
momento central de sua obediência amorosa ao Pai. Jesus se oferece, sem reservas,
para salvar a humanidade. Sua oferta redentora é o contrário da ferocidade do ódio,
que nasce da inveja e da vingança, e gera perversidades, estonteia cabeças e corações
que só conseguem ver seus interesses e a destruição do outro. A súplica de Jesus,
“Pai, perdoa-lhes”, ecoa forte. Um eco com muitos significados. Que entrelaça sentidos
diferentes, aponta necessidades variadas. Convoca à novidade de uma vida passada a
limpo no cadinho da conversão. Jesus suplica o perdão ao Pai. Ele conhece a condição
humana marcada pelo pecado. Sua súplica é a expressão máxima de sua obediência amorosa.
Nem precisaria dizer essas palavras.
O perdão é a única e insubstituível condição
para que valha o amor e se possa começar um novo tempo, uma nova vida. Ao suplicar
o perdão, Jesus sela a aliança nova com sua oferta. Uma garantia que só vem de Deus
na oferta do seu Filho Amado na cruz. Essa súplica também é um programa de vida para
os discípulos do Mestre e Senhor. A fonte do perdão que Ele põe no coração da humanidade,
por uma aliança nova de salvação, é também um exigente compromisso de vida. Uma exigência
que fecunda e dá lustro na tarefa missionária de anunciar a Boa Nova da salvação.
O perdão pedido e a garantia do perdão dado configuram etapas permanentes no dia a
dia da vida desses discípulos. O desafio de viver o amor começa sempre e se mantém
na fecundidade quando se experimenta o perdão recebido e dado.
No reverso da
nobreza do perdão, ato nobre de Deus no alto da Cruz, e de cada discípulo no cotidiano
de sua vida, está o mais horrendo da condição humana marcada pela perversidade do
pecado e pelo instinto atroz de destruir o outro. A destruição do outro pela ignomínia
de atitudes pervertidas, como o horror da pedofilia. Com o Papa Bento XVI, a Igreja
enfrenta o desafio de uma limpeza corajosa no seu corpo, com tratamento disciplinar
de 0,9 % a seus padres incriminados, nos 100% de uma sociedade comprometida por esta
e outras patologias. Garantindo aos mais de 98% de padres sérios e abnegados que,
em seu trabalho missionário constroem comunidades de fé e fazem delas uma escola do
perdão da vida e construtores da justiça, da solidariedade e da paz, merecedores de
credibilidade. É o momento de um novo tempo para a Igreja que atravessa os tempos
com a força do seu Senhor, Jesus Cristo, o único Salvador.
Dom Walmor Oliveira
de Azevedo Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte