Rio de Janeiro, 31 mar (RV) - Na semana passada, em meu artigo semanal, recordei
resumidamente os vários momentos do Tríduo Pascal, e já anunciando a Páscoa, pudemos
nos alegrar com as comemorações do final de semana, entre as quais a grande concentração
de jovens celebrando, no centro do Rio de Janeiro, a Jornada Mundial da Juventude.
Um belíssimo testemunho das várias expressões jovens unidas na missão evangelizadora!
Bendigo a Deus por ver nossos jovens, não obstante todas as dificuldades hodiernas,
ainda mais animados e alegres por seguirem a Cristo. E disseram isso com atitudes
públicas e de compromisso. A força de Cristo na renovação do nosso mundo, sem dúvida
passa pela vida do jovem cristão que aceita o desafio de ser testemunha da Ressurreição.
Que o sinal desses jovens provenientes não só das diversas regiões de nossa grande
metrópole, mas também de tantas outras cidades deste Estado, marque cada vez mais
tempos novos que já vivemos e que iremos ainda viver.
Estamos agora no Tríduo
Pascal. A Quaresma, iniciada na Quarta-feira de Cinzas, se conclui na Quinta-feira
Santa, antes da Missa da Ceia do Senhor. Com esta Missa iniciamos o Tríduo Pascal
que, como nos recorda a Igreja, “não é preparação do Domingo da Ressurreição, mas
é, segundo as palavras de Santo Agostinho, o sacratíssimo Tríduo do Crucificado, Sepultado
e Ressuscitado”. Ainda mais: “o Tríduo Pascal da Paixão e Ressurreição do Senhor,
que começa com a Missa Vespertina da Ceia do Senhor, possui o seu centro na Vigília
Pascal e encerra-se com as Vésperas do Domingo da Ressurreição”. “É o ápice do ano
litúrgico porque celebra a obra da redenção humana e da perfeita glorificação de Deus
pelo seu mistério pascal, quando, morrendo, destruiu a nossa morte e, ressuscitando,
renovou a vida”.
Neste Ano Sacerdotal que estamos por findar, gostaria de refletir
sobre a Quinta-feira Santa, dia tão importante para a unidade presbiteral. Pela manhã,
em nossas catedrais, celebramos a chamada Missa do Crisma, na qual os sacerdotes renovam
os seus compromissos e levam para suas comunidades os Santos Óleos, abençoados e consagrados,
para a administração dos sacramentos durante o ano, também como sinal de unidade.
Na
Quinta-feira Santa à tarde, quando se inicia o Tríduo Pascal, a Igreja celebra a instituição
do maior dos sacramentos, a Eucaristia. É o sacramento do amor – sacramentum caritatis.
A oferta de Jesus na cruz foi sacramentalmente antecipada na Última Ceia pelas palavras
do Divino Mestre sobre o pão e sobre o vinho, respectivamente: Isto é o meu corpo
entregue. Este é o cálice do meu sangue, o sangue da Nova e Eterna Aliança, derramado...
Jesus, com efeito, ordenou aos Apóstolos que, repetindo o seu gesto, celebrassem
sacramentalmente o Seu sacrifício ao longo da história da Igreja. A Igreja, na verdade,
recebeu a ordem de celebrar a Eucaristia como um verdadeiro dom, um presente inestimável
de Deus. Pela Eucaristia, a Igreja é associada ao sacrifício redentor de Cristo em
favor da salvação do mundo. Pela Eucaristia, a presença de Jesus à Igreja se realiza
de um modo intenso e extraordinário. Pela Eucaristia, o Povo de Deus a caminho é alimentado
e fortalecido com o Pão do Céu. Vemos, assim, a importância da nossa participação
anual nessa celebração e a alegria de celebrá-la solenemente aos domingos e dias de
semana. Esse grande dom que o Senhor nos concede, alimentando-nos com Seu Corpo e
Seu Sangue, também nos fala pelas Escrituras e nos une em comunidade de fé como irmãos
e irmãs – e nos envia ao mundo com a missão de anunciar a todos a Boa Notícia.
Ao
ordenar aos Apóstolos a celebração da Eucaristia, Jesus instituiu o sacerdócio ministerial.
Na Igreja, em virtude do Batismo, todos são inseridos no único sacerdócio de Cristo.
Entretanto, como o Plano de Deus obedece à economia sacramental, existem na Igreja
aqueles que fazem às vezes de Cristo Sacerdote, Cabeça da Igreja. Estes são os sacerdotes
ordenados. Ora, o sacerdócio ordenado existe para o bem do Povo de Deus. Pela pregação
da Palavra de Deus, pelo governo da Igreja, pela celebração dos sacramentos, especialmente
a Eucaristia, o ministro ordenado, representando Cristo Cabeça, serve aos fiéis batizados
a fim de que todos sejam associados ao único Sacerdote da Nova e Eterna Aliança.
Com
efeito, Cristo inaugurou um novo sacerdócio, o sacerdócio da Nova Aliança. Os sacerdotes
do Antigo Testamento ofereciam a Deus sacrifícios externos, como o novilho ou o cordeiro.
Jesus, no entanto, ofereceu ao Pai a sua própria vida. De outra coisa não quis saber
senão de obedecer em tudo ao seu Pai. O sacrifício que Jesus Sacerdote ofereceu a
Deus é um sacrifício existencial, o sacrifício da vida conformada à vontade divina.
A morte na cruz é o grande sinal de que Jesus não se acovardou, mas levou até o fim
a missão que o Pai lhe confiara. Jesus é o novo Adão. O velho Adão desobedeceu a Deus,
mas o novo foi-lhe fiel até o derramamento do próprio sangue. Para que a humanidade
se renovasse e pudesse obedecer a Deus à semelhança do Homem Novo, Jesus Cristo, Ele
dispôs que todos os homens se associassem a seu Filho pela graça. A graça é uma ajuda,
um favor de Deus concedido em benefício da nossa fraqueza. A graça de Deus nos tira
do pecado, renova-nos, santifica-nos e nos dispõe para receber um dia a glória celeste
em todo o seu esplendor. Ora, de acordo com a economia sacramental do Plano de Deus,
a graça de que necessitamos vem até nós de modo especial pelos sacramentos, especialmente
a Eucaristia. A Eucaristia comunica-nos a vida mesma de Cristo, a fim de que façamos
o que Cristo fez: entregar a vida a Deus como um sacrifício de louvor. Na verdade,
servir a Deus significa realizar nossa suprema vocação. E servir a Deus é reinar.
O sacerdócio ordenado, na verdade, resulta de uma especial participação do
sacerdócio de Cristo e, como tal, existe para o bem espiritual do Povo de Deus. Os
ministros ordenados, sobretudo pela celebração da Eucaristia, perpetuam sacramentalmente
o sacerdócio de Cristo e, assim, levam aos fiéis os dons da Redenção, associando a
Igreja ao sacrifício de seu Esposo. A finalidade suprema é a união com Cristo e a
tradução dessa união em gestos concretos de amor ao próximo. Deixar que a vida de
Cristo seja a nossa vida é a grande meta de todos nós. Como Cristo ofereceu-se ao
Pai, a Igreja também deve fazê-lo. E a força que ela recebe para isso vem do próprio
Cristo, que, por seus ministros ordenados, atua eficazmente em favor de seu Corpo
Místico.
Recorda-nos o rito de ordenação de presbíteros: “Este irmão, após
prudente exame, será constituído sacerdote na Ordem dos Presbíteros, para servir ao
Cristo Mestre, Sacerdote e Pastor, que, por seu ministério, edifica e faz crescer
o seu Corpo, que é a Igreja, como povo de Deus e Templo do Espírito Santo.” E ainda:
“Desempenha, portanto, com verdadeira caridade e contínua alegria, a missão do Cristo
sacerdote, procurando não o que é teu, mas o que é de Cristo”.
Que a Quinta-feira
Santa, dia da Eucaristia e da instituição do sacerdócio ordenado, seja para o Povo
de Deus, principalmente para os sacerdotes, o grande dia de contemplar o amor de Deus.
O Senhor deixou à Igreja o sacramento da caridade, e o sacerdócio ordenado, que, nas
palavras de São João Maria Vianney, é “o amor do coração de Jesus”. Que o Ano Sacerdotal,
que ora celebramos, reavive em nós a consciência da importância da Eucaristia e dos
ministros ordenados para a vida da Igreja. E os ministros ordenados agradeçam ao Senhor,
sabendo que tudo é dom de Deus para o bem da Igreja, e sejam fiéis ao dom recebido,
mostrando pela vida e pelas palavras que a fidelidade de Cristo é que garante a fidelidade
do sacerdote. “Seja, portanto, a tua pregação, alimento para o povo de Deus e a tua
vida, estímulo para os féis, de modo a edificares a casa de Deus, isto é, a Igreja,
pela palavra e pelo exemplo”.
Ao agradecer a Deus pelo Seu Filho presente entre
nós, de modo especialíssimo pela Eucaristia, pois acreditamos nas Palavras que Ele
nos deixou nas Escrituras, rezemos também pelos que são chamados a servir ao Povo
de Deus no ministério sacerdotal, entregando suas vidas para a glória de Deus e a
santificação das pessoas.
Nós recordamos com carinho que na Sexta-feira Santa
deste ano, dia 2 de abril, voltava para a casa do Pai o nosso querido Papa João Paulo
II, o grande Servo de Deus, fiel até o fim, dando a sua vida até o último suspiro
na fidelidade ao Evangelho, e que governou a Igreja de 1978 a 2005.
As celebrações
da Paixão e Morte do Senhor na Sexta Feira Santa e grande Vigília Pascal, quando renovamos
as promessas batismais, completarão esse importante tríduo sacro, centro de nosso
ano litúrgico. Somos todos convidados a “fazer Páscoa”, participando com nossas comunidades
desses momentos marcantes de nossa vida católica. Ao iniciarmos com esta celebração
da Ceia do Senhor as celebrações pascais deste ano, permitam-me agradecer a todos
pela comunhão e unidade e desejar que a Páscoa que ora vivemos possa iluminar todos
os momentos de nossas vidas e ser o centro de toda a nossa história. Ter a certeza
de que, com Cristo, passamos da morte para a vida, e na madrugada do primeiro dia
da semana, iremos, também nós, anunciar ao mundo a grande notícia: o Senhor está vivo,
Ele está conosco, Ele Ressuscitou! Aleluia! Feliz Páscoa a todos!
D. Orani
João Tempesta, O. Cist. Arcebispo Metropolitano de São Sebastião do Rio de Janeiro,
RJ