NO VATICANO, DIA DE PENITÊNCIA NOS EXERCÍCIOS ESPIRITUAIS DA QUARESMA
Cidade do Vaticano, 24 fev (RV) - Para os exercícios espirituais da Quaresma,
que o Papa e a Cúria Romana estão vivendo esta semana no Vaticano, hoje é dia penitencial.
O
teólogo salesiano Pe. Enrico Dal Covolo aborda nas meditações de hoje o tema da dúvida
e da tentação e propõe, simbolicamente, a figura do pároco da zona rural protagonista
do célebre romance de George Bernanos ("Diário de um Pároco de Aldeia", ndr).
Bento
XVI dedicou amplas paginas de seu Magistério à luta contra a tentação e às respostas
que a ela a fé sabe dar. Aproveitamos para recordar algumas das abordagens a esse
propósito feitas pelo Santo Padre.
"Se não fosse a vigilante piedade de Deus,
creio que na primeira tomada de consciência de si mesmo o homem recairia no pó." Era
1936 quando o mundo conheceu os tormentos interiores do pároco d'Ambricourt, o cura
da zona rural nascido da profunda sensibilidade de Bernanos. Nas palavras desse personagem
da ficção – hoje proposto à atenção do Papa e de seus colaboradores – percebe-se a
repercussão da luta interior, do sentido do limite, da necessidade de uma força maior
que todo cristão, especialmente se consagrado, percebe diante das provações que caracterizam
a existência.
Sentimentos em plena sintonia com o tempo da Quaresma, descrito
por Bento XVI no último Angelus, exatamente como um tempo de "agonismo" espiritual,
a ser vivido imitando o estilo de Jesus no deserto:
"Cristo veio ao mundo para
libertar-nos do pecado e do fascínio ambíguo de projetar a nossa vida prescindindo
de Deus. Ele o fez não com proclamações públicas, mas lutando em primeira pessoa contra
o Tentador, até a cruz. Esse exemplo vale para todos: o mundo melhora começando de
si mesmo, mudando, com a graça de Deus, aquilo não está bem na própria vida." (21
de fevereiro de 2010)
De fato, é, sobretudo, na Quaresma que a fibra cristã
compreende em que modo revigorar-se. As armas a serem punhadas, sempre insistiu o
papa, são as armas da fé: oração, penitência, escuta da Palavra que salva. Sabendo
– diria o cura de Bernanos – que até mesmo "o desejo da oração já é uma oração":
"A
Quaresma seja, por fim, mediante a esmola, o fazer o bem aos outros, ocasião de sincera
partilha dos dons recebidos com os irmãos e de atenção às necessidades dos mais pobres
e abandonados." (1º de março de 2006)
Nesta luta diária contra a fragilidade,
ao abrir o coração a quem sofre fechando-o aos egoísmos, o homem entrevê o caminho
para a redenção à luz de Cristo que – explica Bento XVI – passa das tentações do deserto
de Judas à transfiguração do monte Tabor, como narrará o Evangelho do próximo domingo:
"A
luta com o tentador preludia o grande duelo final da Paixão, ao passo em que a luz
de seu Corpo transfigurado antecipa a glória da Ressurreição. De um lado vemos Jesus
plenamente homem, que partilha conosco até mesmo a tentação; por outro, o contemplamos
Filho de Deus, que diviniza a nossa humanidade. Desse modo, podemos dizer que esses
dois domingos servem de pilares sobre os quais se apóia todo o edifício da Quaresma
até a Páscoa e, aliás, toda a estrutura da vida cristã, que consiste essencialmente
no dinamismo pascal: da morte à vida." (17 de fevereiro de 2008).
E no horizonte
da luta contra tudo aquilo que distancia de Deus deve ser inserida a consciência do
perdão. Judas Iscariotes, observou o Papa na audiência geral de 2006, se autodestruiu
porque se desesperou não acreditando na possibilidade da misericórdia.
O cura
da zona rural (personagem do romance de Bernanos) escreve em seu diário: "pecado contra
a esperança: o mais mortal de todos, e talvez o mais acolhido, mais cortejado".
Ao
invés – afirma Bento XVI – não se pode duvidar do amor infinito de Deus por toda pessoa:
"É
para nós um convite do qual jamais devemos nos esquecer: "Jamais perder a esperança
na misericórdia divina". (...) Jesus respeita a nossa liberdade; Jesus espera a nossa
disponibilidade ao arrependimento e à conversão: é rico de misericórdia e de perdão."
(18 de outubro de 2006)
Uma consciência que se fortalecerá no coração provado
do pároco de Bernanos. Dá-se no final do romance, quando o cura moribundo pede a absolvição
ao amigo sacerdote que perdeu a fé, e diante da inquietação deste lhe diz com as palavras
de Santa Teresinha: "O que importa? Tudo é graça!" (RL)