Cidade do Vaticano, 30 jan (RV) - O relato de São João sobre as bodas de Caná
(Cap.2,1-11) mostra claramente como Jesus valoriza a família. Foi o seu primeiro milagre,
abençoando com sua presença os noivos, que pretendiam iniciar uma nova família. Ele
quis iniciar o anúncio do Reino em um casamento, mostrando que a família é importante
para Ele.
A família é a base, o esteio, o sustento de uma sociedade mais justa.
Ao longo da história da humanidade, assistimos à destruição de nações grandiosas por
causa da dissolução dos costumes, que foi motivada pela desvalorização da família.
No
nosso mundo de hoje, depois que ficou liberado o divórcio indiscriminadamente, a família
ficou ameaçada em sua estrutura e é por isto que vemos, através dos meios de comunicação
e até na comunidade em que vivemos, cenas terríveis. Filhos drogados matam ou mandam
matar os pais, pais matam filhos por motivos fúteis, mães se desfazem de seus bebês,
quando não cometem o crime hediondo do aborto quando a criança não tem como se defender.
Há problemas seríssimos. Quando os pais se separam, alguma coisa se parte no íntimo
dos filhos. Eles não sabem se é melhor ficar com o pai ou com a mãe. No fundo, eles
gostariam de ficar com os dois. Em paz e harmonia, é claro.
O amor está sendo
retirado do coração dos homens e das mulheres. E, em conseqüência disto, a família
está perdendo a sua unidade e a sua dignidade. Isto acarreta a dissolução dos costumes.
A família decai e a sociedade decai. Precisamos compreender e nos lembrar sempre de
que Deus nos deu uma família a fim de que, num âmbito menor, nós pudéssemos aprender
a amar todos os nossos semelhantes.
O desenvolvimento tecnológico tem seus
pontos benéficos. Facilitou a vida das pessoas. Mas facilitou de tal modo que a humanidade
ficou mal acostumada. Só quer o que é fácil. Não se interessa pelo que exige esforço,
luta. No entanto, o que conquistamos com esforço tem um sabor muito melhor. Parece
que nos esquecemos disto. Na passagem das bodas de Caná, Jesus transformou a água
em vinho, em bom vinho. Ele poderia ter tirado o vinho do nada, mas Ele quis a participação
humana. Por isto, mandou que enchessem as talhas de água.
Hoje também, Ele
quer que nós enchamos a talha de nossa vida, a nossa existência, de água que Ele transformará
no melhor vinho.
Que é que isto quer dizer? Quer dizer que precisamos colocar
amor em nossa vida, em nossa família, para que Ele transforme esse amor humano em
amor divino, o mesmo amor que une as pessoas da Santíssima Trindade e que é tão grande
e tão repleto de felicidade, que extravasa, explode e quer ser espalhado entre nós.
E é por meio dele que encontraremos a plenitude da felicidade.
Não é fácil
cultivar o amor às vezes, é até difícil. Mas o difícil, quando conquistado tem um
valor inestimável. Temos prova disto. Em uma competição esportiva, por exemplo, o
vencedor fica mais satisfeito quando enfrenta adversários mais difíceis.
Viver
em família, viver em união dentro da família não é fácil. Mas fácil não é sinônimo
de bom. Talvez seja até o contrário.
A família precisa de amor, para ser bem
estruturada. A sociedade precisa das famílias para realizar a justiça e a paz porque
a sociedade é uma família amplificada.
Falta o vinho para as nossas famílias.
Esse vinho é o amor. É preciso que cada membro da família se esforce. Que os pais
assumam verdadeiramente o seu papel. Apesar de ser bem árdua a tarefa dos pais, no
mundo de hoje, não se pode desanimar. É necessária e urgente a ação dos pais. O jovem
é, por natureza, rebelde, quer ser independente. Desperta para o mundo e seus problemas
e questiona tudo. Mas os pais precisam participar de sua vida, de uma maneira ou de
outra, porque, mesmo errando, algumas vezes, ainda assim, os pais têm capacidade de
orientar e ajudar os filhos. Não podemos deixar tudo por conta dos companheiros, da
escola, da sociedade ou de sua própria solidão.
Os pais devem fazer o acompanhamento
dos filhos, procurar saber o que está acontecendo com eles, tentar ajudar de várias
maneiras: com orientações, com atitudes exemplares, com o diálogo, com orações. Sempre.
Tanto em casa, como na escola, na vida religiosa e social, nos namoros, etc.
Muitas
vezes, os pais se sentem impotentes. Muitas vezes, achamos que já fizemos tudo e que
nada conseguimos. Entretanto, esforçando-nos ao máximo, dando o melhor de nós por
uma família mais feliz, estaremos enchendo de água a nossa talha.
E Maria já
estará falando com o Filho: "Eles não têm vinho." E Jesus virá nos transformar, transformar
a nossa água em bom vinho, transformar a nossa dificuldade em vitória.
Aliás
nestes dias estou tendo a alegria de participar no Rio de Janeiro, sob a orientação
de nosso venerando amigo e dileto irmão Dom Orani João Tempesta, O. Cist, Arcebispo
de São Sebastião, de mais um curso para bispos analisando o cambiamento de época.
Nesse sentido a família não pode ser afetada pelos modismos, porque nela reside a
grande esperança de um mundo melhor, de amor verdadeiro e de Igreja comprometida em
valorizar a família humana, rosto da família divina.
+ Eurico dos Santos Veloso Arcebispo
Emérito de Juiz de Fora (MG)