Cidade do Vaticano, 25 dez (RV) - Publicamos na íntegra, a mensagem "Urbi et
Orbi" de Bento XVI, no dia de Natal.
Queridos irmãos e irmãs de Roma e
do mundo inteiro, e vós todos, homens e mulheres amados pelo Senhor!
«Lux
fulgebit hodie super nos, quia natus est nobis Dominus. Hoje sobre nós resplandecerá
uma luz porque nasceu para nós o Senhor» (Missal Romano: Antífona de Entrada,
da Missa da Aurora no Natal do Senhor).
A liturgia da Missa da Aurora lembrou-nos
que a noite já passou, o dia vai alto; a luz que procede da gruta de Belém resplandece
sobre nós.
Todavia a Bíblia e a Liturgia não nos falam da luz natural, mas
de uma luz diferente, especial, de algum modo apontada e orientada para um «nós»,
o mesmo «nós» para quem o Menino de Belém «nasceu». Este «nós» é a Igreja, a grande
família universal dos que acreditam em Cristo, que aguardaram com esperança o novo
nascimento do Salvador e hoje celebram no mistério a perene atualidade deste acontecimento.
No princípio, ao redor da manjedoura de Belém, aquele «nós» era quase invisível
aos olhos dos homens. Como nos diz o Evangelho de São Lucas, englobava, para além
de Maria e José, poucos e humildes pastores que acorreram à gruta avisados pelos Anjos.
A luz do primeiro Natal foi como um fogo aceso na noite. À volta tudo estava escuro,
enquanto na gruta resplandecia a luz verdadeira «que ilumina todo o homem» (Jo 1,
9). E no entanto tudo acontece na simplicidade e no escondimento, segundo o estilo
com que Deus age em toda a história da salvação. Deus ama acender luzes circunscritas,
para iluminarem depois ao longe e amplamente. A Verdade, como o Amor, que são o seu
conteúdo, se acendem onde a luz é acolhida, difundindo-se depois em círculos concêntricos,
quase por contato, nos corações e mentes de quantos, abrindo-se livremente ao seu
esplendor, se tornam por sua vez fontes de luz. É a história da Igreja que inicia
o seu caminho na pobre gruta de Belém e, através dos séculos, se torna Povo e fonte
de luz para a humanidade. Também hoje, por meio daqueles que vão ao encontro do Menino,
Deus ainda acende fogueiras na noite do mundo para chamar os homens a reconhecerem
em Jesus o «sinal» da sua presença salvífica e libertadora e estender o «nós» dos
crentes em Cristo à toda humanidade.
Onde quer que haja um «nós» que acolhe
o amor de Deus, aí resplandece a luz de Cristo, mesmo nas situações mais difíceis.
A Igreja, como a Virgem Maria, oferece ao mundo Jesus, o Filho, que Ela própria recebeu
como dom e que veio para libertar o homem da escravidão do pecado. Como Maria, a Igreja
não tem medo, porque aquele Menino é a sua força. Mas, não O guarda para si: O oferece
a quantos O procuram de coração sincero, aos humildes da terra e aos aflitos, às vítimas
da violência, a quantos suspiram pelo bem da paz. Também hoje, à família humana profundamente
marcada por uma grave crise, certamente econômica mas antes ainda moral, e por dolorosas
feridas de guerras e conflitos, a Igreja, com o estilo da partilha e da fidelidade
ao homem, repete com os pastores: «Vamos até Belém» (Lc 2, 15), lá encontraremos a
nossa esperança.
O «nós» da Igreja vive lá onde Jesus nasceu, na Terra Santa,
para convidar os seus habitantes a abandonarem toda a lógica de violência e vingança
e a se comprometerem com renovado vigor e generosidade no caminho para uma convivência
pacífica. O «nós» da Igreja está presente em outros países do Oriente Médio. Como
não pensar na atribulada situação do Iraque e no «pequenino rebanho» de cristãos que
vive na Região? Às vezes sofre violências e injustiças, mas está sempre disposto a
oferecer a sua própria contribuição para a edificação da convivência civil contrária
à lógica do conflito e rejeição do vizinho. O «nós» da Igreja atua no Sri Lanka, na
Península Coreana e nas Filipinas, e ainda noutras terras asiáticas, como fermento
de reconciliação e de paz. No continente africano, não cessa de erguer a voz até Deus
para implorar o fim de toda a prepotência na República Democrática do Congo; convida
os cidadãos da Guiné e do Níger ao respeito dos direitos de cada pessoa e ao diálogo;
aos de Madagáscar pede para superarem as divisões internas e se acolherem reciprocamente;
a todos lembra que são chamados à esperança, não obstante os dramas, provações e dificuldades
que continuam a afligi-los. Na Europa e na América do Norte, o «nós» da Igreja
incita a superar a mentalidade egoísta e tecnicista, a promover o bem comum e a respeitar
as pessoas mais débeis, a começar por aquelas que ainda estão por nascer. Em Honduras,
ajuda a retomar o caminho institucional; em toda a América Latina, o «nós» da Igreja
é fator de identidade, plenitude de verdade e caridade que nenhuma ideologia pode
substituir, apelo ao respeito dos direitos inalienáveis de cada pessoa e ao seu desenvolvimento
integral, anúncio de justiça e fraternidade, fonte de unidade.
Fiel ao mandato
do seu Fundador, a Igreja é solidária com aqueles que são atingidos pelas calamidades
naturais e pela pobreza, mesmo nas sociedades opulentas. Frente ao êxodo de quantos
emigram da sua terra e são arremessados para longe pela fome, a intolerância ou a
degradação ambiental, a Igreja é uma presença que chama ao acolhimento. Numa palavra,
a Igreja anuncia por toda a parte o Evangelho de Cristo, apesar das perseguições,
das discriminações, dos ataques e da indiferença, por vezes hostil, mas que lhe permitem
partilhar a sorte do seu Mestre e Senhor.
Queridos irmãos e irmãs, que grande
dom é fazer parte de uma comunhão que é para todos! É a comunhão da Santíssima Trindade,
de cujo seio desceu ao mundo o Emanuel, Jesus, Deus-connosco. Como os pastores de
Belém, contemplamos cheios de maravilha e gratidão este mistério de amor e de luz!
Boas-festas de Natal a todos!