BENTO XVI: SEM SENTIR-SE PEQUENO NÃO É POSSÍVEL NENHUMA COMPREENSÃO SOBRE DEUS
Cidade do Vaticano, 1º dez (RV) - O verdadeiro teólogo é alguém que não cede
à tentação de com a sua inteligência medir o mistério de Deus, mas é alguém que tem
consciência da própria limitação, como muitos grandes santos reconhecidos também como
grandes mestres. Foi esse, em síntese, o pensamento expresso por Bento XVI na homilia
da missa celebrada esta manhã com os membros da Comissão Teológica Internacional,
desde ontem, segunda-feira, reunidos no Vaticano em sua plenária anual.
Bento
XVI vê nos antigos escribas que indicam aos Magos o caminho para Belém, para o Senhor
Deus Menino, o protótipo do teólogo presunçoso que estuda a Sagrada Escritura como
certos cientistas estudam a natureza, ou seja, com uma frieza acadêmica que pretende
secionar o mistério e ignora a centelha do transcendente.
De fato – observou
o papa – os antigos escribas são "grandes especialistas: podem dizer onde nasce o
Messias", mas "não se sentem convidados" a visitá-lo. A notícia "não atinge as suas
vidas, permanecem fora. Podem dar informações, mas a informação não se torna formação
da própria vida":
"E assim também em nosso tempo, nos últimos duzentos anos,
observamos a mesma coisa. Existem grandes doutos, grandes especialistas, grandes teólogos,
mestres da fé que nos ensinaram muitas coisas. Conheceram os detalhes da Sagrada Escritura,
da história da salvação. Mas não conseguiram ver o próprio mistério, o verdadeiro
núcleo: que este Jesus era realmente Filho de Deus (...) Poder-se-ia citar grandes
nomes da história da teologia destes duzentos anos, dos quais aprendemos muito, mas
os olhos de seu coração não se abriram ao mistério."
O Santo Padre mostra-se
severo com esse modo de fazer teologia, com esse modo que – afirma o pontífice – "se
coloca acima de Deus". Como é igualmente severo com os cientistas que adotam um método
no qual "Deus não entra" e, portanto, "não existe" – disse. Mostra-se ainda mais severo
com uma certa teologia que mortifica o divino. Com uma imagem eficaz, o papa explica
os defeitos dessa teologia:
"Também na teologia se pesca nas águas da Sagrada
Escritura com uma rede que permite somente uma certa medida para os peixes, e quando
se vai além dessa medida não entra na rede e, portanto, não pode existir. E assim
o grande mistério de Jesus, do Filho que se fez homem, se reduz a um Jesus histórico,
realmente uma figura trágica, um fantasma sem carne e osso, que ficou no sepulcro,
corrompido, realmente morto."
Todavia – observou o pontífice, a história da
Igreja é rica de homens e mulheres capazes de reconhecer a sua pequenez diante da
grandeza de Deus, capazes de humildade e, portanto, de alcançar a verdade. O papa
citou alguns nomes desses homens e mulheres:
"De Bernadete Soubirous a Santa
Teresa de Lisieux com uma nova leitura da Sagrada Escritura, não científica, mas entrando
no coração da Sagrada Escritura, até os santos e bem-aventurados do nosso tempo: irmã
Bakhita, madre Teresa, Damião de Veuster. Poderíamos citar tantos deles."
Eis
– prosseguiu Bento XVI – uma categoria de "pequenos que são também doutos", modelos
aos quais inspirar-se para que nos ajudem "a sermos verdadeiros teólogos que podem
anunciar o seu mistério porque tocados na profundidade de seus corações". Como o foram
a Virgem Maria, São João, ou centurião aos pés da Cruz. Também São Paulo, que em suas
vicissitudes contempla de modo emblemático a parábola da passagem da falsa à verdadeira
sabedoria:
"E assim também após a sua ressurreição o Senhor, na estrada de
Damasco, toca o coração de Saulo, que é um dos doutos que não veem. Ele mesmo, na
primeira carta a Timóteo, se chama ignorante naquele tempo, apesar da sua ciência.
Mas o ressuscitado o toca. Torna-se cego e depois realmente passa a ver. E o grande
douto torna-se pequeno e justamente assim vê a loucura de Deus que é sabedoria, sabedoria
maior do que todas as sabedorias humanas."
Os trabalhos da Comissão Teológica
Internacional, presidida pelo prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, Cardeal
William Josef Levada, prosseguirão no Vaticano até a próxima sexta-feira, dia 4.
Nesta
primeira sessão do novo quinquênio, a Comissão decidirá os temas a serem tratados
nos próximos cinco anos e a organização concreta dos trabalhos. Entre os temas a serem
considerados figura a questão da metodologia teológica. (RL)