Cidade do Vaticano, 25 set (RV) – Leia a seguir, na íntegra, o discurso de
Bento XVI aos bispos dos Regionais Nordeste 1 e 4 e a saudação do presidente do Regional
Nordeste 1, José Antônio Aparecido Tosi Marques, ao Santo Padre:
DISCURSO DO
PAPA
Caríssimos Irmãos no Episcopado,
Sede bem-vindos! Com grande satisfação
acolho-vos nesta casa e de todo coração desejo que a vossa visita ad Limina proporcione
o conforto e o encorajamento que esperais. Agradeço a amável saudação que acabais
de dirigir-me pela boca de Dom José, Arcebispo de Fortaleza, testemunhando os sentimentos
de afeto e comunhão que unem vossas Igrejas particulares à Sé de Roma e a determinação
com que abraçastes o urgente compromisso da missão para reacender a luz e a graça
de Cristo nas sendas da vida do vosso povo. Queria falar-vos hoje da primeira
dessas sendas: a família assentada no matrimônio, como «aliança conjugal na qual o
homem e a mulher se dão e se recebem» (cf. Gaudium et spes, 48). Instituição natural
confirmada pela lei divina, está ordenada ao bem dos cônjuges e à procriação e educação
da prole, que constitui a sua coroa (cf. ibid., 48). Pondo em questão tudo isto, há
forças e vozes na sociedade atual que parecem apostadas em demolir o berço natural
da vida humana. Os vossos relatórios e os nossos colóquios individuais tocavam repetidamente
esta situação de assédio à família, com a vida saindo derrotada em numerosas batalhas;
porém é alentador perceber que, apesar de todas as influências negativas, o povo de
vossos Regionais Nordeste 1 e 4, sustentado por sua característica piedade religiosa
e por um profundo sentido de solidariedade fraterna, continua aberto ao Evangelho
da Vida. Sabendo nós que somente de Deus pode provir aquela imagem e semelhança
que é própria do ser humano (cf. Gen 1, 27), tal como aconteceu na criação – a geração
é a continuação da criação –, convosco e vossos fiéis «dobro os joelhos diante do
Pai, de quem recebe o nome toda paternidade no céu e na terra, [para] que por sua
graça, segundo a riqueza da sua glória, sejais robustecidos por meio do seu Espírito,
quanto ao homem interior» (Ef 3, 14-16). Que em cada lar o pai e a mãe, intimamente
robustecidos pela força do Espírito Santo, continuem unidos a ser a bênção de Deus
na própria família, buscando a eternidade do seu amor nas fontes da graça confiadas
à Igreja, que é «um povo unido pela unidade do Pai e do Filho e do Espírito Santo»
(Lumen gentium, 4). Mas, enquanto a Igreja compara a família humana com a vida
da Santíssima Trindade – primeira unidade de vida na pluralidade das pessoas – e não
se cansa de ensinar que a família tem o seu fundamento no matrimônio e no plano de
Deus, a consciência difusa no mundo secularizado vive na incerteza mais profunda a
tal respeito, especialmente desde que as sociedades ocidentais legalizaram o divórcio.
O único fundamento reconhecido parece ser o sentimento ou a subjetividade individual
que exprime-se na vontade de conviver. Nesta situação, diminui o número de matrimônios,
porque ninguém compromete a vida sobre uma premissa tão frágil e inconstante, crescem
as uniões de fato e aumentam os divórcios. Sobre esta fragilidade, consuma-se o drama
de tantas crianças privadas de apoio dos pais, vítimas do mal-estar e do abandono
e expande-se a desordem social. A Igreja não pode ficar indiferente diante da
separação dos cônjuges e do divórcio, diante da ruína dos lares e das conseqüências
criadas pelo divórcio nos filhos. Estes, para ser instruídos e educados, precisam
de referências extremamente precisas e concretas, isto é, de pais determinados e certos
que de modo diverso concorrem para a sua educação. Ora é este princípio que a prática
do divórcio está minando e comprometendo com a chamada família alargada e móvel, que
multiplica os «pais» e as «mães» e faz com que hoje a maioria dos que se sentem «órfãos»
não sejam filhos sem pais, mas filhos que os têm em excesso. Esta situação, com as
inevitáveis interferências e cruzamento de relações, não pode deixar de gerar conflitos
e confusões internas contribuindo para criar e gravar nos filhos uma tipologia alterada
de família, assimilável de algum modo à própria convivência por causa da sua precariedade. É
firme convicção da Igreja que os problemas atuais, que encontram os casais e debilitam
a sua união, têm a sua verdadeira solução num regresso à solidez da família cristã,
lugar de confiança mútua, de dom recíproco, de respeito da liberdade e de educação
para a vida social. É importante recordar que, «pela sua própria natureza, o amor
dos esposos exige a unidade e a indissolubilidade da sua comunidade de pessoas, a
qual engloba toda a sua vida» (Catecismo da Igreja Católica, 1644). De fato, Jesus
disse claramente: «O que Deus uniu, o homem não separe» (Mc 10, 9), e acrescenta:
«Quem despede a sua mulher e se casa com outra, comete adultério contra a primeira.
E se uma mulher despede o seu marido e se casa com outro, comete adultério também»
(Mc 10, 11-12). Com toda a compreensão que a Igreja possa sentir face a tais situações,
não existem casais de segunda união, como os há de primeira; aquela é uma situação
irregular e perigosa, que é necessário resolver, na fidelidade a Cristo, encontrando
com a ajuda de um sacerdote um caminho possível para pôr a salvo quantos nela estão
implicados. Para ajudar as famílias, vos exorto a propor-lhes, com convicção,
as virtudes da Sagrada Família: a oração, pedra angular de todo lar fiel à sua própria
identidade e missão; a laboriosidade, eixo de todo matrimônio maduro e responsável;
o silêncio, cimento de toda a atividade livre e eficaz. Desse modo, encorajo os vossos
sacerdotes e os centros pastorais das vossas dioceses a acompanhar as famílias, para
que não sejam iludidas e seduzidas por certos estilos de vida relativistas, que as
produções cinematográficas e televisivas e outros meios de informação promovem. Tenho
confiança no testemunho daqueles lares que tiram as suas energias do sacramento do
matrimônio; com elas torna-se possível superar a prova que sobrevém, saber perdoar
uma ofensa, acolher um filho que sofre, iluminar a vida do outro, mesmo fraco ou diminuído,
mediante a beleza do amor. É a partir de tais famílias que se há de restabelecer o
tecido da sociedade. Estes são, caríssimos Irmãos, alguns pensamentos que deixo-vos
ao concluirdes a vossa visita ad Limina, rica de notícias consoladoras mas também
carregada de trepidação pela fisionomia que no futuro possa adquirir a vossa amada
Nação. Trabalhai com inteligência e com zelo; não poupeis fadigas na preparação de
comunidades ativas e cientes da própria fé. Nestas se consolidará a fisionomia da
população nordestina segundo o exemplo da Sagrada Família de Nazaré. Tais são os meus
votos que corroboro com a Bênção Apostólica que concedo a todos vós, extensiva às
famílias cristãs e diversas comunidades eclesiais com seus pastores e todos os fiéis
das vossas diletas dioceses.
SAUDAÇÃO DE DOM JOSÉ ANTÔNIO APARECIDO TOSI MARQUES,
ARCEBISPO DE FORTALEZA
Santo Padre,
Aqui estamos os bispos das Províncias
Eclesiásticas de Fortaleza e de Teresina, Regionais Nordeste 1 e Nordeste 4 da CNBB,
para o nosso encontro com Vossa Santidade "ad Limina Apostolorum". Imediatamente
nos vem à mente a atitude do apóstolo Paulo que, em meio a sua missão evangelizadora,
procura um encontro com Pedro e os demais apóstolos em Jerusalém para partilhar sua
vida e missão e confirmar-se no Evangelho, para não correr em vão. Recordamos com
gratidão o encontro que tivemos, quando de Sua presença entre nós para a V Conferência
do Episcopado Latino Americano e do Caribe, e os imensos frutos dela advindos. Agradecemos
pelo empenho de Vossa Santidade no Acordo firmado entre a Santa Sé e o Estado Brasileiro. Aqui
viemos, Santo Padre, com muita alegria pela graça deste encontro, entregar-Lhe o testemunho
de nossa missão apostólica nas Igrejas onde fomos colocados como pastores. Trazemos
também a devoção e veneração de nossas Igrejas, de nosso povo muito devoto e carinhoso
para com o Papa. Nossas Igrejas estão sempre atentas ao Papa e sintonizam com suas
orientações, rezam por sua saúde e força no ministério, pedem sua bênção na certeza
das graças de Jesus, que o assiste como prometeu. Agradecemos-lhe, Santo Padre,
pelo luminoso magistério que nos tem confortado em meio aos desafios, que são muitos
hoje, e nos tem estimulado a colher com alegria o dom do encontro com o Senhor e o
urgente compromisso da missão como máxima expressão da caridade para com a humanidade. Somos
gratos pelas iniciativas do Ano Paulino e agora do Ano Sacerdotal, pelo empenho a
favor da dignidade da pessoa humana, da vida em Cristo, da família, da juventude,
do bem dos povos. Todas elas trazem a criatividade do amor que responde às necessidades
de nosso tempo e da mesma Igreja no reconhecimento da graça de seu ser e de sua missão. Queremos
expressar nossa comunhão com "aquele que mais ama", com "o sucessor do apóstolo Pedro",
que "confirma seus irmãos na fé". Queremos confiar-nos às suas orientações na leitura
dos sinais dos tempos, diante das interpelações da humanidade e na missão apostólica
da qual somos feitos participantes. Receba, Santo Padre, toda a nossa disponibilidade
e reverente obséquio na comunhão episcopal. Pedimos sua bênção.