ARCEBISPO PIACENZA: A FUNÇÃO DAS NOVAS FACULDADES CONCEDIDAS PELO PAPA À CONGREGAÇÃO
PARA O CLERO
Cidade do Vaticano, 05 jun (RV) - Nestes dias, órgãos de imprensa difundiram
algumas informações e comentários a propósito de uma Carta da Congregação para o Clero
acerca de algumas novas faculdades que lhe foram concedidas pelo papa, no dia 30 de
janeiro passado. A Carta foi enviada aos núncios a fim de que a levassem a conhecimento
do bispo de cada diocese.
Não se trata de uma "revolução da disciplina eclesiástica
para o clero", mas de uma diretriz que vai ao encontro de algumas exigências pastorais
particulares que os bispos devem enfrentar, em relação ao clero, no governo ordinário
de suas dioceses.
Sobre o significado e a função dessas faculdades, a Rádio
Vaticano ouviu o secretário da Congregação para o Clero, o arcebispo Mauro Piacenza.
Eis o que disse:
Dom Mauro Piacenza:- "Não é uma simplificação de procedimentos
ou um processo simplificado, mas um instrumento jurídico em continuidade e em coerência
com o direito canônico vigente. Não se trata, muito menos, de um procedimento que
se aplica automaticamente, mas que deve ser seguido só em alguns e muito bem determinados
casos, ao prudente juízo da Sé Apostólica. De fato, imutáveis e intactos são os direitos
e os deveres dos Bispos no exercício da função judiciária. O Bispo deve vigiar sempre
para que o presbítero seja fiel no cumprimento dos seus deveres ministeriais. O Bispo
diocesano deve acompanhar os seus presbíteros com solicitude, também tutelando os
seus direitos. A grande maioria dos sacerdotes vive serenamente, na vida ordinária,
a própria identidade e desempenha fielmente o próprio ministério. A Santa Sé intervém
de forma subsidiária, em casos particulares, para reparar o escândalo, restabelecer
a justiça e emendar o réu."
P. Na prática, em que implicam essas faculdades?
Dom
Mauro Piacenza:- "Note-se que, infelizmente, algumas vezes podem ocorrer situações
de grave indisciplina por parte do clero, onde os meios adotados, que visam a sua
superação, não sejam eficazes e, em tais situações, corre-se o risco de procrastinar-se
excessivamente, com grave escândalo para os fiéis e dano ao bem comum. Com a intenção
de promover a salus animarum, que é a suprema lei da Igreja, no dia 30 de janeiro
último, o Sumo Pontífice concedeu à Congregação para o Clero algumas faculdades especiais.
Precedentemente, também foram concedidas faculdades especiais a outros Dicastérios
da Cúria Romana. Trata-se, antes de tudo, da faculdade de tratar os casos de demissão
do estado clerical “in poenam”, com a respectiva dispensa de todas as obrigações inerentes
à ordenação, de clérigos que atentaram matrimônio mesmo só civilmente e que, admoestados,
não se emendaram, persistindo em uma conduta irregular e escandalosa, e de clérigos
que cometeram outros graves delitos contra o Sexto Mandamento do Decálogo. A especial
faculdade de intervir para infligir uma justa pena ou uma penitência, nos casos de
violação externa da lei divina e canônica. Em casos realmente excepcionais e urgentes,
quando se configurar a falta de vontade de emenda por parte do réu, se poderá também
infligir penas perpétuas, sem exclusão da demissão do estado clerical, quando circunstâncias
particulares assim o exigirem. Naturalmente, todo e qualquer eventual caso deverá
ser instruído através de um legítimo procedimento administrativo, ressalvado sempre
o direito de defesa, que deve ser sempre garantido. E, finalmente, a faculdade especial
de declarar a perda do estado clerical dos clérigos que abandonaram o ministério por
um período superior a 5 anos consecutivos e que persistam em tal ausência voluntária
e ilícita do ministério. Nada feito de modo automático. Não há “automatismo” nos tempos,
os casos são avaliados singularmente e sempre em situações graves. Que ninguém pense
superficialmente em algum tipo de simplificação genérica em matéria tão delicada.
Nada de “automatismo”, mas de crivo e crivo rigoroso!"
P. Portanto, tais
faculdades, de fato, ajudam aos sacerdotes?
Dom Mauro Piacenza:-
"Chegou-se à concessão de tais faculdades com o vivo desejo de contribuir para com
o honrar a missão e a figura dos sacerdotes que, neste período difusamente marcado
pela secularização, são agravados pela fatiga de ter que pensar e agir contracorrente,
para a fidelidade à própria identidade e missão. Os sacerdotes agem in persona
Christi Capitis et Pastoris. Em meio ao rebanho a eles confiado, os presbíteros
são chamados a prolongar a presença de Cristo, fazendo-se seu reflexo. Eis porque
é necessária, ou melhor, indispensável, a tensão verso a perfeição moral, que deve
habitar em todo coração autenticamente sacerdotal, sem dar lugar a falsos “angelicalismos”,
mas tendo em vista a estrutura antropológica humana. Tal estrutura, ferida pelo pecado
original, exige a contínua ascese do sacerdote, na fidelidade às promessas feitas
no dia da Ordenação e com profundo respeito pelos intangíveis direitos de Deus. Tudo
isto é particularmente importante também para compreender a motivação teológica do
celibato sacerdotal, porque a vontade da Igreja a tal propósito, encontra a sua motivação
última na ligação de especialíssima conveniência, entre o celibato e a Ordenação.
Tal ato sacramental configura o sacerdote a Jesus Cristo, Cabeça e Esposo da Igreja.
Por isso, a Igreja confirmou – no Concílio Vaticano II, repetidamente, no sucessivo
Magistério Pontifício e nos Sínodos – a “firme vontade de manter a lei que exige o
celibato livremente aceito e perpétuo para os candidatos a ordenação sacerdotal no
rito latino”. O celibato sacerdotal é um dom que a Igreja recebeu e deseja guardar,
convicta que é um bem para si mesma e para o mundo."
P. Concluindo, o que
deseja aos sacerdotes?
Dom Mauro Piacenza:- "Esta Congregação espera
que cada Bispo se empenhe, cada vez mais, com autêntica paternidade e caridade pastoral,
para que os seus mais preciosos colaboradores saibam viver a disciplina eclesiástica
como discipulado e possam viver a disciplina própria da vida sacerdotal com motivações
interiores profundas, conscientes de que nada vale o afã do “fazer” quotidianamente,
sem o “ser em Cristo”, tal como se atesta na experiência da Sua Divina Misericórdia."