O sentido da Ascensão do Senhor e a herança espiritual de São Bento sublinhados pelo
Papa na Missa celebrada em Cassino
O sentido da Ascensão do Senhor e a herança espiritual de São Bento – foram sublinhados
por Bento XVI na homilia da Missa celebrada neste domingo de manhã, na praça central
de Cassino, aos pés da colina onde emerge majestosa a abadia beneditina de Montecassino,
reconstruída após a destruição sofrida há 65 anos, na II Guerra Mundial.
“Em
Cristo que subiu ao céu, o ser humano entrou de modo novo e inaudito na intimidade
de Deus; doravante o homem encontra, para sempre, espaço em Deus. O céu
não indica um lugar por cima das estrelas, mas algo de muito mais ousado e sublime:
indica o próprio Cristo, a Pessoa divina que acolhe, plenamente e para sempre, a humanidade
– Aquele no qual Deus e o homem estão para sempre inseparavelmente unidos”.
“Aproximamo-nos
do céu, melhor ainda, entramos no céu, na medida em que nos aproximamos de Jesus e
entramos em comunhão com Ele” – sublinhou ainda o Papa. A solenidade da Ascensão convida
a uma profunda comunhão com Jesus, invisivelmente presente na vida de cada um de nós.
Compreende-se, assim, por que é que o evangelista Lucas afirma que, depois da Ascensão,
os discípulos tornaram a Jerusalém “cheios de alegria”.
“A causa da alegria
deles era o facto de o que tinha acontecido não ter sido, na realidade, uma separação:
antes, eles tinham agora a certeza de que o Crucificado - Ressuscitado estava vivo,
e n’Ele se encontravam para sempre abertas para a humanidade as portas da vida eterna.
Por outras palavras, a Ascensão não comportava a sua ausência temporária do mundo,
mas inaugurava, isso sim, a nova, definitiva e insuprível forma da sua presença, em
virtude da sua participação na potência régia de Deus”.
Tocará aos discípulos,
animados pela potência do Espírito Santo, tornar perceptível a Sua presença com o
testemunho, a pregação e o empenho missionário.
“A solenidade das Ascensão
do Senhor deveria encher-nos de serenidade e de entusiasmo, precisamente como aconteceu
com os Apóstolos que regressaram do Monte das Oliveiras cheios de alegria. Como
eles, também nós, acolhendo o convite dos dois homens vestidos de branco, não
devemos ficar bloqueados a olhar para o céu, mas – sob a guia do Espírito Santo –
devemos ir por toda a parte e proclamar o anúncio salvífico da morte e ressurreição
de Cristo”.
A partir do “carácter histórico do mistério da ressurreição e
ascensão de Cristo”, Bento XVI referiu “a condição transcendente e escatológica da
Igreja, a qual – sublinhou – não nasceu e não vive para suprir a ausência do seu Senhor,
“desaparecido”, mas sim encontra a razão do seu ser e da sua missão na invisível presença
de Jesus, que actua com a potência do seu Espírito”.
“Desde o dia da Ascensão,
cada comunidade cristã avança no seu itinerário terreno em direcção ao cumprimento
das promessas messiânicas, alimentada pela Palavra de Deus e nutrida com o Corpo e
Sangue do seu Senhor. É esta a condição da Igreja – recorda o Concílio Vaticano
II – ao mesmo tempo que prossegue a sua peregrinação entre as perseguições do mundo
e as consolações de Deus, anunciando a paixão e morte do Senhor, até que Ele venha”.
Dirigindo-se
mais expressamente, neste contexto, à comunidade diocesana de Cassino, o Papa recordou
que a solenidade da Ascensão nos exorta a “revigorar a nossa fé na presença real de
Jesus: sem Ele nada podemos realizar de eficaz na nossa vida e no nosso apostolado”.
“Caros
irmãos e irmãs, sentimos ecoar nesta nossa celebração o apelo de São Bento a manter
o coração fixo em Cristo, nada antepondo a Ele. Isto não nos distrai, pelo contrário,
leva-nos ainda mais a empenharmo-nos em construir uma sociedade onde a solidariedade
se exprima com sinais concretos.”
Como? – interrogou-se o Papa. A espiritualidade
beneditina – lembrou - propõe um programa evangélico sintetizado no lema Ora et
labora et lege: oração, trabalho, cultura. Antes de mais a oração, “a mais
bela herança deixada por São Bento”. A oração – insistiu Bento XVI – é “a senda silenciosa
que nos conduz directamente ao coração de Deus”, “o respiro da alma que nos restitui
paz nas tempestades da vida”. Neste contexto, o Papa aludiu expressamente à chamada
Lectio divina – que hoje em dia se tornou património comum de muitos. “Possa
a escuta atenta da Palavra de Deus alimentar a nossa oração e tornar-vos profetas
de verdade e de amor num empenho coral de evangelização e de promoção humana”.
Recordando
depois que outro eixo da espiritualidade beneditina é o trabalho, observou: “Humanizar
o mundo do trabalho é típico da alma do monaquismo. É este também o esforço da vossa
Comunidade que procura estar ao lado dos numerosos trabalhadores da grande indústria
presente em Cassino e das empresas a ela ligadas. Sei como é crítica a situação de
tantos operários.”
O Papa exprimiu “solidariedade a todos os que vivem uma
preocupante situação de precariedade”, nomeadamente aos desempregados, e encorajou
as autoridades e os empresários locais a procurarem “soluções válidas para a crise
do desemprego”, salvaguardando assim o bem das famílias, que – sublinhou – tanto precisam
de ser tuteladas.
Reservando uma última palavra ao mundo da cultura e da educação,
Bento XVI evocou o célebre Arquivo e a Biblioteca do mosteiro de Montecassino, que
“recolhem inumeráveis testemunhos do empenho de homens e mulheres que meditaram e
procuraram como melhorar a vida espiritual e material do homem”. “Na vossa Abadia
faz-se a experiência concreta do que significa quaerere Deum, isto é, o facto
de a cultura europeia ter sido a busca de Deus e a disponibilidade para O escutar.
E isto vale também para o nosso tempo”. “No actual esforço cultural visando criar
um novo humanismo”, o Papa congratulou-se com o facto de a comunidade diocesana local
reservar a devida “atenção ao homem frágil, débil, às pessoas com deficiências e aos
imigrados” – como o revela a inauguração, esta tarde, da “Casa da Caridade”, da diocese,
onde (disse o Papa) “se constrói com os factos uma cultura atenta à vida”.