Tempo Quaresmal e Pascal «Solidariedade Activa»: Mensagem do Arcebispo de Braga para
a Quaresma de 2009
(1/3/2009) “Saulo viu-se repentinamente cercado por uma luz que vinha do céu. Caiu
por terra e ouviu uma voz que lhe dizia: “Saulo, Saulo, porque me persegues?” Saulo
perguntou: “Quem és Tu, Senhor?” A voz respondeu: “Eu sou Jesus a Quem tu persegues.
Agora levanta-te, entra na cidade, e aí te dirão o que deves fazer”… (Act 9, 3-6)
Em Ano Paulino descortinamos os momentos fundamentais da Vida de S. Paulo. Tudo,
para ele, obteve um sentido diferente quando foi encontrado pela Palavra, no caminho
de Damasco. No momento não conseguia “ver nada”; posteriormente, “recuperou” uma
liberdade radical que o colocou numa doação de vida a Cristo sem condições ou interpretações
pessoais. Quis viver Cristo e entregou-se para que outros iniciassem idêntica experiência.
A Quaresma é um tempo particular para entrarmos, mais intensamente, no espírito
do nosso Programa Pastoral. Sugiro dois itinerários que retiro das palavras de Cristo
a Saulo: 1º “Levanta-Te” O cristianismo, para muitos, corre o risco de se
tornar uma mera repetição de costumes e tradições. Urge que nos “levantemos”, com
o sacrifício e o simbolismo desta atitude, a fim de criar disponibilidade interior
para um encontro com a Palavra. Suscitando as condições necessárias, seremos encontrados,
no mundo das opções fundamentais, por uma contínua aurora de coisas desconhecidas
que nos encantarão e abrirão horizontes desconhecidos. Deixar-se encontrar pela
Palavra é algo de muito pessoal a exigir que calemos outros barulhos para começar
a “ver” dum modo diferente. Com os outros poderemos dar à Voz da Palavra o volume
duma compreensão maior. “Te dirão o que deves fazer”; é apelo ao encontro com outros
em trabalho de reflexão e oração bíblica. 2º “Entra na cidade” O levantar-se
para fugir aos ruídos e deixar-se encontrar pela Palavra leva consigo o convite para
que entremos, também, na cidade dos homens, ou seja, em todo o lugar onde vive qualquer
ser humano. A Voz da Palavra ouve-se nos lamentos das pessoas e nos dramas da sociedade.
Só com a Palavra de Deus conseguiremos ouvir a “voz” do Povo, dar-lhe o bálsamo para
a dor e o segredo para ultrapassar as crises. A Palavra gera esperança e compromete
na solidariedade activa. Encontrados pela Palavra, descortinaremos coisas e necessidades
que são supérfluas e poderemos partilhar com renúncias que mostrem a força da mesma
Palavra. Entrando nas nossas cidades e aldeias, veremos que é possível dar razões
para viver aos sem abrigo, aos pobres, aos doentes terminais… 2.1 – Finalidade
da Renúncia Quaresmal A partilha, fruto da Renúncia, será, este ano, orientada
para uma iniciativa: A criação dum espaço capaz de recolher, durante todo o ano,
tudo o que seja útil aos pobres (material) e que, para nós, seja desnecessário. Ao
mesmo tempo, ampliaremos o refeitório Social e criaremos um local para acolhimento
temporário de carenciados. A Caritas Arquidiocesana dará a estes espaços uma solicitude
caritativa aberta a todos os arciprestados e comunidades paroquiais. Chamar-lhe-emos
Casa Alavanca (C.A.). Como o nome sugere, pretende ajudar a erguer-se e avançar com
esperança. 2.2 – Voluntariado para testemunhar Cristo Vivo Levantar-se para
se deixar encontrar pela Palavra e entrar na cidade dos homens com os seus dramas
deverá orientar a caminhada Quaresmal e Pascal das nossas comunidades: a Quaresma
com “abstinências” e “jejuns” do supérfluo numa vida pautada pela sobriedade; o tempo
Pascal como apelo à criatividade e concretização de iniciativas que manifestem Cristo
Vivo e Ressuscitado a intervir na Salvação integral de todos os homens e mulheres
das nossas comunidades. Os carenciados devem ser identificados e a solidariedade terá
de ser criativa. Recordo os desempregados, particularmente os envergonhados, que,
com toda a certeza, será um grupo social a necessitar de atenção. A situação social
pede alguma coisa dos cristãos. Dar é importante mas dar-se é a verdadeira explicitação
da Palavra de Deus. É um imperativo da vocação e missão dos cristãos. Daí que nos
tempos difíceis e em época de conversão deixe, ainda, um apelo para uma renovada experiência
de voluntariado ao jeito de Cristo que deu a Sua Vida. Só estruturando uma verdadeira
rede de voluntariado, activo e comprometido, poderemos ser sinais de Cristo, como
Paulo. Que os sacerdotes aproveitem as circunstâncias de reflexão para motivar e comprometer,
aumentando e estruturando o número daqueles que já encontram ou irão encontrar tempo
para dar à comunidade. Para expressar a ideia duma solidariedade em rede, gostaria
que cada comunidade tivesse um grupo que poderia chamar-se Voluntariado em Movimento
(V.E.M.). Para além do grupo, promova-se uma formação específica capaz de dar ânimo
e coragem para que o desânimo nunca aconteça. Com este itinerário, o tempo Penitencial
da Quaresma e a alegria do anúncio Pascal dum Cristo Ressuscitado demonstrarão que
a Vida com dignidade para todos é possível, desde que queiramos percorrer o caminho
de toda a mensagem cristã que o “tomar conta” da Palavra exige. Braga, 2 de Fevereiro,
Nossa Senhora da Luz, de 2009 Jorge Ferreira da Costa Ortiga, A.P