PAPA PEDE À ROTA ROMANA ATENÇÃO AO AUMENTO DE SENTENÇAS DE NULIDADE MATRIMONIAL
Cidade do Vaticano, 29 jan (RV) - Bento XVI recebeu em audiência esta manhã,
na Sala Clementina, no Vaticano, o Colégio dos prelados auditores do Tribunal da Rota
Romana, por ocasião da inauguração do ano judiciário do referido tribunal. No discurso
dirigido aos presentes, o Santo Padre disse que é necessário prestar atenção ao "multiplicar-se
exagerado" das declarações de nulidade matrimonial "sob o pretexto de uma certa imaturidade
ou fraqueza psíquica do contraente". "O que está em jogo é a própria verdade sobre
o matrimônio" – afirmou Bento XVI.
O papa serviu-se das alocuções pronunciadas
há mais de 20 anos por João Paulo II, sobre a incapacidade psíquica nas causas de
nulidade matrimonial (5 de fevereiro de 1987 e 25 de janeiro de 1988), para perguntar-se
"em que medida esses pronunciamentos tiveram um acolhimento adequado nos tribunais
eclesiásticos".
"Salta aos olhos o dado de fato de um problema que continua
sendo de grande atualidade" – afirmou o pontífice:
"Em alguns casos se pode,
infelizmente, perceber ainda a grande exigência da qual falava o meu venerado Predecessor:
a de preservar a comunidade eclesial 'do escândalo de ver na prática destruído, o
valor do matrimônio cristão, com o multiplicar-se exagerado e quase autônomo das declarações
de nulidade, em caso de falimento do matrimônio, sob o pretexto de uma certa imaturidade
ou fraqueza psíquica do contraente' (Alocução à Rota Romana, 5.2.1987)."
O
Santo Padre chamou "a atenção dos agentes do Direito sobre a exigência de tratar as
causas com a imperiosa profundidade exigida pelo ministério de verdade e de caridade
que é próprio da Rota Romana". E recordou alguns princípios para discernir a validade
do matrimônio sem confundir incapacidade e dificuldade.
Citando João Paulo
II, Bento XVI afirmou que se pode contemplar a hipótese de "uma verdadeira incapacidade
'somente na presença de uma séria forma de anomalia' que – presente já no tempo do
matrimônio – 'deve atingir substancialmente a capacidade de entender e ou de querer'"
e, portanto, a faculdade de escolher livremente o estado de vida. Anomalia que deve
provocar "não somente uma grave dificuldade, mas também a impossibilidade de assumir
as tarefas inerentes às obrigações essenciais do matrimônio".
Para o papa,
"é necessário... redescobrir positivamente a capacidade que em princípio toda pessoa
humana tem de casar-se em virtude de sua própria natureza de homem ou de mulher":
"De
fato, corremos o risco de cair num pessimismo antropológico que, à luz da situação
cultural de hoje, considera quase impossível casar-se. À parte o fato que tal situação
não é uniforme nas várias regiões do mundo, as reais dificuldades nas quais muitos
se encontram, especialmente os jovens – chegando a considerar que a união matrimonial
é normalmente impensável e impraticável – não podem ser confundidas com a verdadeira
incapacidade consensual. Aliás, a reafirmação da inata capacidade humana ao matrimônio
é justamente o ponto de partida para ajudar os casais a descobrirem a realidade natural
do matrimônio e o relevo que tem no plano da salvação."
"O que definitivamente
está em jogo é a própria verdade sobre o matrimônio" – reiterou o papa – cuja validade
"não depende do sucessivo comportamento dos cônjuges", mas da capacidade de contrair
o vínculo matrimonial:
"Essa capacidade não é medida em relação a um determinado
grau de realização existencial ou efetiva da união conjugal mediante o cumprimento
das obrigações essenciais, mas em relação ao valor eficaz de cada um dos contraentes,
que torna possível e operante tal realização já no momento do pacto nupcial."
"Diversamente
– acrescentou o papa – na ótica reducionista que desconhece a verdade sobre o matrimônio,
a realização efetiva de uma verdadeira comunhão de vida e de amor, idealizada num
plano de bem-estar puramente humano, se torna essencialmente dependente somente de
fatores acidentais, e não, ao invés, do exercício da liberdade humana sustentada pela
graça."
"Obviamente, algumas correntes antropológicas 'humanísticas' voltadas
para a auto-realização egocêntrica, idealizam de tal modo a pessoa humana e o matrimônio,
que acabam negando a capacidade psíquica de muitas pessoas, fundamentando-a em elementos
que não correspondem às exigências essenciais do vínculo conjugal."
Por
fim, o papa concluiu afirmando que "as causas de nulidade por incapacidade psíquica
exigem, em linha de princípio, que o juiz se sirva da ajuda de peritos para certificar
a existência de uma verdadeira incapacidade, que é sempre uma exceção ao princípio
natural da capacidade necessária para compreender, decidir e realizar a doação de
si mesmos, da qual nasce o vínculo conjugal."