DISCURSO DO PAPA AOS JOVENS EM RECUPERAÇÃO: "ESCOLHAM A VIDA"
Prezados jovens amigos,
É com prazer que me encontro hoje convosco, aqui em
Darlinghurst, e de coração saúdo a todos aqueles que participam no programa «Alive»
e ainda ao pessoal que o gere. Elevo a minha oração para que todos vós possais beneficiar
deste apoio que a Social Services Agency da arquidiocese de Sidney coloca à vossa
disposição, e para que o bem que aqui se está a realizar dure por muito tempo no futuro.
O nome do programa que seguis leva-nos a formular esta pergunta: Que quer dizer
realmente estar «vivo», viver plenamente a vida? Isto é o que todos nós queremos,
especialmente na juventude, e é isto o que Cristo quer para nós. Assim falou Ele:
«Eu vim para que tenham vida, e a tenham em abundância» (Jo 10, 10). O instinto mais
radicado em todo o ser vivo é conservar a vida, crescer, desenvolver-se e transmitir
aos outros o dom da vida. Consequentemente é de todo natural questionar-se sobre o
modo melhor que há para realizar tudo isto. Talvez no vosso pensamento vos pareça
muito improvável que, no mundo actual, as pessoas adorem outros deuses. Mas, às vezes
as pessoas adoram «outros deuses» sem dar por isso. Os falsos «deuses» – independentemente
do nome, da imagem ou da forma que lhes atribuamos – estão quase sempre ligados à
adoração de três realidades: os bens materiais, o amor possessivo, o poder. Deixai-me
explicar o que pretendo dizer. Em si mesmos, os bens materiais são bons. Não poderíamos
sobreviver por muito tempo sem dinheiro, vestuário e uma casa. Para viver, temos necessidade
de alimento. Mas, se formos glutões, se recusarmos partilhar o que temos com o faminto
e o pobre, então transformamos estes bens numa falsa divindade. Quantas vozes se levantam
na nossa sociedade materialista dizendo-nos que a felicidade se encontra dotando-se
da maior quantidade possível de bens e de objectos de luxo! Mas isto significa transformar
os bens em falsas divindades. Em vez de nos trazer a vida, levam-nos à morte. O
amor autêntico é certamente uma coisa boa. Sem ele, a vida dificilmente seria digna
de ser vivida. O amor dá satisfação à nossa carência mais profunda; e, quando amamos,
tornamo-nos mais nós mesmos, tornamo-nos humanos de forma mais plena. E todavia como
se pode facilmente transformar o amor numa falsa divindade! As pessoas muitas vezes
pensam que estão a amar, quando na realidade procuram possuir ou manipular o outro.
Por vezes tratam-se os outros mais como objectos para satisfazer as próprias necessidades
do que como pessoas que se devem prezar e amar. Isto é adorar uma falsa divindade.
Em vez de nos trazer a vida, leva-nos à morte. O poder que Deus nos deu para plasmar
o mundo que nos rodeia é certamente uma coisa boa. Utilizado de modo apropriado e
responsável, permite-nos transformar a vida das pessoas. Todas as comunidade têm necessidade
de guias capazes. Como é forte, porém, a tentação de agarrar-se ao poder por si mesmo,
de procurar dominar os outros ou explorar o ambiente natural para os próprios interesses
egoístas! Isto é transformar o poder numa falsa divindade. Em vez de nos trazer a
vida, leva-nos à morte. O culto dos bens materiais, o culto do amor possessivo
e o culto do poder levam muitas vezes as pessoas a «comportar-se como se fossem Deus»:
procurar assumir o controle total, sem ter qualquer consideração pela sabedoria ou
pelos mandamentos que Deus nos deu a conhecer. Este é o caminho que conduz à morte.
Pelo contrário, a adoração do único Deus verdadeiro significa reconhecer n’Ele a fonte
de tudo o que é bem, confiarmo-nos nós mesmos a Ele, abrirmo-nos à força regeneradora
da sua graça e obedecer aos seus mandamentos: este é o caminho para quem escolhe a
vida. Um exemplo elucidativo do que significa afastar-se do caminho da morte
para tomar o caminho da vida encontramo-lo numa página do Evangelho que todos vós
– estou certo – bem conheceis: a parábola do filho pródigo. Muitos de vós experimentaram
pessoalmente a vivência por que passou aquele jovem. Talvez tenhais feito escolhas
de que agora vos lamentais, decisões essas que vos levaram por um caminho que, embora
então pudesse apresentar-se como atraente, na verdade conduziu-vos apenas para um
estado ainda mais profundo de miséria e solidão. A decisão de abusar de droga ou álcool,
de entrar em actividades criminosas ou autolesivas pôde então aparecer como um caminho
para sair duma situação de dificuldade ou de confusão. Agora sabeis que, em vez de
trazer a vida, levou à morte. Reconheço de bom grado a coragem demonstrada quando
decidistes regressar ao caminho da vida, precisamente como o jovem da parábola. Aceitastes
a ajuda: dos amigos ou dos familiares, do pessoal do programa «Alive», de quantos
têm vivamente a peito o vosso bem-estar e a vossa felicidade. Em vós, queridos
amigos, vejo embaixadores de esperança para quantos se encontram em idênticas situações.
Podeis convencê-los da necessidade de optar pelo caminho da vida e fugir do caminho
da morte, porque falais com base na experiência. Em todos os quatro Evangelhos, vemos
aqueles que tomaram decisões erradas ser particularmente amados por Jesus, porque,
quando se deram conta do seu erro, abriram-se mais do que os outros à sua palavra
regeneradora. Aqueles que desejavam reconstruir a sua vida eram os que se mostravam
mais disponíveis para ouvir Jesus e tornar-se seus discípulos. Vós podeis seguir as
suas pegadas e sentir uma particular proximidade a Jesus, precisamente porque decidistes
regressar a Ele. Podeis estar certos de que Jesus, como fez o Pai na narração do filho
pródigo, acolhe-vos de braços totalmente abertos. Oferece-vos o seu amor incondicional:
e é na profunda amizade com Ele que se encontra a plenitude da vida. Disse atrás
que, ao amarmos, damos satisfação às nossas carências mais profundas e tornamo-nos
mais nós mesmos, tornamo-nos humanos de forma mais plena. Amar é aquilo para que estamos
programados, aquilo para que fomos projectados pelo Criador. Naturalmente não estou
a falar de relações passageiras, superficiais; falo do verdadeiro amor, que é o cerne
da doutrina moral de Jesus: «Amarás o Senhor, teu Deus, com todo o teu coração, com
toda a tua alma, com todo o teu entendimento e com todas as tuas forças» e «amarás
o teu próximo como a ti mesmo» (cf. Mc 12, 30-31). Isto é o que os homens são chamados
a cumprir; é o que significa estar realmente «vivo». Com a força do Espírito
Santo, escolhei a vida, escolhei o amor e sede diante do mundo testemunhas da alegria
que daí jorra. Esta é a minha oração por cada um de vós nesta Jornada Mundial da Juventude.
Deus vos abençoe a todos! A versão integral dos discursos pronunciados pelo Santo
Padre está disponível no site da Santa Sé www.vatican.va e nas várias edições
do jornal L'Osservatore Romano.