2008-07-17 08:47:10

FESTA DE ACOLHIDA DOS JOVENS NO PORTO DE BARANGAROO. AS PALAVRAS DO PAPA


Queridos jovens,
(…) Seja qual for o país donde vindes, finalmente estamos aqui, em Sidney! E juntos estamos presentes neste nosso mundo como família de Deus, como discípulos de Cristo, confirmados pelo seu Espírito para sermos testemunhas do seu amor e da sua verdade diante de todos.
Desejo em primeiro lugar agradecer aos Anciãos dos Aborígenes que me deram as boas-vindas antes de eu subir para o barco na Rose Bay. Sinto-me profundamente emocionado por me encontrar na vossa terra, sabendo dos sofrimentos e injustiças que esta suportou, mas ciente também da beneficiação e esperança agora em acto, de que justamente todos os cidadãos australianos podem ser orgulhosos. Aos jovens indígenas – aborígenes e habitantes das Ilhas do Estreito de Torres – e Tokelauanos, exprimo o meu obrigado pela tocantes boas-vindas. E, através de vós, envio cordiais saudações aos vossos povos.
(…) Vejo diante de mim uma imagem vibrante da Igreja universal. A variedade de nações e culturas donde provindes demonstra que a Boa Nova de Cristo é verdadeiramente para todos e cada um; ela chegou aos confins da terra. E, no entanto, sei também que um bom número de vós ainda anda à procura duma pátria espiritual. Alguns dentre vós, sem dúvida alguma bem-vindos entre nós, não são católicos nem cristãos. Talvez outros de vós se movam na periferia da vida da paróquia e da Igreja. A vós desejo oferecer o meu encorajamento: aproximai-vos do abraço amoroso de Cristo; reconhecei a Igreja como vossa casa. Ninguém é obrigado a ficar de fora, porque desde o dia do Pentecostes a Igreja é una e universal.
Nesta tarde, desejo abarcar também quantos não estão aqui presentes entre nós. Penso de modo especial nos doentes ou nos deficientes psíquicos, nos jovens encarcerados, em quantos penam à margem das nossas sociedades e naqueles que por qualquer razão se sentem alienados da Igreja. A eles digo: Jesus está perto de ti! Experimenta o seu abraço que cura, a sua compaixão, a sua misericórdia!
Há quase dois mil anos, os Apóstolos, reunidos na sala superior da casa juntamente com Maria (cf. Act 1, 14) e algumas mulheres fiéis, ficaram cheios de Espírito Santo (cf. Act 2, 4). Naquele momento extraordinário que marcou o nascimento da Igreja, a confusão e o medo, que se tinham apoderado dos discípulos de Cristo, transformaram-se numa convicção vigorosa e na certeza de um objectivo. Sentiram-se impelidos a falar do seu encontro com Jesus ressuscitado, que afectuosamente já tratavam por Senhor. (…) E, dando cumprimento ao mandato recebido do próprio Cristo, partiram testemunhando a maior história de todos os tempos: que Deus Se fez um de nós, que o divino entrou na história humana para poder transformá-la e que somos chamados a mergulhar no amor salvífico de Cristo que triunfa do mal e da morte. No famoso discurso feito no areópago, São Paulo introduziu a mensagem assim: Deus a todos dá a vida, a respiração e tudo o mais, para que todas as Nações procurem a Deus e se esforcem por encontrá-Lo, mesmo tacteando, embora não Se encontre longe de cada um de nós, porque é n’Ele que vivemos, nos movemos e existimos (cf. Act 17, 25-28).
A partir de então, homens e mulheres partiram para contar a mesma história, testemunhando o amor e a verdade de Cristo e contribuindo para a missão da Igreja. (…) Tornaram-se construtores humildes mas tenazes duma herança social e espiritual tão grande que ainda hoje proporciona bondade, compaixão e orientação a estas nações. E foram capazes de inspirar uma geração nova. Vem à mente imediatamente a fé que sustentou a Beata Mary MacKillop na sua resoluta determinação de educar especialmente os pobres, e o Beato Peter To Rot na sua firme convicção de que o chefe duma comunidade deve pautar-se sempre pelo Evangelho. Pensai ainda nos vossos avós e nos vossos pais, os vossos primeiros mestres na fé. Também eles sacrificaram muito do seu tempo e das suas forças, movidos pelo amor que vos têm. (…)
Hoje é a minha vez. (…) E todavia a vista do alto sobre o nosso planeta foi verdadeiramente magnífica. As águas tremeluzentes do Mediterrâneo, a magnificência do deserto norte-africano, a floresta luxuriante da Ásia, a vastidão do Oceano Pacífico, o horizonte onde o sol se levanta e desce, o majestoso esplendor da beleza natural da Austrália de que pude gozar nos últimos dois dias; tudo isto gera um profundo sentido de reverente temor.
(…) Mas há mais; algo cuja percepção é difícil quando visto do alto dos céus: homens e mulheres criados nada menos que à imagem e semelhança de Deus (cf. Gen 1, 26). No coração desta criação maravilhosa, estamos nós: vós e eu, a família humana «coroada de glória e honra» (…) Imersos no silêncio, num espírito de gratidão, na força da santidade, pomo-nos a reflectir.
E que descobrimos? Com relutância talvez, mas chegamos a admitir que existem também feridas que desfiguram a superfície da terra: a erosão, o desflorestamento, o esbanjamento dos recursos minerais e marítimos para alimentar um consumismo insaciável. Alguns de vós chegam das ilhas-Estado, que se vêem ameaçadas na sua própria existência pelo aumento do nível das águas; outros de nações que sofrem os efeitos de secas devastadoras. (…)
E mais… Que dizer do homem, do vértice da criação de Deus? Todos os dias deparamos com o génio das conquistas humanas. Devido aos avanços nas ciências médicas e à sábia aplicação da tecnologia até à criatividade que se espelha nas artes, cresce de muitos modos e constantemente a qualidade de vida para satisfação das pessoas. Em vós mesmos, há uma pronta disponibilidade para acolher as abundantes oportunidades que vos são oferecidas. (…)
Por isso, levando por diante a nossa reflexão, descobrimos que não é só o ambiente natural que tem as suas cicatrizes, mas também o ambiente social, o habitat que nós mesmos criamos; feridas essas que indicam que alguma coisa não está certa. Também aqui, nas nossas vidas pessoais e nas nossas comunidades, podemos encontrar inimizades por vezes perigosas; um veneno que ameaça corroer o que é bom, plasmar de modo diferente o que somos e alterar a finalidade para a qual fomos criados. Os exemplos não faltam, como bem sabeis. Entre os mais salientes, contam-se o abuso de álcool e de drogas, a exaltação da violência e a degradação sexual, frequentemente apresentados na televisão e na internet como divertimento. Pergunto-me como alguém, colocado face a face com pessoas que estão realmente sofrendo violência e exploração sexual, poderá explicar que tais tragédias, reproduzidas de forma virtual, devem considerar-se simplesmente como «divertimento».
Além disso, há algo de sinistro que nasce do facto de liberdade e tolerância serem tantas vezes separadas da verdade. Isto é alimentado pela ideia, hoje largamente espalhada, de que não há uma verdade absoluta para guiar as nossas vidas. Na prática dando indiscriminadamente valor a tudo, o relativismo fez da «experiência» a coisa mais importante. Na realidade, as experiências, desligadas de qualquer consideração do que é bom ou verdadeiro, podem conduzir, não a uma liberdade genuína, mas a uma confusão moral ou intelectual, a uma atenuação dos princípios, à perda da auto-estima e mesmo ao desespero.
Queridos amigos, a vida não é governada pela sorte, nem é casual. A vossa existência pessoal foi querida por Deus, abençoada por Ele, tendo-lhe dado uma finalidade (cf. Gen 1, 28). A vida não é uma mera sucessão de factos e experiências, por mais úteis que muitos deles se possam revelar. Mas é uma busca da verdade, do bem e da beleza. É precisamente para tal fim que fazemos as nossas opções, exercemos a nossa liberdade e nisso mesmo, isto é, na verdade, no bem e na beleza, encontramos felicidade e alegria. (…)
Cristo oferece mais… antes, oferece tudo! Só Ele, que é a Verdade, pode ser o Caminho e, consequentemente, também a Vida. (…)
Queridos amigos, em casa, na escola, na universidade, nos lugares de trabalho e de diversão, recordai-vos que sois criaturas novas. Não vos limiteis a viver cheios de assombro na presença do Criador, alegrando-vos pelas suas obras, mas tende presente que o alicerce seguro da solidariedade humana está na origem comum de toda a pessoa, o vértice do desígnio criador de Deus sobre o mundo. Como cristãos, encontrais-vos neste mundo sabendo que Deus tem um rosto humano: Jesus Cristo, o «caminho» que satisfaz todo o anseio humano e a «vida» da qual somos chamados a dar testemunho, caminhando sempre na sua luz (cf. ibid., 100).
A tarefa de testemunha não é fácil. Hoje, há muitos que pretendem que Deus deva ficar de fora e que a religião e a fé, embora aceitáveis no plano individual, devam ser excluídas da vida pública ou então utilizadas somente para alcançar determinados objectivos pragmáticos. Esta perspectiva secularizada procura explicar a vida humana e plasmar a sociedade com pouco ou nenhum referimento ao Criador. Apresenta-se como uma força neutral, imparcial e respeitadora de todos e cada um. Na realidade, porém, como qualquer ideologia, o secularismo impõe um visão global. Se Deus é irrelevante na vida pública, então a sociedade poderá ser plasmada segundo uma imagem alheada de Deus, e o debate e a política relativos ao bem comum serão conduzidos mais à luz das consequências que dos princípios radicados na verdade.
A experiência, porém, demonstra que o afastamento do desígnio de Deus criador provoca uma desordem com inevitáveis repercussões sobre o resto da criação (cf. Mensagem para o Dia Mundial da Paz 1990, 5). (…)
E que dizer do nosso ambiente social? Permanecemos igualmente alerta quanto aos sinais do nosso voltar as costas à estrutura moral de que Deus dotou a humanidade (cf. Mensagem para o Dia Mundial da Paz 2007, 8)? (…) Deste modo somos levados a reflectir sobre o lugar que têm nas nossas sociedades os pobres, os idosos, os imigrantes, os sem voz. Como é possível que a violência doméstica atormente tantas mães e crianças? Como é possível que o espaço humano mais admirável e sagrado, o ventre materno, se tenha tornado lugar de violência indizível?
(…) O nosso mundo está cansado da ambição, da exploração e da divisão, do tédio de falsos ídolos e de respostas parciais, e da mágoa de falsas promessas. O nosso coração e a nossa mente anelam por uma visão da vida onde reine o amor, onde os dons sejam partilhados, onde se construa a unidade, onde a liberdade encontre o seu próprio significado na verdade, e onde a identidade seja encontrada numa comunhão respeitosa. Esta é obra do Espírito Santo. Esta é a esperança oferecida pelo Evangelho de Jesus Cristo. Foi para dar testemunho desta realidade que fostes regenerados no Baptismo e fortalecidos com os dons do Espírito no Crisma. Seja esta a mensagem que de Sidney levareis pelo mundo!

(...)Queridos amigos dos vários países de língua oficial portuguesa, bem-vindos a Sidney! A todos saúdo com afecto: os de perto e os de longe. Lá, na vossa Pátria, tereis ouvido Jesus segredar-vos: «Sereis minhas testemunhas… até aos confins do mundo» (Act 1, 8). A viagem mais ou menos longa que enfrentastes para chegar até aqui, à Austrália ou – de seu nome cristão completo – «Terra Austral do Espírito Santo», não deixou em vós a sensação de terdes chegado aos confins do mundo? Pois bem! É com grande alegria que o Papa vos acolhe para vos confirmar como testemunhas de Jesus, por Ele acreditadas com o dom do seu próprio Espírito.

A versão integral dos discursos pronunciados pelo Santo Padre está disponível no site da Santa Sé www.vatican.va e nas várias edições do jornal L’Osservatore Romano.







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