Nota Pastoral da Conferência Episcopal Portuguesa sobre a Lei da Procriação Medicamente
Assistida
(17/11/2006) Reunidos em Assembleia Plenária pela primeira vez depois da publicação
da Lei 32/2006, de 26 de Julho, que regula a Procriação Medicamente Assistida (PMA),
os Bispos decidiram publicar a seguinte Nota Pastoral para esclarecimento da consciência
dos fiéis católicos. De facto, estamos perante mais uma Lei em que o que passa a ser
legal não é totalmente conforme com as exigências morais do cristianismo e mesmo da
ética natural. Assim, declaramos quanto segue: 1. Como já referiu o Conselho Permanente,
em Nota de 20 de Janeiro de 2006, compreendemos a necessidade de legislar sobre esta
matéria que, devido à vulgarização de práticas de PMA, a não serem reguladas, se correria
o risco de cair em abusos intoleráveis. Como então se afirmou, julgamos que a função
de uma tal lei seria “estabelecer os limites entre o que é tecnicamente possível e
o que é eticamente aceitável”. Ora é exactamente no estabelecimento desses limites
que se evidencia a distância entre a perspectiva da Lei e a Doutrina da Igreja. 2.
A moralidade das técnicas de PMA situa-se no quadro de apoio dado aos casais heterossexuais
para vencerem as dificuldades sentidas na sua infertilidade. Como afirma o Catecismo
da Igreja Católica (CIC), “as pesquisas que se destinam a reduzir a esterilidade humana
devem ser encorajadas, com a condição de estarem colocadas ao serviço da pessoa humana,
dos seus direitos inalienáveis e do seu bem verdadeiro e integral, em conformidade
com o projecto e a vontade de Deus” (CIC, n.º 2375). Isto restringe o âmbito da
legitimidade moral da PMA à fecundação homóloga, ou seja, a que é fruto da junção
de gâmetas do próprio casal. Para que essa ajuda médica à fecundidade do casal seja
moralmente legítima, ela deve limitar-se a auxiliar a união sexual dos esposos a ser
fecunda. A comunicação da vida brota da união amorosa dos esposos. Gerar um filho,
por maior que seja o desejo de paternidade e maternidade, é sempre uma dádiva e não
a reivindicação de um direito absoluto (cf. CIC, n.ºs 2377-2378). 3. São moralmente
ilegítimas todas as práticas de fecundação heteróloga, permitidas pela presente Lei,
como a fecundação com espermatozóides ou ovócitos de outra pessoa diferente dos membros
do casal e a doação de embriões (cf. Art.º 10º). Estes métodos não resolvem, realmente,
a infertilidade do casal e separam a paternidade-maternidade física da afectiva e
relacional, além de constituírem uma infidelidade do casal, ainda que consentida.
4. É conhecida uma das consequências da fecundação, homóloga ou heteróloga, desligada
da união sexual do casal: os embriões excedentários. Não é moralmente legítima a sua
utilização para investigação científica, devido à dignidade do ser humano já presente
no embrião (cf. Art.º 9º, n.º 2). 5. A moral católica baseia-se na verdade da
criação, na dignidade do amor conjugal e na valorização da união conjugal como fundamento
da família. Ela não é um conjunto de proibições. Constitui incentivo à investigação
científica para tornar mais possível uma ajuda aos casais infecundos, no âmago mesmo
da sua intimidade; e é um apelo aos casais a que, não conseguindo gerar um filho,
exerçam as suas capacidades paternais de outra maneira, por exemplo através da adopção
ou da dedicação ao serviço dos outros, sobretudo das crianças que mais precisam. Voltamos
a citar o CIC: “O Evangelho mostra que a esterilidade física não é um mal absoluto.
Os esposos que, depois de esgotados os recursos médicos legítimos, sofrem de esterilidade,
associar-se-ão à Cruz do Senhor, fonte de toda a fecundidade espiritual. Podem, porém,
vincar a sua generosidade, adoptando crianças abandonadas ou cumprindo serviços exigentes
para com outrem” (n.º 2379). Fátima, 16 de Novembro de 2006