2006-05-18 14:36:47

Católicos apoiam iniciativas de desarmamento em Portugal


A Igreja Católica está disponível para cooperar em todas as iniciativas que visem o desarmamento em Portugal e a criação de uma sociedade “segura e livre de armas”.

A Comissão Nacional Justiça e Paz (CNJP) promoveu em Lisboa, a quinta e última sessão da audição pública que, desde Novembro de 2005, dedicou a este tema. No final da iniciativa, foi apresentada uma declaração em que o organismo católico manifesta o seu apoio ao processo de “entrega voluntária de armas” previsto na nova lei do uso e porte de armas, mas exige que o Estado dê “a garantia inequívoca de que as armas legais ou ilegais recolhidas pelo Estado por entrega voluntária, apreensão, recepção ou recuperação, serão retiradas dos circuitos comerciais e, por via de regra, comprovadamente destruídas”.

“A este propósito, é de desejar que a regulamentação da nova lei sobre o uso e o porte de armas favoreça a destruição das armas e não a sua reintrodução no circuito comercial”, acrescenta a CNJP.

D. José Alves, Bispo de Portalegre-Castelo Branco e presidente da Comissão Episcopal da Pastoral Social, assegurou à Agência ECCLESIA que iniciativas como esta da CNJP são “respostas a uma necessidade real, porque estamos a viver numa sociedade em que há indícios de violência de vária ordem”.

“A Igreja preocupa-se com a paz, com a harmonia social, com uma vida de boa vizinhança e bom entendimento. Da nossa parte, temos algo a dizer sobre este problema, na medida em que os valores evangélicos apontam para uma convivência pacífica e o respeito pelas pessoas”, acrescenta, defendendo que “é preciso promover a justiça social” para melhor promover a paz e combater os focos de violência.

José Magalhães, Secretário de Estado Adjunto e da Administração Interna, explicou aos jornalistas que conta com a cooperação “concreta” da CNJP e de outros parceiros para as iniciativas de desarmamento, adiantando que proximamente sairá o diploma que vai regulamentar a entrega voluntária de armas. “As armas, nas mãos erradas, são fonte de desordem”, referiu no final da sessão.

Para a CNJP é, contudo, indispensável que esta campanha de entrega de armas “seja acompanhada por uma ampla mobilização nesse sentido por parte da sociedade civil”. “O Estado, por seu turno, deverá empenhar-se em criar um clima de confiança propício ao «desarmamento»”, acrescenta o documento.

Apelos ao Estado

Ao longo destes meses de trabalho, que continuarão no Observatório sobre a produção, o comércio e a proliferação de armas, a CNJP quis contribuir para identificar as causas e procurar soluções para o tráfico e a produção de armas ilegais em Portugal.

Desde Novembro de 2005 até agora ocorreu, neste âmbito, uma mudança significativa, com a publicação de um novo regime jurídico das armas e munições, publicado em “Diário da República” no passado dia 23 de Fevereiro e que exige, nomeadamente, garantias de segurança e formação técnica para os detentores de armas, que ficam também obrigados a possuir um seguro de responsabilidade civil.

A CNJP reagiu “com satisfação, à promulgação de uma lei que vem enquadrar o uso e o porte de armas por parte de civis”, mas também deixa o alerta para a necessidade de “criar condições de reforço da segurança pública e fomentar uma cultura generalizada de não-violência na resolução de conflitos de interesses”.

“Por mais aperfeiçoada que a lei possa ser, e por mais eficientes que sejam os mecanismos adoptados para a sua implementação, são indispensáveis instrumentos e medidas de outra natureza, que previnam as causas que subjazem aos fenómenos da proliferação das armas”, alerta a Comissão, falando em especial das condições de extrema precariedade económica e social em que, presentemente, vivem certos segmentos da população, nomeadamente nas periferias das grandes cidades.

No modo de funcionamento das sociedades democráticas, lembra a CNJP, está implícito um “Contrato Social” pelo qual o Estado assegura a ordem e a tranquilidade públicas e o cidadão, em troca, renuncia ao uso das armas para acautelar este objectivo. Em todo caso, “em matéria de segurança, é notório o incumprimento deste Contrato social por parte do Estado, embora se possa argumentar que embora se possa argumentar que a ‘prevaricação’ é generalizada e, nos casos mais graves, altamente organizada, por vezes com tentáculos transnacionais, difíceis de contornar”.

“Com idêntica preocupação de criar um clima dissuasor da proliferação de armas, entendemos que o Estado deveria assumir, pública e inequivocamente, a sua responsabilidade na luta pela erradicação da pobreza e da exclusão social, bem como o combate à grande desigualdade, dotando-se de necessária e eficiente organização e dos correspondentes meios para atingir os objectivos visados neste domínio”, pode ler-se.



Armas ligeiras?

Em todo o mundo, morrem mil pessoas por dia, atingidas pelas armas ditas ligeiras. Os dados, revelados por um estudo da Rede de Acção Internacional sobre Armas Ligeiras, mostra que as mortes ocorrem na sequência de homicídios, guerras, suicídios e acidentes.

Nesta quinta sessão, Frei Bento Domingues sustentou que as armas de defesa pessoal são “desnecessárias”, considerando que, em democracia, “a segurança é e deve ser assegurada pelas forças de segurança”.

“A cultura a promover é a da paz, da pacificação e da vida democrática, onde se resolvem por consenso os conflitos”, realçou Bento Domingues, que defendeu a necessidade de “sintonizar liberdade com responsabilidade solidária”.

O jurista e académico Pedro Bacelar de Vasconcelos, outro dos oradores da sessão promovida pela CNJP, disse que “o problema das armas não pode ser pensado fora de um ambiente de liberdade”.

Defendendo que “a democracia é o meio de resolver conflitos”, Bacelar de Vasconcelos, antigo Governador Civil de Braga, manifestou-se contra “as fobias securitárias, que não conduzem a nada”.

O director nacional da PSP, Orlando Romano, tomou a palavra para defender que “a segurança da sociedade é uma função colectiva” e não um exclusivo das forças de segurança, precisando que, em todas as situações, a actuação destas forças deve ser “proporcional” e não um factor adicional de violência.

A presidente da Comissão Nacional Justiça e Paz, Manuela Silva, incentivou “o esforço colectivo para pôr termo à crescente disseminação desregulada de armamento, com consequências graves para o desenvolvimento e para a paz”.








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