O poder devastador do pecado, e a força regeneradora do amor de Deus nas meditações
da Via Sacra de Sexta Feira Santa, no Coliseu de Roma.
A Via-Sacra no Coliseu, na noite de Sexta-Feira Santa, será presidida por Bento XVI,
contando com meditações e orações de D. Angelo Comastri, Vigário Geral do Papa para
a Cidade do Vaticano. No site WEB do Vaticano (www.vatican.va ) estão disponíveis
as meditações.
Convidam a reflectir sobre o poder devastador do pecado e, ao
mesmo tempo, levam-nos a olhar a força regeneradora do amor de Deus, visível na cruz
de Cristo”.
As 14 estações percorrem as várias etapas do sofrimento de Jesus. Duas
palavras para te acompanhar no caminho Apresentação Ao percorrer o «Caminho
da Cruz», impõem-se-nos duas certezas: a certeza do poder devastador do pecado e a
certeza do poder regenerativo do Amor de Deus.
O poder devastador do pecado:
a Bíblia não se cansa de repetir que o mal é mal porque nos faz mal; de facto, o pecado
é auto-punitivo, porque contém em si mesmo a sanção. Eis alguns textos muito elucidativos
de Jeremias: «Foram após a vaidade dos ídolos, tornando-se eles próprios vãos» (Jer
2, 5); «Sirvam-te de castigo as tuas perversidades, e de punição as tuas infidelidades.
Sabe, portanto, e vê quão funesta e amarga coisa é o haveres abandonado o Senhor teu
Deus, e teres perdido o meu temor» (Jer 2, 19); «As vossas iniquidades alteraram esta
ordem, os vossos pecados privaram-vos destes bens» (Jer 5, 25).
E Isaías não
lhe fica atrás: «Por isso, diz o Santo de Israel: “Visto que rejeitais esta palavra,
e confiais na opressão e na perversidade e nelas vos apoiais; este pecado será, para
vós, como uma fenda que forma saliência numa muralha elevada, até que de repente,
num instante, se desmorona; como se quebra uma vasilha de barro feita em cacos, sem
piedade, de modo que dos bocados não reste sequer um caco para apanhar as brasas do
braseiro, para tirar água da cisterna”» (Is 30, 12-14). E, dando voz aos sentimentos
mais genuínos do povo de Deus, o profeta exclama: «Todos nós éramos como homens impuros,
a nossa justiça como roupa manchada; murchávamos como folhas secas, as nossas iniquidades,
como o vento, nos arrastavam» (Is 64, 6).
Ao mesmo tempo, porém, os profetas
denunciavam o endurecimento do coração que gera uma cegueira terrível e impede de
notar a gravidade do pecado. Ouçamos Jeremias: «Desde o maior ao mais pequeno, todos
se entregam à ganância desonesta; desde o profeta ao sacerdote todos procedem com
dolo. Tratam com negligência as feridas do meu povo e exclamam: “Tudo bem! Tudo bem!”.
Quando nada vai bem. Deveriam envergonhar-se pelo seu procedimento abominável, mas
nem ao menos conhecem a vergonha, nem o que seja envergonhar-se» (Jer 6, 13-15).
Jesus,
entrando dentro desta história devastada pelo pecado, deixou-Se agredir pelo peso
e violência das nossas culpas: por este motivo, ao contemplar Jesus, nota-se claramente
quão devastador é o pecado e quão doente está a família humana: isto é, nós! Tu e
eu!
Mas – eis a segunda certeza! – Jesus reagiu ao nosso orgulho com
a humildade; reagiu à nossa violência com a mansidão, reagiu ao nosso ódio com o Amor
que perdoa: a Cruz é o acontecimento pelo qual o Amor de Deus entra na nossa história,
aproxima-se de cada um de nós e torna-se experiência que regenera e salva.
Não
podemos deixar de notar um facto: desde o princípio do seu ministério, Jesus fala
da «sua hora» (Jo 2, 4), uma hora «por causa da qual Ele veio» (Jo 12, 27), uma hora
que Ele saúda com alegria, exclamando ao início da sua Paixão: «Chegou a hora» (Jo
17, 1).
A Igreja guarda zelosamente a memória deste facto e no Credo, depois
de ter afirmado que o Filho de Deus «encarnou pelo Espírito Santo, no seio da Virgem
Maria, e Se fez homem», logo a seguir exclama: «Também por nós foi crucificado sob
Pôncio Pilatos, padeceu e foi sepultado».
Foi crucificado por nós! Jesus,
morrendo, embrenhou-Se na experiência dramática da morte tal como foi construída pelos
nossos pecados; morrendo, porém, Jesus encheu de Amor o morrer e, consequentemente,
encheu-o da presença de Deus: deste modo, com a morte de Cristo, a morte foi vencida,
porque Cristo encheu a morte precisamente da força oposta ao pecado que o gerou: Jesus
encheu-a de Amor!
Através da fé e do baptismo, entrámos em contacto com a morte
de Cristo, isto é, com o mistério do Amor com que Ele a viveu e venceu… e, assim,
tem início a viagem do nosso regresso a Deus, regresso que terá o seu acabamento no
momento da nossa morte vivida em Cristo e com Cristo: isto é, no Amor!
Percorrendo
o «Caminho da Cruz», deixa Maria guiar-te pela mão: pede-Lhe uma migalha da sua humildade
e docilidade, para que o Amor de Cristo Crucificado penetre dentro de ti e reconstrua
o teu coração segundo a medida do Coração de Deus.