Bispos apontam para a auto-sustentabilidade da Igreja em Angola e São Tomé
Caríssimos diocesanos, irmãos e irmãs: A paz esteja convosco!
“Honra
o Senhor com os teus haveres e com as primícias das tuas colheitas; desse modo os
teus celeiros ficarão cheios de trigo e os teus lagares transbordarão de vinho novo
(Prov 3,9-10)”.
1. Quisemos começar a nossa Mensagem Pastoral sobre
a Auto-sustentabilidade da Igreja em Angola e São Tomé com uma passagem bíblica que
contém ao mesmo tempo um preceito e uma promessa de Deus. O preceito de honrar a Deus
oferecendo-Lhe as primícias das colheitas e a correspondente promessa duma abundante
recompensa divina. Fazemos isto porque é à luz da Palavra de Deus que entendemos propor
à vossa consideração o tema, ou melhor dito, o problema da nossa auto-sustentabilidade.
Se, de facto, todos nós somos a Igreja, todos somos responsáveis, embora em graus
diferentes, da sua vitalidade espiritual e material. Por isso, este mesmo tema foi
objecto de reflexão dos Bispos das Conferências Episcopais da África Austral durante
a VII Assembleia Plenária da IMBISA, em Outubro 2004, e foi tomado o seguinte compromisso:
Como Bispos da região da IMBISA, comprometemo-nos a promover urgentemente comunidades
auto-sustentáveis nas nossas Igrejas (Mensagem Final de 14.10.2004)
2.
Uma Igreja modelo. Lê-se nos Actos dos Apóstolos que os primeiros cristãos eram assíduos
ao ensino dos Apóstolos, à união fraterna, à fracção do pão e às orações E todos os
que acreditavam viviam unidos e tinham tudo em comum. Mais adiante: A multidão dos
que tinham acreditado tinham um só coração e uma só alma entre eles tudo era em comum
e não havia nenhum necessitado (Act 2,42-44; 4,32-34). Irmãos, se no início, isto
é, logo depois de Pentecostes, a Igreja que o Espírito Santo tinha congregado aparece
naquela imagem que nos deixou o evangelista São Lucas, testemunha ocular e de absoluta
confiança, quer dizer que a essa imagem se deve conformar a Igreja de todos os tempos
e cada comunidade cristã.
Daquela imagem de Igreja, podemos realçar alguns
aspectos fundamentais. É uma comunidade nascida da fé em Cristo, regida e ensinada
pelos Apóstolos. Nela todos são assíduos à oração comum e à Eucaristia, que é o centro
unificador da Comunidade. Por isso, nela reina a união fraterna, vivem todos unidos
e repartem entre si todos os seus bens. A descrição da vida comunitária da Igreja
primitiva é admirável e muito nos impressiona. Pode-se, pois, perguntar a que era
devida semelhante realidade, em que todos os crentes viviam unidos e tinham tudo em
comum. Não era certamente o fruto de uma organização mais ou menos imposta de cima
e pensada com o fim de cimentar a coesão dos fiéis recém convertidos; era, pelo contrário,
a expressão de algo mais profundo, do ter um só coração e uma só alma. Aqueles cristãos
acreditando em Cristo e no Evangelho inspiravam-se no mandamento novo do amor e, por
isso, viviam unidos e tinham tudo em comum. O ter tudo em comum era, portanto, o fruto
mais evidente do ter um só coração, manifestando-se concretamente no repartir dos
bens de modo que não havia entre eles nenhum necessitado. Como é sabido, os bens deste
mundo foram e são destinados por vontade de Deus à satisfação das necessidades de
todos os homens sem excepção nem exclusão. Daí, a obrigação da lei moral natural da
sua justa e equitativa distribuição e da sua partilha para que ninguém seja excluído
desta mesa comum. Essa obrigação moral, dizem os Actos, era posta em prática pelos
cristãos da Comunidade de Jerusalém de modo livre e espontâneo, mas sendo animada
pelo espírito do Evangelho recebido do ensino dos Apóstolos. O repartir dos bens era,
por conseguinte, atitude cristã inspirada na Palavra do Senhor, no mandamento novo
do mútuo amor fraterno. Jesus tinha dito que a felicidade está mais em dar do que
em receber (Act 20,35) e os primeiros cristãos acharam que o modo melhor para o cumprir
era repartir os bens (cfr Paulo VI, Mensagem da Quaresma 1978). Irmãos, se foi evocada
a vida da Igreja primitiva no seu começo, significa que temos aí um modelo, um exemplo
que se deve imitar, não à letra porque a letra mata (cfr 2Cor 3,6) mas no seu significado
espiritual que é permanente. De facto, trata-se também para nós de acolher o apelo
que nos vem da Palavra de Deus, a fim de edificarmos a nossa Igreja como comunidade
de fé e de amor, unida, fraterna e solidária. Afinal, uma Igreja como FAMÍLIA DE DEUS,
segundo a feliz expressão do Sínodo para África. Expressão essa que acentua a atenção
pelo outro, a solidariedade e a partilha de recursos entre as comunidades (cfr EIA
63). É neste espírito cristão de solidariedade e partilha, que se inscreve o contributo
dos fiéis para a manutenção das obras e obreiros da Igreja, como está ordenado no
seu quinto mandamento.
3. A Igreja precisa de bens materiais Na mesma
Exortação Pós-sinodal é retomado o assunto quando se fala das Estruturas da Evangelização
de que precisa a Igreja, Família de Deus, nas Dioceses. Estas estruturas são bem conhecidas,
tais como: paróquias, seminários, escolas, centros de catequese, de pastoral juvenil,
saúde, assistência social, etc.
As referidas estruturas,faz notar o Papa requerem,
além de pessoal qualificado, meios materiais e financeiros notáveis e, não raro, as
Dioceses estão bem longe de poder dispor deles em medida suficiente. É, portanto,
urgente que as Igrejas particulares de África se proponham o objectivo de chegar a
prover elas mesmas às suas necessidades, assegurando desse modo a sua auto-suficiência
(EIA 104). Se nos fosse perguntado por que motivo trazemos, nesta nossa Mensagem Pastoral,
o tema da auto-sustentabilidade da igreja, responderíamos: é preciso fazer o que está
ao nosso alcance para que a auto-suficiência da Igreja de Angola e São Tomé se torne
uma realidade. De facto, também nós, nas nossas Dioceses e paróquias, não dispomos
de meios financeiros suficientes para poder manter as obras e o pessoal que nelas
trabalha. E se tais obras até hoje foram mantidas, foi devido a ajudas vindas do exterior.
Tais ajudas, porém, não vão continuar indefinidamente porque, aliás, os próprios doadores
nos pedem que trabalhemos para tornar auto-suficientes as nossas Dioceses e comunidades.
Por isso, até o Santo Padre nos disse que é urgente alcançar esse objectivo e que
nele nos devemos empenhar (cfr EIA 104).
4. O empenhamento para a
auto-sustentabilidade O modelo da Igreja, quer dos Actos dos Apóstolos quer da Igreja-Família
do Sínodo para África, realça com muita clareza que, na Igreja, todos os seus membros
devem assumir o seu papel activo e participativo nos diversos sectores da vida da
Comunidade. Um sector vital como vimos é o da participação dos fiéis a fim de assegurar
o auto-sustento da igreja. Falamos de participação porque o dever de edificar uma
Igreja que seja auto-sustentável pede a contribuição de todos os cristãos conscientes
da sua responsabilidade. Numa Igreja-Família, cada um recebe e dá, numa partilha de
bens espirituais e materiais: “A Igreja enquanto Família de Deus deve ser, hoje como
ontem, um espaço de ajuda recíproca” (Bento XVI, Deus é Amor, 32). No entanto, para
os fieis se lembrarem de cumprir o seu dever, temos o Quinto Preceito da Igreja que
reza assim: Contribuir para as despesas do culto e para a sustentação do clero, segundo
os legítimos usos e costumes e as determinações da Igreja. O preceito aponta aos fiéis
a obrigação de, conforme as suas possibilidades, prover às necessidades da Igreja
de forma que ela possa dispor do necessário para o culto divino, para as obras apostólicas
e de caridade e para a honesta sustentação dos seus ministros (Catecismo da I. Católica
2043). Para que haja conformidade na observância do preceito em todas as nossas dioceses
e paróquias, a CEAST exarou as seguintes normas: Em cumprimento do cânon 1262, estabelece-se
que o auxílio dos fiéis para as necessidades da Igreja seja especialmente feito com
as colectas dos domingos e festas de preceito, e com os emolumentos determinados (Directório
Pastoral 529,1). Todos os cristãos e catecúmenos têm obrigação de prestar a sua contribuição
para a evangelização, o que será individual e a começar para cada um aos 14 anos (ib
530). Trata-se da chamada CÔNGRUA ou contributo da fé.
Os cristãos e catecúmenos
pagarão uma contribuição anual correspondente a um dia de trabalho para os adultos
e, para os restantes, consoante às suas possibilidades. Tal contribuição poderá ser
entregue em dinheiro ou em géneros, segundo o preço corrente na região (ib 531). Deixa-se
às Dioceses a regulamentação desta contribuição. Pela fiel observância destas normas
da parte dos nossos cristãos sem excepção, teremos dado um passo à frente no caminho
do auto-sustento da nossa Igreja. No entanto, além dessa contribuição que nunca deverá
faltar, é oportuno que haja iniciativas particulares nas dioceses como nas paróquias,
envolvendo nelas, além do pessoal missionário, os leigos empenhados na vida das comunidades,
sobretudo se preparados em assuntos que dizem respeito a finanças e economia. Procure-se
que haja recursos materiais como fazendas, terrenos, imóveis, fundos bancários, etc.
que, se forem bem geridos, poderão tornar-se fontes de receitas para a manutenção
das obras diocesanas e paroquiais. No entanto, será preciso que pessoal do Clero como
do Laicado assuma e administre com diligência e a devida competência esses recursos
e elaborem planos concretos que visem a melhoria da situação financeira das comunidades.
Irmãos, segundo a passagem bíblica citada no começo desta Mensagem é a Deus que honramos
quando cumprimos o dever de partilha dos nossos bens a favor da Comunidade. Para o
Apóstolo Paulo é um verdadeiro serviço de fé, de caridade e como que um acto de culto
de louvor e de acção de graças a Deus. Por isso, assim exorta os seus fiéis e a nós
também: «Cada um dê como dispôs em seu coração, sem tristeza nem constrangimento,
pois DEUS AMA A QUEM DÁ COM ALEGRIA. E Deus tem poder para vos cumular de toda a espécie
de graça para que, tendo sempre e em tudo quanto vos é necessário, ainda vos sobre
para as boas obras de todo o género» (2Cor 9,7-9).
Enfim, queridos
irmãos, enquanto vos encorajamos a um empenhamento ainda maior no nosso projecto comum
de alcançarmos a auto-suficiência da Igreja, imploramos sobre todos vós a bênção de
Maria Santíssima, Nossa Padroeira.
Deus abençoe Angola e São Tomé
e nos conserve a paz!
Os Bispos Católicos de Angola e São Tomé
Responsab: Secretariado de Pastoral da CEAST