2005,ano denso de eventos eclesiais:doença e morte de João Paulo II e eleição de Bento
XVI
Janeiro 2005 iniciou com a celebração do XXXVIII dia mundial da paz, á
volta do tema não te deixes vencer pelo mal, vence antes o mal com bem. A mensagem
de João Paulo II partia de uma reflexão sobre a liberdade e a responsabilidade individuais
e projectava depois o principio sobre a dimensão social e comunitária, articulando
um conceito de cidadania mundial estreitamente ligado com o conceito de destino universal
dos bens da terra. As aplicações que daí derivam tocam evidentemente a agenda internacional
sobretudo no que diz respeito ás decisões de caracter economico : acabar com barreiras
e monopolios quando se trata de usufruir novos bens provenientes do progresso cientifico
e tecnologico, uma maior regulamentação juridica internacional como garantia dos
bens publicos ( paz, segurança, ambiente saúde ) e a luta contra a pobreza segundo
os chamados objectivos do milénio delineados pela ONU. O imperativo do dia mundial
da paz e as interrogações suscitadas pelo tsunami que atingiu o sudeste asiático a
26 de dezembro de 2004 são retomados por João Paulo II no dia 10 de janeiro no discurso
que dirige ao Corpo Diplomatico acreditado junto da Santa Sé, na tradicional audiencia
do inicio do novo ano. O Papa sublinha o facto da comunidade internacional se encontrar
diante de 4 desafios cujos simbolos são a vida, o pão, a paz e a liberdade ; eles
reflectem a questão antropologica ligada ao inicio da existencia : a injustiça economica
que alimenta o ódio entre os povos, a questão da paz que se deve vencer com as armas
da diplomacia e do direito e a da liberdade, da qual a liberdade religiosa representa
o nucleo mais intimo, porque relativo á relação mais essencial do homem, a relação
com Deus. Estão certos de actuar segundo as indicações e solicitações do Papa,
aqueles cristãos que em representação da Caritas Internacional, das caritas dos varios
paises, da igreja local brasileira, de congregações religiosas e ONG ‘S participam
de 26 a 31 de janeiro ao Forum Social mundial (WSF) de Porto Alegre, no Brasil. Envolvida
desde o inicio na WSF como plataforma de discussão economica e social tendente a mostrar
a possibilidade de um mundo diferente a Igreja partilha os seus objectivos : opções
concretas de participação democratica para um desenvolvimento humano solidário, sustentável,
sem paternalismos culturais, alternativo não só ao neo- liberismo mas também aos varios
fundamentalismos de oposição á democracia. 2005 assinala em Janeiro os 60 anos
da libertação dos prisioneiros dos campos de concentração de Auschwitz e mais adiante
os 40 anos da promulgação da declaração Nostra aetate que de facto abriu caminho
ao diálogo entre judeus e catolicos. O Papa, que chamou os judeus « irmãos maiores »
e depôs no Muro ocidental de Jerusalém o pedido de perdão da Igreja, pelo ódio,
os actos de perseguição e as manifestações de antisemitismo dirigidos contra os judeus
por cristãos de todos os tempos e lugares » não podia deixar de sublinhar os dois
aniversarios ; fá-lo publicando uma mensagem, enquanto que no dia 25 o arcebispo Celestino
Migliore intervem em nome da Santa Sé nas Nações Unidas. Fevereiro A
preocupação pela saúde João Paulo II acompanhou de maneira continuada o seu pontificado
desde 1994, ano da fractura do femur.No inicio deste mês contudo inicia aquela dramática
sequencia de acontecimentos ligados á saude de Karol Wojtyla que em menos de noventa
dias o levará á morte, e á eleição de Bento XVI e que praticamente irá absorver em
si, durante três meses, os acontecimentos mais salientes da actividade da Santa Sé. São
dois os mais importantes actos oficiais tornados publicos no espaço de tempo que
passa entre os dois internamentos de João Paulo II, o primeiro dos quais devido a
uma gripe complicada com uma laringo-traqueite aguda e crises de laringo-espasmo que
o obrigará por isso a dar entrada na Policlinica Gemelli, visto que o Papa não conseguia
respirar. O primeiro desses acontecimentos é a carta aos bispos da França por ocasião
do centenário da aprovação da lei sobre as relações estado-Igreja ainda hoje em vigor.
Publicada no dia 12 de fevereiro desenvolve em sete pontos uma leitura da laicidade
do estado em positivo como o âmbito para o diálogo constructivo no espirito dos valores
da Revolução francesa. O segundo acto oficial é a carta apostolica « O rápido
desenvolvimento » que celebra, embora tarde, o 40º aniversario do decreto conciliar
Inter Mirifica dedicado aos meios de comunicação social, e que é apresentada no dia
21. O texto que fala de comunicação social tanto do ponto de vista cultural como
teologico, confirma que a partir do Concilio se tornou mais positivo o olhar da Igreja
sobre estes « maravilhosos » instrumentos, que nos ultimos 40 anos ofereceram
oportunidades crescentes á formação, participação e diálogo, embora persista ainda
uma ambivalencia de fundo que invoca um assumir de responsabilidades da parte dos
cristãos para salvaguardar a centralidade da pessoa humana e da sua dignidade. O
mês de fevereiro regista também a morte de duas personalidades da Igreja muito ligadas,
por razões diferentes, a João Paulo II : a Irmã Lúcia, a última vidente de Fátima,
no dia 13, e Mons. Luis Giussani, fundador de Comunhão e Libertação, no dia 22.A primeira
foi interlocutora vivente de uma devoção da qual o Papa foi testemunha explicita e
singular, tendo lido em chave pessoal uma das visões da Irmã Lúcia e tendo-a ligado
ao atentado que ele sofreu na Praça de São Pedro, a 13 de maio de 1981, tendo decidido
torná-la pública a 13 de maio de 2000.O segundo é um daqueles homens de Igreja que
depois do Concilio, para responder ás exigencias de renovação eclesial,inventeram
novas formas de agregação, mais flexiveis, prevalentemente dirigidas aos leigos, e
que complexivamente encontraram uma grande estima em João Paulo II. A provar esta
proximidade , está o facto de João Paulo II ter estado representado no funeral da
Irmã Lúcia e de Mons. Giussani, na pessoa dos cardeais, Tarcisio Bertone em Portugal
e José Ratzinger em Milão. Março O internamento de João Paulo II até
ao dia 13 assinala á Igreja e ao mundo a possibilidade da longa batalha do Papa com
a doença ter entrado numa fase, para ele critica. Um facto que se pode observar com
maior clareza quando após o regresso ao Vaticano, já não se pode ouvi-lo falar em
público, não obstante as repetidas tentativas nesse sentido. Para de qualquer maneira
se tornar presente na tradicional Via Sacra no Coliseu de Roma, no dia 25, as câmaras
da televisão mostram-no ao mundo inteiro, de costas, na sua capela privada, tendo
á sua frente um grande ecran televisivo que lhe restitui as imagens da procissão guiada
pelo cardeal Camillo Ruini e as palavras das meditações escritas, a seu pedido, pelo
Card. José Ratzinger. À parte esta da Sexta Feira Santa, assiste-se a uma série
de aparições « mudas » da janela dos seus aposentos no Palacio Apostolico, quando
qualquer tentativa de articular a palavra se resolve num sospiro, e não lhe resta
senão o gesto da mão direita que abençoa ou que cobrindo o rosto manifesta todo o
seu abatimento. Assim, no dia 20, Domingo de Ramos, quarta feira dia 23 e ainda no
dia 27, Domingo de Páscoa ( 13 minutos com nas mãos o texto da sua mensagem pascal
que na Praça de S. Pedro é lida pelo cardeal Secretario de Estado Angelo Sodano) e
finalmente quarta feira dia 30 : uma imagem aflitiva que todos os noticiários televisivos
e os jornais publicam na primeira página e que permanece a última que temos do Papa
vivo. No dia seguinte pouco depois das 11 horas, o Papa, na capela para a celebração
da Santa Missa é colhido por um arrepio devastador, ao qual se segue uma subida de
temperatura com febre a 39,6º. É uma complicação, bastante temida para os doentes
como ele, uma infecção das vias urinárias, com gravissimo schock séptico e colapso
cardiocirculatório. Mas não se decide pelo terceiro internamento no arco de dois meses :
João Paulo II manifesta a vontade de permanecer na sua habitação. Para a opinião pública
é o sinal inequivocável do aproximar-se da sua morte , e o mesmo se diga para o Papa,
que manifesta a decisão exemplar de querer morrer em sua casa. Abril Alimentada
por um excepcional trabalho dos serviços de informação do Vaticano, e lançada na evidente
e cinica espera da noticia, daquela única noticia que se sabia teria chegado brevemente,
repentinamente coloca-se em movimento uma gigantesca maquina informativa que as grandes
agencias, as redes de televisão internacionaie e os maiores diários tinham preparado
desde há anos. O dia 1 de abril, com três declarações do director da Sala de Imprensa
da Santa Sé, vê o Papa sempre consciente, concelebrar a Santa Missa, seguir a leitura
da Via Sacra, rezar a Liturgia das Horas, receber os colaboradores mais estreitos.
È muito sereno. Mas á noite as suas condições gerais e cardio-respiratorias agravam-se
ulteriormente ao ponto que se difunde- dos ambientes do Vaticano aos cronistas, e
ao imenso auditorio radiotelevisivo- a convicção que dificilmente João Paulo irá superar
a noite. O que sucede é que, em condições gravissimas, o estado de consciencia
começa a estar comprometido, passa também o dia 2. Às 7h30 é celebrada na sua presença
a Missa, e no fim da manhã recebe a visita do Cardeal Sodano. Por volta das 15h30
com voz mutissimo débil e palavras quase incompreensiveis , em polaco pede : »deixem-me
ir para a casa do Pai ».Entra em estado de coma antes das 19 horas : segundo uma
tradição polaca uma pequena vela acesa ilumina a penumbra do quarto. Ás 20h00 o secretário
D. Dziwisz, o Card. Jaworski, Mons. Rylko e Mons. Mokrzycki celebram aos pés da cama
do Papa que está morrendo a missa da festa da Divina Misericordia. As 21h37 João Paulo
II adormece no Senhor : com 84 anos e 10 meses, e sobre os seus ombros 26 anos e meio
de pontificado. Cabe aqui referir o que a cidade de Roma viveu entre o 2º e o 8º
dias das exéquias de João Paulo II. Tres milhões de peregrinos, que enfrentaram com
ordem filas de 13 horas para conseguir testemunhar, ao ritmo de 21.000 cada hora,
a sua participação nos pesames, e prestar a sua homenagem a um homem e pastor que
amaram. Mas também 6.000 jornalistas acreditados, 137 redes de televisão a transmitir
directamente o funeral, 1.300.000 utentes a visitar o site www.vatican.va.
Os dois fenomenos, a participação fisica e a participação mediada pelos instrumentos
da comunicação de massa, configuram nestes dias uma opinião publica de luto ; a partilha
de um grande, colectivo sentido de perda, de separação, proporcional ao grande carisma
de Karol Wojtyla. A 18 de abril os 115 cardeais eleitores entram em Conclave para
eleger um novo Papa, o que acontece no dia 19 ; é eleito o Cardeal José Ratzinger,
desde 1981 prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé como 264º sucessor de São
Pedro, assumindo o nome de Bento XVI. « Gratia copiosa et pax vobis » é
o inicio da mensagem com a qual na manhã do dia 20 se dirige aos cardeais que o elegeram ;
uma mensagem que ele proprio qualificará em seguida, em sentido programático. Nela
estão sublinhados 5 pontos : a comunhão colegial que deve unir o Papa e os bispos,
o Concilio Vaticano II como bussula , a Eucaristia como fulcro da missão, o ecumenismo
como empenho primário, a vontade de prosseguir o diálogo das civilizações. Quando
Bento XVI celebra no domingo dia 24, a Missa de inicio do Ministério petrino, dedica
a homilia á explicação e valorização dos dois sinais que caracterizam a celebração.
A imposição do sagrado pálio como imagem do jugo de Cristo, da vontade de Deus que
o novo Papa acolhe e ao mesmo tempo simbolo tanto da missão do pastor que carrega
sobre os ombros a humanidade perdida e de um Deus que se faz ele proprio cordeiro,
que dá a vida pelas ovelhas, que redime não com o poder mas com o amor. E o anel do
pescador como sinal que também hoje é dito á Igreja e aos bispos :…no mar da historia…lançar
as redes para tirar os homens do mar salgado de todas as alienações para os trazer
para a terra da vida, para a luz de Deus ». Finalmente o novo Papa dedica a
primeira audiencia geral de 27 de abril a explicar o motivo do nome que escolheu :
Bento. A referência é dupla : a Bento XV que guiou a Igreja num periodo atormentado
por causa da primeira guerra mundial a significar um ministerio ao serviço da reconciliação
e da harmonia entre os homens e os povos : a São Bento de Nursia enquanto « ponto
de referencia fundamental para a unidade da Europa e uma forte chamada ás irrenunciáveis
raizes cristãs da sua cultura e da sua civilização ». Da devota memoria do
grande Papa falecido á enfase sobre a relação entre Pedro e Cristo ; do empenho pela
paz á defesa da identidade cultural cristã da Europa : a sucessão das intervenções
que precedem e seguem imediatamente a eleição, serve mais do que qualquer outra hipotese
interpretativa a explicar o processo que levou o Colegio cardinalicio a fazer cair
sobre o seu Decano a escolha do novo Papa, que junta á absoluta ortodoxia doutrinal
a experiencia extraordinaria dos problemas da Igreja, amadurecida durante o pontificado
de João Paulo II. Maio A primeira e até agora mais importante decisão
de governo do novo Papa foi tornada pública no dia 13, e refere-se á nomeação do seu
sucessor como prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé. A escolha caiu sobre
William J. Levada, estadunidense de origem portuguesa, 69 anos, arcebispo de São Francisco
desde 1995.O primeiro americano que assume uma tão elevada responsabilidade na Curia
Romana, a significar a convicção de Bento XVI que a experiencia amadurecida na Igreja
e na sociedade dos Estados Unidos, isto é nas fronteiras da modernização possa resultar
decisiva para o catolicismo no seu complexo. No dia 14 celebram-se em São Pedro
as primeiras beatificações do novo pontificado, mas não são presididas por Bento XVI
mas sim, pelo seu delegado o Cardeal D. José Saraiva Martins, prefeito da Congregação
para as Causas dos Santos. Com esta decisão deseja-se sublinhar a diferença substancial
entre uma beatificação ,em que o Papa concede o culto publico numa forma indultiva
e territorialmente limitada, e uma canonização que atribui ao beato o culto na Igreja
inteira. Deseja-se envolver mais visivelmente as Igrejas particulares nos ritos de
beatificação dos respectivos Servos de Deus, que contudo se efectuarão normalmente
na diocese que promoveu a causa do novo beato. E segundo esta nova linha a 23 de Outubro
Bento XVI celebrará as primeiras canonizações do seu pontificado : em São Pedro proclamará
Santos Felice de Nicosia, G. Catanoso, J. Bliczewski, Z. Gorazdowski e A Hurtado
Cruchaga. Junho O empenho primário que Bento XVI quer reservar á promoção
da unidade entre os cristãos encontra uma confirmação no dia 16 quando encontra o
secretário do conselho ecuménico das Igrejas (CEC) Samuel Kobia. Nos discursos oficiais,
ambos recordam os 40 anos do Grupo misto de trabalho catolicos-CEC, e renovam a vontade
de uma colaboração cada vez mais fecunda, em particular nos três âmbitos da espiritualidade,
da formação ecumenica e da reflexão eclesiologica. Vai também na mesma direcção a
visita oficial do Cardeal Walter Kasper a Moscovo de 20 a 23, para consolidar a retomada
das relações entre a Santa Sé e a Igreja ortodoxa russa, iniciada em 2004. No dia
24 Bento XVI efectua uma visita ao Presidente da Republica italiana C.A. Ciampi.
É a primeira visita oficial a um chefe de estado a salientar os laços particulares
existentes entre o bispo de Roma e a Italia. Ciampi reafirma a necessária distinção
entre o credo religioso de cada um e a vida da comunidade civil regulada pelas leis
da Republica e o Papa reconhece como legitima uma sã laicidade, isto é uma laicidade
que não exclua as referencias éticas que encontram o seu fundamento na religião para
depois concluir insistindo na importancia dos temas da escola, da familia e da bioética. No
dia 28 é apresentado o Compendio do Catecismo da Igreja Catolica, fruto de uma iniciativa
que Bento XVI, quando ainda era cardeal tinha patrocinado junto de João paulo II que
por sua vez lhe tinha confiara a direcção. Trata-se de uma sintese fiel e segura
do Catecismo da Igreja Catolica ; um vademecum redigido em dois anos, como resposta
á exigencia de um texto autorizado, seguro, completo acerca dos aspectos essenciais
da fé da Igreja, aprovado pelo Papa e destinado á Igreja inteira. Julho No
dia 7, o terrorismo manifesta-se com grande violencia na cena internacional com uma
série de atentados de matriz fundamentalista que atingem o centro da cidade de Londres,
no momento em que em terra britânica decorre a cimeira anual dos « G8 ». Mais de 60
os mortos, 700 os feridos, e o sentimento difuso que , a partir de 11 de setembro
de 2001, os terroristas têm na sua mira não só um país ou continente ,mas complexivamente
o Ocidente secularizante : « têm o terror de perder a sua imagem de Deus e expalham
terror ; temem o multiculturalismo como uma ameaça ás suas sociedades e têm como objectivo
um choque neo-integralista das civilizações ».Em Londres, cristãos das principais
Igrejas, judeus e muçulmanos assinam um documento conjunto que condena os atentados
e defende a causa da paz e do diálogo. Agosto Dia 16, quando encontra
2.500 jovens para as Vésperas na igreja da reconciliação, o Irmão Roger Shutz, fundador
da Comunidade monástica ecumenica de Taizé é agredido e assassinado por uma mulher
romena de 36 anos. Tinha 90 anos. « Fidelidade á Palavra de Deus, enraizamento
na propria Igreja » eram as normas que em finais do anos quarente, colocara na
base da sua iniciativa de repropor ás Igrejas nascidas da reforma uma experiencia
monástica ; uma iniciativa que cresceu ao ponto de se transformar num simbolo e encruzilhada
da procura da unidade dos cristãos, vivida com autentica paixão. A emoção pela
sua morte foi ainda maior pelo facto de ter ocorrido no mesmo dia da abertura em Colónia
da XX jornada mundial da juventude (JMJ) . Esta JMJ, articulada em cinco dias, entra
no rubro no dia 18 com a chegada de Bento XVI, que nesta sua primeira viagem confirma
a capacidade de fazer coexistir em si harmoniosamente e em termos de continuidade
o seu estilo pessoal e o ministério do seu predecessor. Setembro De 14
a 16 efectua-se em Nova Iorque a assembleia geral das Nações Unidas que celebra o
seu 60 º aniversario. O cardeal Secretário de Estado Angelo Sodano faz uma intervenção
precisamente no dia 16 avaliando positivamente a instituição de uma comissão para
a construção da paz, sobretudo para a prevenção dos conflitos de origem etnica, e
defende o principio da intervenção humanitarária no direito internacional.Mais ou
menos nos mesmos dias, de 13 a 17 efectua-se em Roma um encontro internacional sobre
« a Sagrada Escritura na vida da Igreja, com o qual a federação biblica católica e
o conselho pontificio para a promoção da unidade dos cristãos, que são os organizadores
desejam celebrar o 40º aniversario da constituição dogmática do concilio vaticano
II sobre a revelação divina Dei verbum. O objectivo consiste em traçar um balanço
conscientes de que, com as palavras iniciais da Dei Verbum, »ouvindo religiosamente
a Palavra de Deus e proclamando-a com confiança, o Concilio queria resumir a essencia
da Igreja, na sua dupla dimensão de escuta e de proclamação. »( card. Kasper). O
colóquio entre Bento XVI e o teólogo Hans Kung, no dia 24 em Castelgandolgo faz
parte da lista de « surpresas » destes primeiros meses de pontificado. Outubro Com
o titulo : »A Eucaristia : fonte e ápice da vida e da missão da Igreja », efectua-se
em Roma de 2 a 23 a XI assembleia geral ordinaria do sinodo dos bispos. Como o Compendio
do Catecismo e a JMJ de Colonia, este Sinodo entra no ambito das iniciativas promovidas
ou iniciadas por João Paulo II e concluidas pelo seu sucessor. A expectativa que rodeia
este evento tem pelo menos duas raizes : as discussões em matéria de reforma liturgica
que voltaram a intensificar-se nos ultimos anos ; e os pedidos acerca do funcionamento
desta instituição sinodal, contidos segundo alguns, na referencia programática de
Bento XVI á comunhão colegial. Sobre o primeiro ponto o sinodo reafirma que o Concilio
Vaticano II lançou as bases necessárias para uma renovação litúrgica autentica. Portanto
é necessário cultivar os frutos positivos e corrigir os abusos que se infiltraram
na pratica, sem voltar atrás mas também sem perspectivar inovações sobre questões
como as celebrações na ausencia de sacerdote, a ordenação de « viri probati » casados,
a comunhão a divorciados que se casaram de novo, a intercomunhão e a concelebração
ecumenica. Sobre o segundo, a assembleia experimenta com algumas incertezas sobre
a modalidade, o debate livre ( uma hora por dia) e decide, pela primeira vez, a publicação,
em versão provisoria, oficiosa e não oficial, das 50 proposições conclusivas, que,
juntamente com outro material produzido pelo sinodo são submetidas ao Papa. Entrelaçados
ao sinodo, como já aconteçera às exéquias de João Paulo II, verificam-se desenvolvimentos
nas relações entre a Santa Sé e a Republica Popular da China. Bento XVI de facto tinha
incluido entre os padres sinodais de nomeação pontificia 4 bispos chineses escolhidos
em coerencia com a vontade de considerar como única a comunidade catolica chinesa
para além da pertença á Igreja patriotica (reconhecida pelo governo) ou á Igreja subterrânea
( não reconhecida). O governo chinês não permitiu aos quatro a deslocação a Roma,
mas a afirmação da unidade da Igreja local e da legitimidade de grande parte dos seus
pastores ( incluindo os « patrióticos ») efectuada por D. Lin Chi-Nan, as cartas que
três dos convidados enviaram ao Papa, a saudação que o Sinodo lhes dirigiu no dia
22. a recordação final do Papa e as sucessivas afimações possibilistas do Secretário
de Estado do Vaticano e do porta-voz do Ministério dos Negócios Extrangeiros Chinês
parecem deixar entrever que não deveria estar longe a solução da « questão chinesa ». E
enquanto decorre o Sinodo Bento XVI recebe no dia 14 o Cardeal Errázuriz, presidente
do Celam, e estabelece o lugar e a data da proxima grande assembleia sinodal católica :
a V conferencia geral do episcopado latino-americano. Será em maio de 2007 no Brasil,
junto do Santuário de N. Sr.a Aparecida e poderá ser inaugurada pelo Papa. Bento
XVI que tomou pessooalmente esta decisão, já tinha aprovado em Julho o tema da Conferencia : »Discipulos
e missionários de Jesus Cristo para que os nossos povos tenham a vida nEle. Eu sou
o Caminho, a Verdade, e a Vida »(Jo 16,6) Juntamente com a constituição Dei
Verbum, é a declaração Nostra aetate sobre as religiões não cristãs, o outro documento
conciliar, entre os muitos promulgados em 1965, que cataliza, em finais de 2005, as
manifestações em vista do 40º aniversario do encerramento do Concilio Vaticano II.
No dia 27 efectua-se em Roma um acto comemorativo organizado pela Comissão para as
relações religiosas com o judaismo, no qual tomam a palavra o presidente da comissão,
Cardeal Kasper, o Cardeal Lustiger, arcebispo emérito de Paris e o rabino David Rosen
responsável para os assuntos interreligiosos da Americam Jewish Comittee. Bento XVI
que já no dia 15 recebera em audiencia no Vaticano os dois rabinos – chefe de Israel,
envia ao card. Kasper uma carta na qual salienta o empenho a levar por diante o diálogo
ebraico-cristão como uma firme determinação expressa desde os primeiros dias do seu
pontificado, e em particular visitando em agosto a sinagoga de Colonia. »A pregação
e a catequese devem empenhar-se a garantir que as nossas relações reciprocas se apresentem
á luz dos principios estabelecidos pelo Concilio ». Novembro 23 bispos
da Igreja catolico-caldeia reunem-se em Roma, em sinodo especial de 8 a 12 de Novembro.
São os pastores da grande maioria dos católicos presentes no Iraque : de 350.000 a
600.000 fiéis com uma erosão continua devido á emigração. A sua tarefa, como recordou
Bento XVI recebendo-os em audiencia no dia 12 é a aprovação de uma reforma litúrgica
em rito sirio-oriental, juntamente com a análise de um esquema de direito particular
que deverá regulamentar a vida interna das comunidades iraquianas. Mas o futuro
da minoria católica iraquiana é evidentemente ligada ás incertezas que continuam a
envolver o país : no dia 25 de outubro foi aprovada ,através de referendo, a nova
Constituição : ela representa um outro passo em frente para a normalização do país,
mas cont~em elementos que os bispos caldeus consideram preocupantes : sobre a relação
da sharia com a democracia, na referencia aos cristãos como grupo etnico-cultural
e não religioso, sobre alguns aspectos da liberdade religiosa. O ano no qual chegou
ao fim o longo pontificado de João Paulo II chega á sua conclusão. Um ano irrepetivel
pela intensidade da participação com a qual foram vividos tanto a passagem de «di
vita in vita » de Karol Wojtyla, como a escolha dos cardeais de um sucessor á
altura da herança. Nos meses seguintes, á participação substitui-se a expectativa :
o que fará o novo Papa ? Como actuará as linhas programáticas expostas logo após a
eleição ? Qual será a continuidade e qual a discontinuidade que marcará Bento XVI
em relação a João Paulo II ? Um expectativa centrada já nas palavras que dedicou ao
40º aniversário do encerramento do Concilio Vaticano II ( dia 8 de dezembro ), naquelas
proferidas na sua mensagem de Natal ; nas que acompanharão a celebração do seu primeiro
dia mundial da paz, a 1 de janeiro de 2006, dedicado ao tema « na verdade a paz » ;
mas sobretudo naquelas contidas na sua primeira enciclica, dedicada ao amor de Deus,
e que será publicada,quase certamente no proximo mês de Janeiro.