2005-08-14 16:02:58

Bento XVI escolheu a Rádio Vaticano para dar a sua primeira entrevista.Igreja ,crise de valores, ecumenismo são alguns dos temas abordados.Faz votos que a jornada mundial da juventude possa dar um novo impulso á Europa.


Bento XVI faz votos que a jornada mundial da juventude possa dar um novo impulso ao velho continente. Na primeira entrevista do seu pontificado, concedida á Rádio Vaticano, a poucos dias da jornada mundial da juventude de Colónia Bento XVI formulou votos que ela possa dar um novo impulso á Europa.

A ideia muito difundida - afirma o Papa - é que os cristãos devem observar uma imensidade de mandamentos, proibições e que se é muito mais livres sem estes fardos. Pelo contrário – acrescenta - eu desejaria esclarecer que, ser sustentados por um grande Amor não é um fardo, e que é belo ser cristãos.

A primeira entrevista do Papa desde o inicio do seu pontificado foi realizada no Palácio Apostólico de Castelgandolfo pelo responsável do programa alemão da Rádio Vaticano o jesuíta Padre Eberhard v.Gemmingen, e transmitida integralmente neste domingo na sua versão original em alemão.

Além do tema dos jovens Bento XVI enfrenta outros de grande actualidade como a vida da Igreja em relação com a sociedade contemporânea, a crise dos valores, a sabedoria da fé, a “juventude” da Igreja passados dois mil anos, o empenho ecuménico

Falando das raízes cristãs da Europa, Papa Ratzinger formula votos que a JMJ de Colónia possa dar “um novo impulso ao velho Continente.

Interpelado sobre a mensagem especifica que quer levar aos jovens que do mundo inteiro se vão deslocar a Colónia; qual é a coisa mais importante que deseja transmitir-lhes? Bento XVI respondeu :

“Desejaria fazer-lhes compreender que é belo ser cristãos! A ideia genericamente difundida é que os cristãos devem observar uma imensidade de mandamentos, proibições, princípios e coisas semelhantes e que portanto o cristianismo é algo fatigante e opressivo para ser vivido, e que se é muito mais livres sem todos estes fardos. Pelo contrário eu desejaria que fosse bem claro que ser sustentados por um grande Amor e por uma revelação não é um fardo mas são asas e que é belo ser cristãos. Esta experiência dá-nos a amplitude, dá-nos sobretudo a comunidade, isto é o facto de que como cristãos nunca estamos sozinhos: em primeiro lugar, Deus está sempre connosco; e depois nós, entre nós, formamos sempre uma grande comunidade, uma comunidade a caminho que tem um projecto para o futuro: tudo isto faz com que vivamos uma vida que vale a pena viver. A alegria de ser cristão: é belo e é justo também acreditar!”

RV- Santo Padre, ser Papa significa ser construtor de pontes – pontifex precisamente. A Igreja está apoiada numa sabedoria antiga, e sua santidade vai agora encontrar uma juventude que certamente tem tanto entusiasmo, mas no que diz respeito á sabedoria tem muito caminho para percorrer….Como é possível construir uma ponte entre esta sabedoria antiga incluindo a do Papa que tem uma certa idade e a juventude? Como é que se faz?

Bento XVI – “Vamos a ver quanto é que o Senhor está disposto a ajudar-me, nesta obra! Contudo a sabedoria não é aquela coisa que tem um pouco sabor a bafio. Sobretudo eu penso que a sabedoria é a compreensão daquilo que é importante, o olhar que colhe o essencial. É obvio que os jovens devem ainda aprender a viver a vida, querem descobri-la sozinhos, não querem a “sopinha feita”.E há aqui uma certa contradição. Porém ao mesmo tempo a sabedoria ajuda a interpretar o mundo que é sempre novo porque, embora em contextos novos, leva sempre e contudo ao essencial e á maneira como depois o essencial pode ser posto em pratica. Neste sentido penso que falar, acreditar e viver, partindo de algo que foi doado á humanidade e lhe acendeu luzes, não seja uma “sopinha pronta, bafienta” mas seja pelo contrario algo que é adequado precisamente á dinâmica da juventude que pede coisas grandes e totais. Esta é precisamente a sabedoria da fé: não o facto de reconhecer uma grande quantidade de pormenores, pelo contrário uma característica necessária para uma profissão, mas reconhecer para além de todos os pormenores, o essencial da vida, como ser Pessoa, como construir o futuro”.

RV/ Sua Santidade disse, e esta sua afirmação foi retomada: “a Igreja é jovem”, não é uma coisa velha. Em que sentido?

Bento XVI –“Para começar em sentido estreitamente biológico, porque a ela pertencem muitos jovens; mas ela é também jovem porque a sua fé brota da fonte de Deus, portanto precisamente da fonte da qual vem tudo aquilo que é novo e renovador. Portanto não se trata de uma sopa refeita, aquecida, que nos é proposta desde há dois mil anos. Porque o próprio Deus é a origem da juventude e da vida. E se a fé é um dom que vem dele - é a água fresca que nos é dada sempre – aquela que depois nos permite viver e que depois nós, da nossa parte, podemos introduzir como força vivificadora nas estradas do mundo, e então quer dizer que a Igreja tem a força de rejuvenescer .Um dos Padres da Igreja, observando a Igreja, considerava que com o passar dos anos, surpreendentemente ela não envelhece mas torna-se cada vez mais jovem, porque ela vai cada vez mais ao encontro daquela fonte da qual brota a juventude, a novidade, o revigoramento, a força fresca da vida”.

RV/ Sua Santidade conhece muito bem a Igreja alemã. Uma das questões fundamentais é o ecumenismo, a unidade da Igreja sobretudo entre a Igreja católica e as Igrejas evangélicas. Talvez exista também a esperança utópica que a JMJ possa imprimir um impulso ao ecumenismo. Que lugar reveste o ecumenismo em Colónia?

Bento XVI – “Existe enquanto a tarefa da unidade permeia a realidade da Igreja e não é uma tarefa qualquer, que está á margem. Quando depois a fé é vivida e tratada de maneira central, ela própria representa um impulso para a unidade. Obviamente o diálogo ecuménico como tal não está na ordem do dia em Colónia, porque Colónia é substancialmente um encontro entre jovens católicos do mundo inteiro e também com aqueles jovens que não são católicos mas que querem saber se junto de nós podem encontrar uma resposta ás suas perguntas. Portanto penso que esta dimensão do ecumenismo possa estar presente sobretudo nos encontros entre os jovens: os jovens não falam só com o Papa mas substancialmente encontram-se também entre si. Eu terei um encontro com os nossos irmãos evangélicos: infelizmente não teremos muito tempo porque o programa do dia é muito denso; mas será suficiente para reflectir sobre a maneira como queremos caminhar para a frente. Recordo muito bem e com prazer a primeira visita de João Paulo II á Alemanha: em Maguncia estavam sentados á mesma mesa, ele e os representantes da Comunidade evangélica, a reflectir sobre a maneira de proceder. Após aquele encontro foi instituída aquela Comissão da qual veio depois a Declaração de Augusta sobre a Justificação. Penso que é muito importante que tenhamos sempre, constantemente presente a unidade, precisamente na centralidade do ser cristãos e não só por ocasião de determinados encontros; por isso, qualquer coisa que possamos fazer a partir da nosso fé terá sempre um significado ecuménico”.

RV/Santidade, infelizmente precisamente nos nossos países ricos do Norte, manifesta-se um afastamento da Igreja e da fé em geral, mas sobretudo da parte dos jovens. Como é que nos podemos opor a esta tendência? Ou melhor, como é que se pode dar uma resposta á procura do sentido da vida- “Que sentido tem a minha vida? – da parte dos jovens para fazer com que os jovens digam: Eis o que faz para mim: é a Igreja ?

Bento XVI –“Obviamente todos estamos a procurar apresentar o Evangelho aos jovens de maneira que eles compreendam: “Eis a mensagem que esperavam”! Também é verdade que na nossa sociedade ocidental moderna existem muitos pesos que nos afastam do cristianismo; a fé aparece muito distante, também Deus aparece distante…a vida pelo contrário cheia de possibilidades

e de tarefas…e tendencialmente o desejo dos jovens é aquele de ser donos da própria vida, de vivê-la no máximo das suas possibilidades…Penso no Filho Pródigo que considerava aborrecida a sua vida na casa paterna: Quero viver a vida até ao fundo, gozá-la até ao fundo! E depois dá-se conta que a sua vida está vazia e que na realidade era livre e grande precisamente quando vivia na casa de seu pai. Porém penso que entre os jovens se esteja também a difundir a sensação que todos estes divertimentos que são oferecidos, todo o mercado construído sobre o tempo livre, tudo aquilo que se faz, que se pode fazer, que se pode comprar e vender, depois no fim, não pode ser tudo. Em qualquer lado deve haver algo mais. Eis então a grande pergunta. Portanto o que é essencial? Não pode ser tudo aquilo que temos e podemos comprar. Eis então o chamado mercado das religiões, que porém de uma certa maneira volta a oferecer a religião como mercadoria e portanto degrada-a, certamente. No entanto indica que existe um pedido. Agora é necessário reconhecer este pedido e não ignorá-lo, não evitar o cristianismo como algo concluído e suficientemente experimentado, e contribuir para que possa ser reconhecido como aquela possibilidade sempre fresca, precisamente porque originada por Deus, que esconde e revela em si dimensões sempre novas…Na realidade o Senhor diz-nos:” O Espírito Santo introduzir-vos-á em coisas que hoje não posso dizer-vos”. O cristianismo está cheio de dimensões ainda não reveladas e mostra-se sempre fresco e novo, se a pergunta é feita do fundo do coração; num certo sentido, a pergunta que já se encontra com a resposta que vivemos e que nós próprios, precisamente através daquela pergunta, recebemos sempre de novo. Este deveria ser o evento no encontro entre o anúncio do Evangelho e o ser jovens”.

RV/ Tenho a sensação que a Europa está a renunciar a si própria, aos seus valores, àqueles valores fundados no cristianismo e também aos valores humanos, que estes contam cada vez menos. Nós europeus vivemos com um certo cansaço, enquanto que por exemplo chineses e indianos mostram uma grande vitalidade. Falamos de raízes cristãs referindo-nos também ao Tratado constitucional da União Europeia. A Europa está em crise. Agora, um acontecimento como a jornada mundial da juventude na qual está previsto que participe cerca de um milhão de pessoas, pode dar um impulso a procurar as raízes cristãs, sobretudo da parte dos jovens, para que possamos todos continuar a viver de maneira humana?

Bento XVI – “É o que desejamos, porque precisamente um encontro do género, entre pessoas que chegam de todos os continentes, deveria dar um impulso novo também ao velho continente que o hospeda; deveria ajudar-nos a não olhar apenas para o que há de doente, de cansado, de não realizado na historia europeia - não esqueçamos que nos encontramos numa fase de auto-comiseração e auto-condenação. Mas em todas as historias houve algo de doente, embora na nossa, que também desenvolveu possibilidades técnicas tão grandes, isso assuma um significado ainda mais dramático. Diversamente não seria possível, hoje, que o mundo inteiro vivesse de certa maneira, da civilização que se desenvolveu na Europa, se esta civilização não tivesse raízes muito profundas! Hoje nós temos somente estas para oferecer; acontece pelo contrário que recolhendo esta civilização, com todos os seus perigos e as suas esperanças, possa ser dominada e conduzida á sua grandeza somente se ela aprender a reconhecer as fontes da sua força; se conseguirmos de novo ver aquela grandeza de maneira que restitua a orientação e a importância á possibilidade de ser Homem, tão ameaçada; se conseguirmos de novo alegrarmo-nos pelo facto de vivermos neste continente que determinou as sortes do mundo - no bem e no mal. É precisamente por isso que nós temos o dever constante de redescobrir a verdade, a pureza, a grandeza e determinar o seu futuro, para nos colocarmos de uma maneira nova e talvez melhor, ao serviço da humanidade inteira”.

RV - Uma ultima pergunta. O objectivo ideal que se deve atingir com a jornada mundial da juventude de colónia: no caso que tudo corresse bem, da melhor maneira…..

Bento XVI –“Certamente que sopre um vento de nova fé sobre a juventude, sobretudo sobre a juventude da Alemanha e da Europa. Na Alemanha existem ainda grandes instituições cristãs, os cristãos fazem ainda muitas obras boas, mas existem também tantos sinais de cansaço . Estamos de tal maneira empenhados a resolver questões estruturais que nos faltam depois o entusiasmo e a alegria que brotam da fé. Se este vento conseguisse fazer reviver em nós a alegria de conhecer Cristo, e conseguisse dar um novo impulso á Igreja que está na Alemanha e na Europa inteira, penso que poderíamos dizer que a jornada mundial da juventude conseguiu o seu objectivo.








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