Episcopados da UE recusam abandono do projecto europeu: resultados na França e Holanda
requerem discernimento comum.
A Comissão dos Episcopados da UE (COMECE) lançou nesta sexta feira dia 3 um apelo
aos políticos e cidadãos da União, pedindo “discernimento” sobre a responsabilidade
de todos pelo “não” nos referendos sobre o Tratado Constitucional em França e na Holanda.
Esta dupla rejeição do Tratado, em menos de uma semana, é considerada pelo secretário-geral
da COMECE como “um voto com múltiplos efeitos”. D. Noël Treanor rejeita, contudo,
que esses resultados impliquem “a rejeição absoluta do projecto europeu”.
O Tratado já foi ratificado pelos parlamentos da Áustria, Alemanha, Grécia, Hungria,
Itália, Lituânia, Eslováquia, Eslovénia e Letónia, para além da Espanha, através de
referendo.
Aquilo que a COMECE já tinha classificado como perda de entusiasmo dos seus povos
“pela causa europeia e pela ideia de fraternidade entre todos” foi confirmado, porém,
pelos resultados negativos em dois países fundadores da UE. D. Noël Treanor observa
que a vitória do “não” na França e na Holanda “traduz verdadeiras inquietações no
que diz respeito a problemas sociais, económicos e de segurança no seio dos Estados-membros”.
O secretário-geral da COMECE interroga-se sobre a capacidade real das políticas comunitárias
para responder a essas inquietações e alerta para as consequências negativas de um
“alargamento ilimitado” da UE. “Os temores dos cidadãos exigem coragem e respostas
coerentes por parte dos responsáveis políticos, a nível nacional e europeu”, declara.
Este responsável admite que uma parte dos votos negativos se ficou a dever à falta
de informação e a falhas de comunicação sobre os fins e conteúdos do Tratado Constitucional,
sublinhando a necessidade de desenvolver “a transparência, a legitimidade e a participação
no interior do sistema de governo”. “É preciso inventar novos modos de fazer conhecer
as intenções do projecto europeu e as acções dos políticos europeus”, sugere.
Os resultados do referendo serão discutidos pela COMECE na próxima reunião do comité-executivo
do organismo episcopal, que decorrerá entre 9 e 10 de Junho.
Responsabilidade dos Católicos
No seu recente documento “O Futuro da UE e a responsabilidade dos católicos”, a COMECE
referia que o projecto da União Europeia tinha necessidade de ser vivificado segundo
o espírito que esteve na sua origem, em 1950. O voto francês e holandês tem, neste
contexto, de ser levado muito a sério, ficando por perceber como é que se pode explicar,
com sucesso, um texto tão técnico como este Tratado Constitucional aos europeus, sob
pena de todo o projecto sucumbir às mãos do descontentamento e da desconfiança das
populações.
D. Noël Treanor convida a não esquecer que 10 países já ratificaram o Tratado, pedindo
que “todos os cidadãos, cristãos em primeiro lugar, manifestem com vigor o seu apreço
pela importância política e social do projecto europeu, com o sucesso que este já
teve até hoje”.
“O projecto europeu permanece vital para a promoção da paz, o desenvolvimento económico
e a manutenção da coesão e da integração social, hoje como há 50 anos”, acrescenta.
O alargamento da UE a Leste foi considerado, pelos novos Estados-membros, como uma
verdadeira reunificação do Velho Continente, em termos culturais, políticos e espirituais.
Os dois “pulmões” da Europa, como João Paulo II gostava de lhes chamar, são indispensáveis
para um bom funcionamento da União.
A revisão das perspectivas financeiras da UE representa, neste sentido, um momento
decisivo. A já referida declaração da COMECE aborda esta questão de um ponto de vista
ético e social, alertando para a necessidade de esperar negociações difíceis.
Para além destas considerações de ordem económica e política, é claro que falta ainda
fazer muito para desenvolver os contactos entre os povos da “velha” e da “nova” UE,
relações estas marcadas por bastante desconfiança, sobretudo no capítulo do emprego.
A COMECE defende a aprovação do Tratado, considerando que este “constitui um avanço
significativo” e vai dar origem “a um sentimento de cidadania europeia”, mas o desafio
da Europa parece não cativar os seus habitantes.
A “receita” apresentada pelos organismos cristãos pode servir de inspiração a quem
de direito: desenvolvimento económico, mas também o desenvolvimento de um modelo social
- cuidados de saúde, protecção social e educação acessíveis a todos.