Igreja sem vocações procura novas vias:situação em Portugal
Em Portugal há falta de padres e a missa já escasseia nalgumas paróquias.Para D. Manuel
Clemente, bispo auxiliar de Lisboa, a causa para a falta de vocações é óbvia "onde
não há vivência cristã não pode haver vocação".
Quando se assinala o Dia Mundial das Vocações - sacerdotais e religiosas -, há padres
com mais do que uma paróquia, movimentos a reclamar orientação espiritual, leigos
que substituem a missa pela celebração da palavra (sem eucaristia). Neste contexto,
a exigência pessoal cresce, com padres a celebrar mais de seis missas num fim- -de-semana
e grandes responsabilidades assumidas cedo.
Para D. Jorge Ortiga, arcebispo de Braga, é visível que a orientação pastoral mudou.
De uma Igreja orientada para a sacramentalização (vivência dos sacramentos) passou-se
para uma acção virada para "a animação da sociedade". Fora dos muros do templo, o
católico tem que conquistar o mundo. Missão que, reconhece o arcebispo, ocorre "num
ambiente hostil". A falta de padres é também um novo desafio aos leigos, mais responsabilizados
na condução e animação espiritual das paróquias.
O sociólogo Alfredo Teixeira considera que, "quando começa a faltar aos católicos
o centro da vida cristã, a eucaristia, algo de anómalo está a acontecer". Por isso,
"a Igreja deve repensar o modelo do padre para encontrar resposta para o problema",
disse, lembrando que a História mostra que este papel não foi sempre igual.
O contexto social alterou-se nos últimos 50 anos, reconhece o sociólogo, mas "não
se pode dizer que a falta de padres se deva ao facto de as pessoas terem menos valores
e serem menos generosas.
Hoje, a vocação, que pode ser um sonho de criança, confirma-se, muitas vezes, só em
idade adulta, depois da entrada no mercado de trabalho, no fim do curso, ou até mais
tarde.A opção concretiza-se através de uma mudança mais exigente, às vezes radical.
Os tempos mudaram, afirma Alfredo Teixeira, e a identidade social deixou de corresponder
à religiosa como nas comunidades rurais. "Os jovens vivem numa cultura de incerteza
e falta de confiança em relação ao futuro. Assumir uma aposta para a vida é mais exigente.
Os que correspondem de forma clara ao proposto são mais convictos."
Francisco Tito, responsável pelo seminário dos Olivais - de onde sairão este ano oito
novos padres -, considera que a "cultura narcisista que envolve as pessoas numa grande
solidão" não favorece compromissos sérios como o sacerdócio, que é "um serviço ao
outro". "Se não dou conta de que o outro precisa de mim, não estou disposto a ajudar."
E dá um exemplo para explicar esta falta de disponibilidade "Nem os partidos arranjam
jovens para colar cartazes!" Para o cónego Tito, o problema não está na vocação mas
na resposta. "Não temos capacidade para 'ouvir' este chamamento porque não temos intimidade
com Deus, estamos afastados da relação com ele", afirmou, reafirmando a firmeza da
sua fé.
D. José Augusto, responsável da conferência episcopal para o clero, seminários e vocações,
reforça a tendência para "estabilização do número de seminaristas teólogos nos últimos
cinco anos, bem como de ordenações". Em 2004 foram ordenados 39 padres. Fora do seminário,
em fase de discernimento, estão hoje 550 jovens.
A Igreja já alterou a sua estratégia. E a pastoral vocacional, antes uma alínea no
global da acção eclesial, é hoje transversal à intervenção, desde a catequese à liturgia.
"Toda a acção da Igreja é vocacional", diz D. Jorge Ortiga.
(De um artigo do
Diário de Noticias
170405)